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Íntegra do discurso da ministra Eleonora Menicucci na cerimônia de sanção da lei do feminicídio
Hoje é um dia histórico para nós mulheres. A tipificação do crime feminicídio, uma das mais importantes pautas da luta mundial das mulheres contra a violência de gênero, passa a ser lei no Brasil.
O feminicíio é a morte violenta de mulheres por razões de gênero. Trata-se de um crime de ódio. O conceito surgiu na década de 70 com o fim de reconhecer e dar visibilidade à discriminação, opressão, desigualdade e violência sistemática contra as mulheres, que em sua forma mais extrema, culmina na morte.
Essa forma de assassinato não se constitui em evento isolado e nem repentino ou inesperado; ao contrário, faz parte de um processo continuo de violências, cujas raízes misóginas, caracterizam o uso de violência extrema. Inclui uma vasta gama de abusos desde verbais, físicos e sexuais, como o estupro, diversas formas de mutilação e de barbárie.
A nova lei sancionada neste ato pela presidenta Dilma Rousseff acrescenta no título I, dos crimes contra a pessoa, no artigo 121 do Código Penal, em seu parágrafo 2º “homicídio qualificado”, o inciso VI, criando uma nova figura jurídica, o feminicídio, que tipifica e agrava o crime de homicídio quando cometido contra a mulher por razões da condição de gênero/sexo feminino. No mesmo artigo, acrescenta o parágrafo 2º, constituindo as circunstâncias qualificadoras que envolver a violência doméstica e familiar; ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher. A pena prevista é de 12 a 30 anos de reclusão. Também acrescenta o parágrafo 7º e prevê que a pena seja aumentada em um terço até a metade se o crime for praticado quando durante o período de gestação ou nos três meses posteriores ao parto; contra a pessoa menor de 14 anos, maior de sessenta anos ou com deficiência; ou na presença dos pais ou filhos da vítima.
A morte violenta de mulheres por razões de gênero é um fenômeno global, com proporções alarmantes. Entre os 25 países com taxas altas ou muito altas, 14 são da América Latina. Há uma correspondência entre as regiões com mais violência letal e mais altos índices de feminicídios. Segundo o mapa da violência, de 2012, o Brasil ocupa o 7º lugar (de 84 países) com a maior taxa de mortes violentas de mulheres. 33% dos relatos de violência feitos ao Ligue 180 afirmam existir uma situação de risco de morte.
No Brasil, desde 1980, quase 100 mil mulheres perderam suas vidas por meios violentos, segundo os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - Datasus. Das mortes de mulheres, 68,8% aconteceram na residência, ou seja, é no âmbito doméstico, nas relações privadas e mais intimas, onde a violência tem sido praticada com mais intensidade e barbárie. Esses assassinatos são cometidos, via de regra, por pessoas com quem a mulher mantem (ou mantinha) algum tipo de relação de afeto, com o qual convive ou tenha convivido, independentemente da situação de coabitação.
É preponderante entre as vítimas, que o assassinato seja cometido pelo cônjuge e/ou namorado ou os respectivos ex. ainda é frequente se observar que e a partir dos 60 anos, os algozes passam a ser os próprios filhos.
Quinze países da América Latina adotaram legislação penal sobre feminicídio. São eles: Costa Rica, Guatemala, Colômbia, El Salvador, Chile, México, Nicarágua, Argentina, Bolívia, Honduras, Panamá, Peru, Equador, Venezuela e República Dominicana. O Brasil, portanto, é o 16º país latino americano a integrar essa lista.
Em 2013 a comissão sobre a situação da mulher da ONU recomendou aos Estados “reforçar a legislação nacional para punir assassinatos violentos de mulheres e meninas em razão do gênero e integrar mecanismos ou políticas específicos para prevenir, investigar e erradicar essas deploráveis formas de violência de gênero”.
O projeto que hoje se torna lei é resultado da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada com a “finalidade de investigar a situação da violência contra a mulher no Brasil e apurar as denúncias de omissão por parte do poder público com relação à aplicação de instrumentos instituídos em lei para proteger as mulheres em situação de violência. Esta comissão teve início em março de 2012 e finalizou seus trabalhos em julho de 2013. Quero destacar, Senhora Presidenta, o importante protagonismo da bancada feminina no Congresso Nacional em todo este processo, tanto na CPMI, quanto para garantir a aprovação do projeto no Senado e posteriormente na Câmara. Todo o nosso reconhecimento às deputadas federais e senadoras, de todos os partidos, pela sua capacidade de articulação e atuação com prioridade na garantia de direitos das meninas e mulheres brasileiras.
Ao longo dos últimos anos, o Governo Federal atua com determinação na prevenção e repressão de qualquer tipo de violência contra as mulheres, de todas as idades. Investimos recursos, criamos programas, desenvolvemos projetos e capacitamos pessoas para intensificar o combate à violência e garantir a responsabilização e penalidade aos criminosos.
Desde 2006, contamos com um dos mais inovadores dispositivos legais no mundo todo para o enfrentamento à violência doméstica, que é a Lei Maria da Penha. Segundo estudo recém divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), esta legislação fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídio de mulheres dentro das suas residências. Isso significa que a Lei Maria da Penha se consolida como instrumento real de proteção à vida das mulheres brasileiras.
O Governo Federal, em especial sob a liderança da Presidenta Dilma Rousseff, vem implementando uma série de medidas para garantia de direitos das meninas e mulheres. Há dois anos, neste mesmo Palácio do Planalto, lançamos o programa “Mulher, Viver sem Violência”, com o objetivo de integrar e ampliar os serviços públicos existentes voltados às mulheres em situação de violência, mediante a articulação dos atendimentos especializados no âmbito da saúde, da justiça, da segurança pública, da rede psicossocial e socioassistencial, além da promoção da autonomia econômica, priorizando o emprego, a renda e a linha de crédito orientada. A iniciativa foi transformada em programa de governo por meio de decreto presidencial. A Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República é a responsável pela coordenação do programa e, para sua implementação, atua de forma conjunta com os ministérios da Justiça, da Saúde, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, do Trabalho e Emprego e com a Secretaria de Direitos Humanos.
Entre 2013 e 2014, 26 unidades da federação aderiram ao programa Mulher, Viver sem Violência, que está estruturado em seis eixos, dos quais eu quero destacar três.
A Casa da Mulher Brasileira é uma das mais importantes iniciativas da história para proteção das mulheres. Trata-se de um local que reúne os mais diversos serviços de atendimento à mulher, com acolhimento e triagem, apoio psicossocial, delegacia especializada, juizado especializado, defensoria pública, promoção da autonomia econômica, alojamento de passagem e brinquedoteca. A primeira casa, inaugurada em fevereiro na cidade de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, realizou em um mês 1.928 atendimentos. Em breve, todas as capitais brasileiras terão uma casa. A Casa da Mulher Brasileira de Brasília será inaugurada no próximo mês.
A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 é um serviço de utilidade pública que orienta as mulheres em situação de violência, recebe denúncias e de imediato as encaminha ao Ministério Público e aos órgãos de Segurança Pública. Ele oferece escuta qualificada e acolhedora às mulheres em situação de violência, fornece informações sobre onde encontrar o serviço mais próximo e apropriado para o seu caso, registra denúncias de violência contra a mulher e reclamações sobre o funcionamento inadequado dos serviços de atendimento. Entre o início de funcionamento do serviço, em 2005, e o final de 2014, realizamos mais de 4 milhões e 100 mil atendimentos.
A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. O Ligue 180 atende a todo território nacional e, desde a última sexta-feira, atende a 16 países: Portugal, Espanha, Itália, Argentina, Bélgica, Estados Unidos, França, Guiana Francesa, Holanda, Inglaterra, Luxemburgo, Noruega, Paraguai, Suíça, Uruguai e Venezuela. Isso só é possível graças a um trabalho em parceria com o Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Justiça, por meio da Polícia Federal.
O Governo Federal também entregou em 2014 aos estados brasileiros 54 unidades móveis, que são ônibus especialmente adaptados que levam serviços especializados da rede de atendimento às mulheres em situação de violência ao campo, floresta e águas. Esses serviços incluem prevenção, assistência, apuração, investigação e enquadramento legal. As unidades também têm função educativa, com a promoção de palestras e esclarecimentos sobre a Lei Maria da Penha e sua aplicação. Em parceria com a Caixa Econômica Federal, um barco atua para o enfrentamento à violência contra as mulheres na região da Ilha do Marajó, levando em consideração as particularidades das comunidades ribeirinhas brasileiras.
Me permita ainda, Presidenta, destacar outra ação de fundamental importância para enfrentamento à violência de gênero. Desde a última sexta-feira até a próxima sexta, dia 13, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, lidera o mutirão Justiça pela Paz em Casa, integrando juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher em todo o Brasil para a realização de audiências de instrução e julgamento de casos de violência contra a mulher. É uma iniciativa fundamental para enfrentamento da impunidade.
Senhora Presidenta, senhoras e senhores. Estas são somente algumas das iniciativas que o Brasil realiza ao longo dos últimos anos para garantia efetiva dos direitos das mulheres. Eu poderia citar muitas outras, como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, os programas educacionais e tantas outras políticas públicas que transformam o nosso país e que têm as mulheres como suas maiores beneficiadas. Desde que a Lei Maria da Penha entrou em vigor, o enfrentamento à violência passou a ser uma realidade e uma prioridade, consolidada na cultura do nosso país.
A partir de hoje, com a lei do feminicídio, as mulheres brasileiras conquistam mais um importante instrumento para garantia do direito a uma vida livre da violência. Tenham a certeza de que o governo brasileiro, liderado pela força e determinação de uma mulher de coração valente, trabalha com prioridade para garantir autonomia e dignidade às meninas e mulheres brasileiras.
Muito obrigada e boa tarde a todas e todos.
Comunicação Social
Secretaria de Políticas para as Mulheres – SPM
Presidência da República – PR