Texto base do Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra a Mulher
Publicado em
28/07/2010 18h00
Atualizado em
30/11/2019 14h30
O Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher foi lançado em agosto de 2007, como parte da Agenda Social do Governo Federal. Consiste em um acordo federativo entre o governo federal, os governos dos estados e dos municípios brasileiros para o planejamento de ações que consolidassem a Política Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres por meio da implementação de políticas públicas integradas em todo
território nacional.
O Pacto apresentou naquele momento, uma estratégia de gestão que orientava a execução de políticas de enfrentamento à violência contra mulheres, no sentido de garantir a prevenção e o combate à violência, a assistência e a garantia de direitos às mulheres. A proposta era organizar as ações pelo enfrentamento à violência contra mulheres, com base em quatro grandes eixos/áreas estruturantes.
Passados quatro anos de implementação do Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, foi necessária uma releitura desta proposta e uma avaliação com olhar nas 27 Unidades da Federação pactuadas.
Assim, compreendeu-se a necessidade de manutenção, ampliação e fortalecimento desta proposta dada a sua importância e relevância no País, sendo que os novos eixos estruturantes são:
1) Garantia da aplicabilidade da Lei Maria da Penha.
2) Ampliação e fortalecimento da rede de serviços para mulheres em situação de violência.
3) Garantia da segurança cidadã e acesso à Justiça.
4) Garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, enfrentamento à exploração sexual e ao tráfico de mulheres.
5) Garantia da autonomia das mulheres em situação de violência e ampliação de seus direitos.
Na elaboração do Programa Plurianual (PPA) 2012-2015, que aconteceu no primeiro semestre do Governo Dilma, a SPM indicou como parte do macro desafio do programa a proposta de fortalecer a cidadania, respeitando a diversidade das relações humanas, garantindo a igualdade entre mulheres e homens, promovendo a universalização do acesso e elevação da qualidade dos serviços públicos.
Já os eixos de ação e articulação de Políticas Públicas que deveriam orientar a ação governamental no próximo período, foram organizados nos seguintes objetivos:
Objetivo 1 – Garantir implementação e aplicabilidade da Lei Maria da Penha, por meio de difusão da lei e do fortalecimento dos instrumentos de proteção dos direitos das mulheres em situação de violência.
Objetivo 2 – Garantir o atendimento às mulheres em situação de violência, com a ampliação e fortalecimento dos serviços especializados, qualificação, fortalecimentos e integração dos serviços da rede de atendimento de forma a promover a capilaridade da oferta de atendimento, a garantia de acesso a todas as mulheres.
Objetivo 3 – Criação do Sistema Nacional de Dados sobre Violência contra a Mulher conforme previsto no artigo 38 da Lei Maria da Penha e do Registro Administrativo Unificado, para a construção de indicadores que permitam maior monitoramento, avaliação e elaboração.
Objetivo 4 – Garantir a Segurança Cidadã a todas as mulheres.
Objetivo 5 – Garantir o acesso à Justiça, de forma que todas as mulheres possam receber atendimento adequado por meio da atuação em rede, e que os equipamentos de justiça promovam sua plena defesa e o exercício da sua cidadania.
Objetivo 6 – Garantir os Direitos Sexuais na perspectiva da autonomia das mulheres sobre seu corpo, sua sexualidade por meio da mudança cultural dos conceitos historicamente construídos na sociedade brasileira, de forma a identificar, responsabilizar e prestar atendimento às situações em que as mulheres têm seus Direitos Humanos e Sexuais violados.
Objetivo 7 – Garantir a inserção das mulheres em situação de violência nos Programas Sociais nas três esferas de governo, de forma a fomentar sua independência e garantir sua autonomia econômica e financeira e o acesso a seus direitos.
Objetivo 8 – Garantir a implementação da Política de Enfrentamento à violência contra as Mulheres do Campo e da Floresta.
O fenômeno da violência doméstica e sexual praticado contra mulheres constitui uma das principais formas de violação dos seus direitos humanos, atingindo-as em seus direitos à vida, à saúde e à integridade física. A Constituição Federal, em seu art. 226, parágrafo 8º assegura “a assistência à família, na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência, no âmbito de suas relações”. Dessa forma, o Estado brasileiro assume um papel no cumprimento do enfrentamento a qualquer tipo de violência, seja ela praticada contra homens ou mulheres, adultos ou crianças.
Homens e mulheres, porém, são atingidos pela violência de maneira diferenciada. Enquanto os homens tendem a ser vítimas de uma violência predominantemente praticada no espaço público, as mulheres sofrem cotidianamente com um fenômeno que se manifesta dentro de seus próprios lares, na grande parte das vezes praticado por seus (ex) companheiros. Pesquisa realizada pelo Instituto Sangari e coordenada por Julio Jacobo Waiselfisz (“Mapa da Violência – 2010. Anatomia dos Homicídios no Brasil”) mostra que “em dez anos 1997 a 2007, 41.532 mulheres morreram vítimas de homicídios - índice 4.2 assassinadas por 100.000 mil habitantes”.
A violência contra a mulher em todas as suas formas (psicológica, física, moral, patrimonial, sexual, tráfico de mulheres) é um fenômeno que atinge mulheres de diferentes classes sociais, origens, regiões, estados civis, escolaridade ou raças. Faz-se necessário, portanto, que o Estado brasileiro adote políticas públicas acessíveis a todas as mulheres, que englobem as diferentes modalidades pelas quais ela se expressa. Nessa perspectiva, devem ser também consideradas as ações de combate ao tráfico de mulheres, jovens e meninas.
Ainda que seja um fenômeno reconhecidamente presente na vida de milhões de brasileiras, não existem estatísticas sistemáticas e oficiais que apontem para a magnitude deste fenômeno. Alguns poucos estudos, realizados em 2010 por institutos de pesquisa não governamentais, como a Fundação Perseu Abramo, apontam que aproximadamente 24% das mulheres já foram vítimas de algum tipo de violência doméstica. Quando estimuladas por meio da citação
de diferentes formas de agressão, esse percentual sobe para 43%. Um terço afirma, ainda, já ter sofrido algum tipo de violência física, seja ameaça com armas de fogo, agressões ou estupro conjugal. Outras pesquisas indicam, também, a maior vulnerabilidade de mulheres e meninas ao tráfico e à exploração sexual. Segundo estudo da Unesco de 1999, uma em cada três ou quatro meninas é abusada sexualmente antes de completar 18 anos.
Pesquisa do Instituto Avon/IPSOS-2011 aponta que 6 em cada 10 entrevistados(as) conhecem alguma mulher vítima de violência doméstica, que 6% relacionam violência a agressões verbais, humilhação, falta de respeito, ciúmes e ameaças e que 27% das mulheres declaram ter sofrido agressão grave.
Outra importante fonte de informações sobre a questão é a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 1801 que foi criada em novembro de 2005 pela SPM/PR para orientar as mulheres, em situação de risco e de violência, sobre seus direitos e onde buscar ajuda, bem como para auxiliar no monitoramento da rede de atenção à mulher em todo o país. Mesmo não oferecendo dados que permitam construir um diagnóstico sobre a violência contra as mulheres no país, a Central oferece uma visão geral das características deste fenômeno e de sua magnitude. Importante destacar que não se trata de um conjunto de informações estatisticamente representativas do universo, mas de registros dos atendimentos efetuados neste serviço, o que, por si só, já produz vieses que não podem ser desconsiderados na análise.
A Central de Atendimento à Mulher-Ligue 180 registrou, de janeiro a outubro de 2011, 530.542 ligações. No período, foram registrados 58.512 relatos de violência. Desse total, 35.891 foram de violência física; 14.015 de violência psicológica; 6.369 de violência moral; 959 de violência patrimonial; 1.014 de violência sexual; 264 de cárcere privado; e 31 de tráfico de mulheres.
Um dado relevante e que chama atenção é que as violências moral e psicológica atingem juntas, o percentual de 34,9% dessas ligações.
PERFIL - A maior parte das mulheres que entrou em contato com o Ligue 180 e que também é vítima da violência tem de 20 a 40 anos (26.676), possui ensino fundamental completo ou incompleto (16.000), convive com o agressor por 10 anos ou mais, 40% e 82% das denúncias são feitas pela própria vítima.
O percentual de mulheres que declaram não depender financeiramente do agressor é 44%. E 74% dos crimes são cometidos por homens com quem as vítimas possuem vínculos afetivos/sexuais (companheiro, cônjuge ou namorado). Os números mostram que 66% dos filhos presenciam a violência e 20% sofrem violência junto com a mãe.
Os dados apontam que 38% das mulheres sofrem violência desde o início da relação e 60% delas relataram que as ocorrências de violência são diárias.
DADOS POR ESTADO - Em números absolutos, o Estado de São Paulo é o líder do ranking nacional com um terço dos atendimentos (77.189), que é seguido pelo Estado da Bahia, com (53.850). Em terceiro lugar está o Rio de Janeiro (44.345).
O Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres parte do entendimento de que a violência constitui um fenômeno de caráter multidimensional, que requer a implementação de políticas públicas amplas e articuladas nas mais diferentes esferas da vida social, tais como: na educação, no trabalho, na saúde, na segurança pública, na assistência social, na justiça, na assistência social, entre outras. Esta conjunção de esforços já resultou em ações que, simultaneamente, vieram a desconstruir as desigualdades e combater as discriminações de gênero, interferir nos padrões sexistas/machistas ainda presentes na sociedade brasileira e promover o empoderamento das mulheres; mas muito ainda precisa ser feito e por isso mesmo, a necessidade de fortalecimento do Pacto.
O Pacto compreende, assim, não apenas a dimensão da resposta aos efeitos da violência contra as mulheres, mas também as dimensões da prevenção, assistência, proteção e garantia dos direitos daquelas em situação de violência, bem como o combate à impunidade dos agressores.
O Pacto e as ações nele propostas apóiam-se em três premissas:
a) a transversalidade de gênero;
b) a intersetorialidade;
c) a capilaridade.
A transversalidade de gênero visa garantir que a questão de violência contra a mulher e de gênero perpasse as mais diversas políticas públicas setoriais. A intersetorialidade, por sua vez, compreende ações em duas dimensões: uma envolvendo parcerias entre organismos setoriais e atores em cada esfera de governo (ministérios, secretarias, coordenadorias, etc.); e outra, implica uma maior articulação entre políticas nacionais e locais em diferentes áreas
(saúde, justiça, educação, trabalho, segurança pública, etc.). Desta articulação decorre a terceira premissa que diz respeito à capilaridade destas ações, programas e políticas; levando a proposta de execução de uma política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres até os níveis locais de governo.
Além dos marcos legais nacionais e internacionais sobre o tema, o Pacto é respaldado, ainda, pelos Planos Nacionais de Políticas para as Mulheres I e II (2004 e 2008, respectivamente) - que contêm, entre as suas áreas estratégicas de atuação, a questão do enfrentamento à violência contra as mulheres e pela Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, que estabelece os conceitos, os princípios, as diretrizes e as ações de prevenção e
combate à violência contra as mulheres, assim como de assistência e garantia de direitos às mulheres em situação de violência.
É importante destacar ainda, a produção de dados oficiais dos serviços que realmente reflitam o fenômeno da violência contra as mulheres, para além das pesquisas de opinião e para que as políticas públicas tenham subsídios mais eficientes; o reconhecimento das diversidades culturais, sociais e geográficas de forma a tornar a Política Nacional universal, porém específica às diferentes mulheres, como por exemplo, aquelas que vivem nos campos e florestas, as mulheres negras, as indígenas, as lésbicas, jovens, idosas, que se sustentam por meio de diferentes meios produtivos e se locomovem de diferentes formas.
Esse desafio diz respeito à capilaridade do acesso aos serviços e informação, que a SPM busca trabalhar entre 2012 e 2015, por meio da regionalização das ações expressas na prioridade dada aos Territórios da Cidadania, Territórios da Paz, Municípios “Pólo” e as regiões de fronteira seca, onde existe um trânsito intenso e muitas vezes uma dificuldade na efetividade das políticas públicas, vulnerabilizando principalmente as mulheres.
Segundo os dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) 2009, existiam no país 1.043 municípios com algum tipo de “estrutura direcionada para a temática de gênero”, o que representa 18,7% do total de municípios brasileiros. A pesquisa do IBGE ainda observa que, em uma relação inversa com os indicadores de desenvolvimento humano e pobreza, proporcionalmente, a maior concentração de municípios dotados de instituições para tratar da temática de gênero está na região Nordeste e a menor no Sudeste.
Por outro lado, é importante ressaltar a importância do processo de Pactuação com os governos dos estados e distrito federal, uma vez que o critério para assinatura de acordo federativo exige a existência de Organismo de Política para as mulheres entre os critérios. Após o lançamento do Pacto Nacional, foram criados 14 Organismos Estaduais de Políticas para Mulheres, o que significou um aumento de 155% destes organismos, até novembro de 2010, quando a SPM/PR publicou o primeiro Balanço da execução do Pacto Nacional.
A Consolidação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, por meio da efetividade das ações do Pacto Nacional e da plena aplicação da Lei Maria da Penha, são condições imprescindíveis para o enfrentamento à violência contra as mulheres no Brasil. Dessa forma, são necessários recursos específicos para o funcionamento dessas políticas e garantir interfaces com outros Programas Temáticos como de Promoção da Cidadania, Direitos Humanos, Segurança Pública e Justiça Social e Autonomia das Mulheres.
Os objetivos do Pacto Nacional têm por base a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, que define os objetivos gerais e específicos do enfrentamento à violência.
Geral: Enfrentar todas as formas de violência contra as mulheres a partir de uma visão integral deste fenômeno.
OBS: O enfrentamento inclui as dimensões da prevenção, assistência, combate e garantia de direitos previstas na Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.
Específicos: Reduzir os índices de violência contra as mulheres.
Promover uma mudança cultural a partir da disseminação de atitudes igualitárias e valores éticos de irrestrito respeito às diversidades de gênero e de valorização da paz.
Garantir e proteger os direitos das mulheres em situação de violência considerando as questões raciais, étnicas, geracionais, de orientação sexual, de deficiência e de inserção social, econômica e regional.
Garantir e proteger os direitos das mulheres em situação de violência considerando as questões raciais, étnicas, geracionais, de orientação sexual, de deficiência e de inserção social, econômica e regional.