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Bolsa Família 20 Anos
Programas sociais mudaram realidade de Guaribas (PI), que em 2003 foi a primeira cidade a receber o Fome Zero
Foto: Roberta Aline/ MDS
Considerada uma das cidades mais pobres do país em 2003, o município de Guaribas, no interior do Piauí e com cerca de 4,5 mil habitantes na época, foi o primeiro do Brasil a receber o Programa Fome Zero. A iniciativa que abarcava uma série de políticas públicas, como o Bolsa Família, que completa 20 anos nesta sexta-feira (20.10), nasceu para erradicar a fome e a miséria no Brasil.
A cidade não tinha asfalto, água potável, saneamento básico, escola e as habitações eram precárias. A mortalidade infantil chegava a 60 para cada mil nascidos vivos, 99,8% dos domicílios não tinham coleta de lixo, 99% não tinham sequer sanitário e 80% não contavam com energia elétrica. Quase metade da população não era escolarizada.
Esse quadro levou o município a ser escolhido para receber o projeto piloto da iniciativa que tiraria o Brasil do mapa da fome 11 anos depois. Nascida em Teresina, Rosângela Maria Sobrinho coordenou um grupo de trabalho em 2003, que em poucas semanas elaborou um diagnóstico, traçou objetivos, metas e planos orçamentários para desenvolver as cidades do Piauí. A incumbência pelo projeto técnico foi dada pelo recém-eleito governador Wellington Dias, já no início daquele ano.
“Em Guaribas, 98,7% da população não dispunham de sistema de abastecimento de água. Como as mulheres, que normalmente faziam esse serviço, diziam: ‘Ir buscar água que caía em gota’. Então eram dados estarrecedores”, recordou Rosângela Sobrinho, que atualmente é gerente de projetos do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). “A gente se sentiu no compromisso de contribuir para melhorar esses dados”, completou.
Ela guarda os originais de todos os projetos elaborados em seus diferentes formatos, voltados para gestores locais, organismos internacionais, público beneficiário das políticas sociais e para quem ia coordenar as ações. “Começamos a apresentar uma proposta concreta. Nós nos dedicamos, enquanto governo estadual, a conhecer a realidade dos municípios que nós gostaríamos que fosse feito o trabalho. Levantamos dados e elaboramos o material, com ações que entendemos que seriam prioritárias para cada local”, detalhou a servidora, que também cuida de um grande acervo de fotos da época.
Em um cartão postal de Guaribas, de um lado o retrato de casas modestas em ruas enlameadas, do outro os números que ela citou como estarrecedores. Foi a partir do Fome Zero, que a cidade recebeu projetos de infraestrutura, iniciativas de inclusão social, de acesso à água, saneamento básico, pavimentação, dentre outras melhorias.
“Ali desencadeou um processo, um processo de compromisso de Estado envolvendo as populações. Tudo foi gradativo, não tinha passe de mágica, não tínhamos orçamento para o que queríamos, mas fomos buscando e avançamos e conseguimos, através de uma interlocução com o país e pelos conselhos de segurança alimentar que foram criados”, prosseguiu Rosângela Sobrinho.
Em todo o país, o Fome Zero conseguiu atender milhões de pessoas com ações como o Programa Bolsa Família, de transferência de renda para os mais pobres, com condicionalidades de educação e saúde, o Programa Nacional de Alimentação Escolar, que fornece refeições gratuitas para crianças e adolescentes em escolas públicas, além de cursos de qualificação profissional.
"Guaribas mudou totalmente. O Fome Zero significou Guaribas sem fome. Tinha vários programas. Lembro do programa um milhão de cisternas, que o pessoal morria de sede e que salvou muita gente. O Luz Para Todos também veio. Na época não tinha energia onde eu morava. Foi muita coisa boa que aconteceu", descreveu Eldiene Maia, 37 anos, que nasceu e mora em Guaribas.
De 2002 a 2013, o Brasil alcançou resultados significativos na redução da desnutrição e na garantia de acesso à alimentação adequada para as camadas mais pobres. No período, caiu em 82% a população considerada em situação de subalimentação.
Natália Duarte, 59 anos, lembra do tempo que tinha que buscar água, em baldes, no meio da mata, diretamente nos olhos d'água que ficam no pé da serra ao redor do município. “Ninguém ouvia falar de Guaribas. Era sofrimento demais. As mulheres não dormiam dentro de casa. Eu passava a noite inteira para encher os baldes de água para atender os meus seis filhos", recordou.
Durante o período de mudança pelo qual a cidade passou, Natália Duarte recebeu o Bolsa Família, que ajudou a garantir dignidade na criação dos filhos. "Toda vez que eu abro o meu guarda-roupas, eu vejo o cartão do Bolsa Família. Só me lembro do passado e me lembro da alegria que estamos hoje", completou.
A lembrança do dia em que a cidade passou a contar com água potável e de fácil acesso ainda está vivo na memória de quem estava presente. “Foi uma festa, uma alegria, uns choravam, outros sorriam e a gente se abraçava. Estava todo mundo feliz, porque chegou água naquele município, água potável, eles estavam vendo aquilo acontecer”, comentou Rosângela Sobrinho mostrando as fotos da ocasião.
Transformação
José Aillon, 59 anos, é um exemplo de empreendedorismo, possível devido às melhores condições de vida em Guaribas. Depois de sair da cidade em busca de emprego, viu a terra natal se desenvolver e retornou para abrir seu próprio negócio, um restaurante no centro da cidade. "A gente vivia isolado aqui. Não tinha nada. Tinha vez que a gente comia meio dia, às vezes não comia de noite. Hoje, graças a Deus tem luz, tem uma estrada boa, tem tudo”.
Proprietário do Hotel Terraço, Irineu Maia, 42 anos, também optou por buscar oportunidade de trabalho fora. "Antigamente, quando eu saí daqui a gente andava de jumento. Aí, começou o pessoal daqui a comprar moto. Então, eles estavam melhor do que eu, que estava em São Paulo. Foi quando eu comecei a pensar que tinha que voltar para Guaribas".
Com o desenvolvimento da cidade, ele também fez o caminho de volta. "Eu não tinha ideia de vir para cá não, de tanto sofrimento que sofremos. Para você ter uma ideia, eu mesmo pensava que não ia ver asfalto aqui. Hoje eu estou vendo a casa lotérica, os bancos postais. Eu não esperava ver, no meu tempo de vida, o que já está desenvolvido em Guaribas. Por isso que voltei", disse.
Aos 28 anos, Guilherme Pereira, foi beneficiado diretamente por toda a transformação que a cidade passou. Atualmente, ele é professor da rede pública municipal e trabalha contribuindo com a formação educacional das novas gerações. "Eu sou fruto daquilo que foi plantado em Guaribas. O Fome Zero foi um programa, em específico, mas acompanhado de diversas outras ações, que de fato fizeram a diferença”, elogiou.
“Para mim, sempre foi um desafio estudar e por toda a minha vida estudei aqui. Terminei o ensino médio em 2011, fui para São Paulo e fiz faculdade por meio da bolsa do ProUni", contou Guilherme Pereira, que se orgulha de contribuir com o desenvolvimento da cidade.
Hoje, Guaribas conta com escolas, hospital, comércio e oportunidades. Além disso, os jovens têm a oportunidade de fazer faculdade sem precisar sair da cidade. “Então, é com essa convicção, com essa certeza, é com aquela alegria estampada no rosto de quem percebeu que melhorou sua qualidade de vida, não apenas em Guaribas, mas no restante do país, é que o nosso compromisso tem que ser fortalecido, revigorado, para que nós possamos levar para essas populações dos mais longínquos territórios desse país, uma qualidade de vida como eles merecem”, finalizou a gerente de projetos do MDS.
Assessoria de Comunicação - MDS