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Campeões da vida
A trajetória de Diego Carlos da dependência a empresário e integrante produtivo da sociedade
Caio Bonfim e Diego Carlos na loja de Diego, em Vicente Pires: parcerai. Foto: Helano Stuckert/ Min. Cidadania
Quem se aproxima da loja de queijos e pães do microempresário Diego Carlos, em Vicente Pires, no Distrito Federal, não tem ideia do valor simbólico do empreendimento e da conquista na trajetória do brasiliense de 34 anos, pai de três filhos. Diego teve, durante mais de 10 anos, a dependência química como adversária. Começou a beber na adolescência, influenciado por colegas mais velhos. Depois, foi apresentado à cocaína antes de se perder no crack.
Agora, concluí o tratamento completo de nove meses e está funcionando. Estou há dois anos, dez meses e 22 dias sem usar drogas e sem que a droga me use. Hoje sou um membro produtivo da sociedade"
Diego Carlos, microempresário
“O uso era progressivo. Quando cheguei ao crack, ele superou todas as outras. Não quis mais saber de nada. Só do crack e da próxima dose. Até que perdi tudo: emprego, convívio com minha família, com meus filhos, decepcionei minha mãe”, relatou Diego.
O depoimento veio durante um bate-papo especial com Caio Bonfim, representante brasileiro nos Jogos Olímpicos de Londres (2012), Rio de Janeiro (2016) e Tóquio (2020) na marcha atlética. O diálogo faz parte do projeto Campeões da Vida, do Ministério da Cidadania, que une integrantes do Bolsa Atleta e egressos do trabalho em comunidades terapêuticas financiadas pelo Governo Federal.
Diego teve três passagens por comunidades terapêuticas, a primeira em 2012. Abandonou com cinco meses e, sem amparo psicológico, passou mais cinco anos em sofrimento na dependência. Na segunda experiência, enfrentou nova recaída. “Agora, concluí o tratamento completo de nove meses e está funcionando. Estou há dois anos, dez meses e 22 dias sem usar drogas e sem que a droga me use”, contabilizou. “Hoje, sou um membro produtivo da sociedade e tenho convívio com os meus filhos.”
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O tratamento nas comunidades terapêuticas une laborterapia (trabalho), uma abordagem religiosa e acompanhamento psicológico. Desde janeiro de 2019, mais de 80 mil dependentes químicos tiveram oportunidade de tratamento em 483 instituições financiadas pelo Governo Federal. Entre elas, mais de 1.500 pessoas em situação de rua com dependência química no período da pandemia do novo coronavírus.
Retorno e inspiração
Semanalmente, Diego dá aulas de panificação para outros colegas em recuperação na comunidade terapêutica em que fez o tratamento. “É uma forma de gratidão, de retribuir o que fizeram por mim. Vou para lá relembrar quem sou, porque posso voltar ao uso. Vivo a vida um dia de cada vez. Dia após dia matando um leão”, ressaltou.
A vida de um atleta é superação, mas, quando a gente se depara com uma história como a sua, Diego, não tem como a gente acordar no dia seguinte sem estar motivado para treinar, para viver cada minuto, cada dia um dia”
Caio Bonfim, representante do Brasil na marcha atlética nos Jogos Olímpicos de Londres (2012), Rio de Janeiro (2016) e Tóquio (2020)
Caio Bonfim se emocionou com a narrativa de Diego. “A gente sai de casa achando que vai contribuir com alguma coisa e recebe muito mais numa conversa dessa. Você me deu muitas lições. A vivência no alto rendimento nos cobra um preço muito alto, mas nada perto do que você fez para chegar aonde chegou”, disse o atleta, responsável por entregar a Diego a medalha de Campeões da Vida, criada pelo Ministério da Cidadania.
“No esporte temos situações similares num certo parâmetro. A gente passa anos tentando e, às vezes, não dá certo. Só que o valor que a gente perde é muito menor. Uma competição, uma prova, um pódio. Eu mesmo acabei de vir de Tóquio pensando: será que um dia vou ser um medalhista olímpico? Porque é tão difícil, a gente treina, se dedica, temos derrotas, fracassos, mas que também vão formando a gente”, afirmou Caio.
Cirurgia e preconceito
Na conversa, Caio contou a Diego alguns dos obstáculos em sua trajetória esportiva. Quando ele começou a andar, por volta de um ano e um mês, os pais perceberam que ele tinha um arqueamento exagerado das pernas. Foi diagnosticado com a Doença de Blount. Precisou passar por uma cirurgia que quebrava a tíbia e a fíbula para que os ossos pudessem crescer retos.
“Quando fui para a minha primeira Olimpíada, em 2012, encontrei o doutor que fez o procedimento cirúrgico. Ele não acreditava que tivesse conseguido virar um atleta da marcha tendo passado por aquela doença, sabe?”, contou.
A estrada de Caio também foi pavimentada por desafios. Ele começou a praticar a marcha atlética sob influência dos pais João Sena, treinador de atletismo, e Gianetti Sena, especialista na modalidade. “Nasci nesse ambiente, mas não é um esporte popular no Brasil. Minha mãe que trouxe essa ‘loucura’”, brincou. “Eu tive de quebrar muitos tabus. Imagina um homem rebolando na rua. Tinha muito preconceito que fui vencendo aos poucos”, acrescentou Caio.
Hoje, o atleta coleciona mais de dez títulos nacionais consecutivos, é recordista brasileiro, medalhista em Jogos Pan-Americanos e em Mundial. “A vida de um atleta é superação, mas, quando a gente se depara com uma história como a sua, Diego, não tem como a gente acordar no dia seguinte sem estar motivado para treinar, para viver cada minuto, cada dia um dia”, disse Caio. “Essa conversa me traz muita esperança para a minha vida, para os meus filhos. É uma honra entregar para você essa medalha que simbolicamente representa o tanto que você venceu”.
Diretoria de Comunicação – Ministério da Cidadania