21/07 - Correio Braziliense - Democracia: poder também para as mulheres (Artigo)
Artigo da ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, publicado no jornal Correio Braziliense, em 21 de julho de 2013
Democracia: poder também para as mulheres (Artigo)
As manifestações que marcaram o extravasamento político das redes para as ruas, dessa vez no Brasil, fincaram a bandeira da reforma política ao lado das reivindicações em transporte público, educação e saúde. A nação surpreendeu-se, mas os alertas da inquietação com o modelo de representação piscavam já antes de junho. Por exemplo, na pesquisa Ibope/Instituto Patrícia Galvão, que a Secretaria de Políticas para as mulheres da Presidência da República lançou em 9 de julho.
A pesquisa veio a público no dia 9, mas foi realizada entre 11 e 15 de abril - dois meses antes, portanto, das manifestações. A necessidade de uma reforma política com um modelo mais participativo está claríssima nas respostas de 2002 de brasileiros e brasileiras de todo o país. Nelas, o modelo do (não) compartilhamento de poder nos parlamentos federal, estaduais e municipais foi questionado a partir da perspectiva da participação das mulheres no poder.
Nada menos que oito em cada 10 brasileiros e brasileiras entrevistados expressaram sua convicção de que, uma vez que as mulheres representam mais de 50% da população, elas têm de ter acesso a 50% dos postos dos legislativos. Um resultado tão expressivo demonstra que a paridade não pode mais ser adiada.
Se essa é a vontade da maioria indiscutível, e mais, se os próprios homens assinam embaixo com índices ao redor dos 70% (saiba mais em www.spm.gov.br), há que se implementá-la, mudando o atual modelo, que tem uma predominância inegavelmente masculina na ocupação dos cargos dos executivos e dos legislativos. O que fazer para apressar a mudança, já que leituras desses resultados por experts projetam que, a se deixar as coisas como estão, essa igualdade que o Brasil inteiro clama só será realidade no longínquo ano de 2163?
A resposta pode estar na própria cultura político-partidária, e, numa perspectiva mais ampla, nas bases patriarcais de nossa sociedade. Começa com a injusta divisão sexual do trabalho (tema, aliás, de evento internacional no Brasil em agosto, do qual a Secretaria de Políticas para as mulheres - SPM - participará, a Conferência da Associação Internacional de Pesquisa em Uso do Tempo).
É sabido que a atividade político-partidária e de representação exige dedicação integral. Mas o sistema patriarcal estipulou que à brasileira cabe mais do que o dobro do tempo assumido pelo homem nas tarefas domésticas - por semana, 27,7 horas para as mulheres, contra 11,2 horas para os homens (Pnad 2011). Como, então, elas poderão exercer o papel que um eleitorado lhes delegue se está escrito em pedra que é responsabilidade quase exclusivamente sua cuidar das crianças? E das pessoas idosas? E da organização das tarefas com trabalhadores/as domésticos/as? E de todo o suporte ao bem-estar da família?
Essa barreira começa antes do parlamento: a máquina partidária tem como equipamento original uma espécie de filtro antimulher. Tanto que o Brasil ocupa o 121º lugar dentre 189 países no que tange ao empoderamento delas. Isso, não obstante os movimentos de mulheres e feministas terem conquistado marcos desde 1934, ano da instalação do seu direito ao voto. Assim, avanços foram sendo conquistados com muita luta, como os 20% de candidaturas femininas, na Lei de Cotas de 1996; a destinação às candidatas de 5% (cinco por cento!) do Fundo Partidário; de ao menos 10% do tempo de propaganda partidária; da proporção mínima 30%-70% das candidaturas para cada sexo - tudo isso fruto da minirreforma de 2009.
Mas, mesmo mínimo, ainda assim esse patamar reflete a discriminação de gênero. Os partidos na prática não o implementam. A despeito da atuação firme do Tribunal Superior Eleitorial (TSE), e de termos uma presidente e mais de 25% da Esplanada sob a liderança de ministras, continuamos com representação estagnada nos parlamentos nacional, estaduais e municipais.
É por isso que a força da voz das ruas precisa ser considerada com atenção. A presidente lembrou que, da porta da rua para dentro da casa, a vida melhorou, e que isso compõe também a base das atuais reivindicações por mais direitos - que agora vão da porta da rua para fora da casa.
É com essa sensibilidade que a SPM vem se empenhando, ao lado de outros órgãos do governo e com as parlamentares, em defender e articular incessantemente a ocupação, pelas mulheres, de um espaço essencial: o espaço dos partidos. Para, com a sociedade, essa campanha chegar com força ao Congresso Nacional. Afinal, se há algo estruturante para a renovação e o vigor da democracia brasileira, e que ainda falta conquistar, esse algo é a democracia de gênero nas eleições.
Ministra de Estado chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres
Presidência da República