Notícias
“É preciso atacar o déficit habitacional em todos os seus componentes”, destaca secretário nacional de Habitação
"Se você tiver uma política de locação social, você enfrenta mais da metade do déficit habitacional sem ter, obrigatoriamente, que construir novos imóveis", afirma o secretário Alfredo dos Santos
Brasília (DF) – Em 2021, o Governo Federal, por meio do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), entregou 384,1 mil moradias, garantindo a casa própria a mais de 1,5 milhão de pessoas. Também no ano passado, foram dados importantes passos em outras frentes que buscam combater o déficit habitacional, entre elas o Programa de Regularização Fundiária e Melhoria Habitacional, que teve seu primeiro edital lançado, e a locação social, cujo projeto-piloto será executado na cidade do Recife, em Pernambuco.
Em entrevista ao portal do MDR, o secretário nacional de Habitação, Alfredo dos Santos, aborda os principais diferenciais trazidos pelo Programa Casa Verde e Amarela e os resultados já obtidos pela política habitacional do Governo Federal, além das perspectivas para este ano. Leia abaixo:
O Governo Federal criou, em agosto de 2020, um novo programa habitacional: o Casa Verde e Amarela. Quais são as diferenças dele para o programa anterior?
O principal diferencial principal do Casa Verde e Amarela para o Minha Casa, Minha Vida é a amplitude de possibilidades de atendimento. O programa anterior traz, no próprio enunciado da legislação, que tem como objetivo a produção habitacional. O Casa Verde e Amarela traz no seu enunciado legal o atendimento às necessidades habitacionais em diversas frentes.
E em que contexto se baseou o Casa Verde e Amarela para trazer novidades?
Quando falamos de produção habitacional, o programa anterior tinha bom desempenho nas grandes e médias cidades, mas nas menores não era tão bom. O programa também precisava recuperar o protagonismo das famílias de mais baixa renda, porque, com o passar do tempo, elas foram perdendo capacidade de participação. Além disso, precisava observar as diferenças regionais para que tivéssemos maior equilíbrio.
Outra demanda é que o programa precisava apresentar condições de atender outras necessidades. Com esse foco, nos baseamos nos componentes do déficit habitacional. Há uma correlação automática que as pessoas fazem entre déficit habitacional e a necessidade de produção habitacional. E isso não é verdade. Se formos olhar os principais componentes do déficit, o primeiro é o ônus excessivo de aluguel, que representa 54% do déficit. Ônus excessivo de aluguel é um conceito internacional, quando a família consome mais de 30% da renda para pagar aluguel. Para você enfrentar esse componente, não precisa necessariamente construir unidades habitacionais. Se você tiver uma política de locação social, que é a mais utilizada no mundo e serve para complementar a capacidade de pagamento do cidadão para que ele tenha um comprometimento de renda menor, você enfrenta mais da metade do déficit, sem que tenha, obrigatoriamente, que construir novos imóveis.
Outros componentes do déficit habitacional são as moradias inadequadas e as comoradias...
Há pessoas que moram em locais que não foram construídas para moradia. Moram embaixo de marquises, dentro de um carro, num barracão abandonado... Então, obviamente, para esse público, a saída seria produção habitacional subsidiada. Isso porque as famílias que estão nessa condição agora não teriam como ir para a habitação financiada.
Já a comoradia se caracteriza quando mais de duas famílias, com mais de dois componentes em cada uma, moram no mesmo imóvel. A pesquisa mostra que cerca de 50% das famílias que moram em coabitação não teriam interesse em ter uma habitação própria, ainda que tivessem condição. Esse componente do déficit corresponde a cerca de 23% do total. Então, com base nesta pesquisa, teríamos que produzir unidades para os outros 50% desse componente, que indicaram interesse no imóvel.
Quando você observa, todos os componentes do déficit tiveram uma redução bastante expressiva. O único componente que cresceu muito foi o ônus excessivo de aluguel. Então, as políticas públicas, de uma maneira geral, vêm enfrentando adequadamente, mas temos a questão da renda da população e o valor do aluguel teve um acréscimo.
Então, por que a gente faz tanto financiamento habitacional, por que se produz tantas unidades? Outro aspecto que olhamos quando falamos de produção habitacional é a demanda futura por habitação, que representa as novas famílias que se formam todo ano. As características dessas novas famílias também foram se alterando: se formando um pouco mais tarde ou que se divorciaram e que estão morando sozinhas, apresentando uma nova demanda por unidades. Então, o déficit habitacional é pensado olhando hoje para o passado e a demanda futura é olhando para frente.
Diante desse cenário, considerando os componentes do déficit, o Programa Casa Verde e Amarela traz novidades em relação ao Minha Casa, Minha Vida: nós acentuamos e melhoramos muito as condições no que diz respeito a produção habitacional financiada. Na produção subsidiada, o foco foi concluir obras em andamento e retomar as que estavam paralisadas. E as novidades são as novas modalidades: locação social e o primeiro programa nacional de regularização fundiária e melhoria habitacional, que é outra demanda enorme do país como um todo.
Como essas novas modalidades do programa ajudam a combater o déficit habitacional? Quanto o MDR já avançou no processo de regularização fundiária e locação social?
Logo que lançamos o Programa de Regularização Fundiária e Melhoria Habitacional, tivemos de percorrer um caminho técnico e burocrático para que todas as partes tivessem a efetiva condição de operá-lo. É um programa inovador no que diz respeito aos atores envolvidos: o agente operador, que é a Caixa Econômica Federal; os financeiros, que teremos amplitude mais significativa de operadores, e esse é um dos motivos que nos demandou tempo, porque precisamos cadastrar esses novos agentes financeiros. E os operadores através da iniciativa privada. Também tivemos de cadastrar os municípios interessados. Mas nós percorremos todas as etapas e lançamos, em dezembro de 2021, o primeiro edital para a captação de propostas e contratação na modalidade de Regularização Fundiária e Melhoria Habitacional.
Quanto à locação social, quando olhamos para o mundo das políticas de habitação de interesse social, em especial nos países mais desenvolvidos e em desenvolvimento, ela é a principal política. Primeiro pela transitoriedade. A família não necessariamente vai pagar aluguel para sempre, mas quando ela compromete um percentual de renda menor, ela consegue ter um equilíbrio financeiro para, se for de seu interesse, dar o próximo passo e adquirir a sua unidade. Normalmente, a pessoa terá uma condição de moradia melhor, estará mais próxima dos equipamentos públicos de saúde, educação e transporte. Portanto, ela tem uma condição de vida mais adequada e, normalmente, ainda acaba gastando um pouco menos da renda com deslocamento de transporte. O público-alvo da locação social tem, também, uma maior mobilidade social. Muitas pessoas mudam de bairros ou cidades em razão de oportunidades de emprego. Quando esse público é atendido prioritariamente com a transferência de imóvel, cria-se um obstáculo.
Como será possível implementar a locação social?
Nós abrimos a locação social em três focos. O primeiro: produção de parque habitacional, por meio de iniciativa privada. Nós aprovamos no PPI, em janeiro de 2020, a inclusão do Programa de Locação Social. Em dezembro do ano passado, assinamos o primeiro contrato piloto, na cidade do Recife. Nesse programa, a iniciativa privada irá produzir unidades habitacionais com recursos próprios e fará a administração do condomínio, durante o prazo determinado da concessão. Quais são os ganhos? Com isso, os órgãos públicos não precisam dispor de volume expressivo de recursos neste momento. Além disso, esses imóveis serão construídos nas áreas centrais das cidades, onde temos equipamentos públicos disponíveis, o que tende a gerar uma redução de despesas para as famílias. Terceiro, um dos principais problemas que temos nos empreendimentos para as famílias de baixíssima renda é a manutenção ao longo do tempo, que acaba gerando uma certa degradação. Com a parceria público privada, você vai ter o privado responsável por fazer a administração ao longo do tempo.
Outra vertente possível da locação social é a produção de parque habitacional, com recursos da União, da mesma forma que é feita hoje, só que, ao invés de fazer a transferência da unidade para pessoa física, nós faremos a transferência para os órgãos locais, os municípios. Eles passarão a administrar esses imóveis que serão usados para política de locação social.
A terceira é a produção de parque público, também com recursos da União, mas voltados para nichos. Por exemplo, empreendimentos voltados para a terceira idade, em que as necessidades do imóvel são diferentes da média. O imóvel pode ser um pouco menor, mas com uma área de vivência para essas pessoas,
Nossa expectativa é soltar os editais para produção de parque por demanda aberta ou para nichos ainda no primeiro semestre de 2022.
O Governo Federal superou, em junho de 2021, a marca de 1 milhão de moradias entregues desde 2019. A que se deve esse sucesso?
Alfredo Santos: São dois fatores preponderantes. Quando falamos do antigo faixa 1, que é habitação subsidiada, a determinação do presidente da República foi tocar todas as obras que haviam sido contratadas e retomar as paralisadas. Foi um sinal de tranquilidade para o mercado. Falamos: “Vamos tocar, vamos ter previsibilidade”. Isso deu tranquilidade ao mercado para operar e não tivemos nenhuma interrupção de fluxo de obras em razão de falta de pagamento. Quando falamos de habitação subsidiada, a prioridade é concluir as obras contratadas, independentemente de quem as iniciou.
E em relação à produção financiada?
Nesse caso, o sucesso se deve a uma série de fatores. As mudanças realizadas pelo MDR desde o final de 2020 propiciaram esse incremento, à medida em que transmitiu aos operadores e às empresas a segurança de fluxo. Ou seja, nós temos funding disponível. Transmitimos ao mercado, pelos ajustes técnicos e operacionais que foram feitos, que o fluxo de pagamento não seria interrompido, como já ocorreu. Isso traz muita insegurança para quem opera o mercado e também para os próprios compradores, que, eventualmente, na hora de finalizar o seu negócio, não encontram o imóvel adequado.
Além disso, houve impacto significativo com as mudanças que fizemos no Casa Verde e Amarela, olhando para a interiorização e regionalização. Nós alteramos as taxas de juros para as famílias de mais baixa renda. Hoje, o programa oferece as menores taxas de juros da história de qualquer programa de habitação financiada. No Norte e no Nordeste, a taxa foi reduzida a 4,25% ao ano. No resto do País, a 4,5%. Soma-se a isso ajustes que fizemos, por exemplo, na adequação dos valores dos imóveis. Nós atacamos de um lado, dando mais condição de compra para quem quisesse comprar, e melhoramos as condições mínimas para quem quisesse ofertar.
O número de 1,2 milhão de unidades entregues até dezembro é bastante expressivo, mas o que chama atenção na assertividade do que fizemos é quando comparamos o primeiro semestre de 2020 com o primeiro semestre de 2021. Com as medidas já vigorando, o País teve, como um todo, um crescimento na utilização dos recursos na ordem de 12%. O Norte teve 13% e o Nordeste teve 24%. Então, tivemos a interiorização, a observação da capacidade de pagamento paras as menores taxas de renda e resultado das operações. A junção de todas essas ações trouxe, para quem produz, a tranquilidade de funding e fluxo constante. Para quem quer comprar, trouxe as melhores condições da história.
Além disso, estruturalmente, a mudança mais importante foi a inversão da forma de pagamento do agente operador. Para se ter uma ideia, de 2019 para 2020, o total de recursos – a fundo perdido - via FGTS era de R$ 9 bilhões, usados em duas frentes. O primeiro, para pagar o spread bancário, porque era uma operação que ninguém tinha feito até então e se corria risco. Então, quem pagava a rentabilidade do banco era o FGTS, à vista. A segunda parte do subsídio é concedido às famílias, para complementar a capacidade de pagamento. Quando o programa foi criado, lá em 2009, acabou gerando um teto. Qualquer coisa que quiséssemos fazer, tínhamos batido as 380 mil unidades por ano e não conseguíamos superar isso. Isso ocorria porque dois terços de R$ 9 bilhões, ou seja, R$ 6,7 bilhões, eram pagos aos agentes financeiros à vista. Apenas R$ 2,3 bilhões eram pagos para complementar a capacidade de pagamento das famílias. Nós alteramos a forma desse pagamento e os bancos passaram a receber parte à vista e parte ao longo do tempo.
Também conseguimos acordar um desconto para a parte do pagamento à vista. O que isso significa? Ao final de quatro anos, com o mesmo valor de R$ 9 bilhões, nós vamos destinar R$ 3 bilhões para os agentes financeiros e R$ 5,9 bilhões para complementar a capacidade de pagamento das famílias.
Após um ano de criação do Casa Verde e Amarela, o Governo apresentou novos avanços no programa. Por que isso foi feito e quais são os destaques das mudanças?
Com o aumento do preço dos insumos de construção, os valores dos imóveis se desenquadraram do programa. O que fizemos foi alterar esse valor para se enquadrar ao Casa Verde e Amarela. Era uma demanda e foi um movimento que nós fizemos para continuar tendo oferta de produtos para a população.
Outra mudança que fizemos foi alterar a curva de subsídios, que varia com a renda, composição familiar ou localização da família. O que fizemos foi aumentar o valor desse subsídio para mais famílias, especialmente as que recebem até R$ 2 mil. Isso diminui o risco dos agentes financeiros e melhora a condição de compra das famílias que são foco principal do programa.
No entanto, para as famílias de mais baixa renda, essas mudanças ainda não seriam suficientes. Em tratativa com estados e municípios, lançamos a modalidade Parcerias. É uma novidade que, a partir do primeiro trimestre de 2022, vem muito forte. Estados e municípios, juntos ou separados, vão garantir aos seus cidadãos elegíveis no programa que a entrada obrigatória – de pelo menos 20% – seja paga pelo órgão local (estados ou municípios), por meio de dinheiro ou doação de terreno. Como aumentamos o valor de subsídio das famílias, o volume de desconto que as famílias vão ter em relação ao imóvel vai ficar muito mais adequado às rendas mais baixas e vai possibilitar que essas famílias comprem o imóvel com parcela adequada à sua real capacidade de pagamento, evitando o superendividamento.
Quais são as principais metas da Secretaria Nacional de Habitação em 2022?
Para 2022, a maior conquista que poderemos ter é o lançamento do edital das primeiras contratações da modalidade de Regularização Fundiária e Melhoria Habitacional, um programa inédito na política habitacional brasileira. Também a contratação das novas modalidades de locação social, uma demanda antiga da sociedade que, certamente, irá incorporar respostas às famílias que hoje consomem muito da sua renda.
Leia mais:
Governo Federal entrega 384,1 mil moradias em todo o País em 2021