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MEMÓRIA E VERDADE
Primeiros debates de Relator Especial da ONU com MDHC pautam memória, verdade e medidas reparatórias para vítimas da ditadura e da escravidão

Visita oficial de Bernard Duhaime tem o objetivo de avaliar as medidas sobre a pauta adotadas pelas autoridades brasileiras sobre as violações contra os direitos humanos (Foto: Clarice Castro/MDHC)
Nesta segunda-feira, (31), o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) recebeu o Relator Especial das Nações Unidas para a Promoção da Verdade, Justiça, Reparação e Garantias de Não-Repetição, Bernard Duhaime, que está em visita oficial ao país até a próxima segunda-feira (7/4). O convite foi feito pelo Governo brasileiro, e a agenda está sendo organizada pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE) em conjunto com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Duhaime foi recebido pela secretária-executiva do MDHC, Janine Mello, que apresentou as atribuições da Assessoria de Defesa da Democracia, Memória e Verdade (ADMV), responsável por coordenar as ações de promoção e defesa do direito à memória e à verdade no país. Mais tarde, dialogou com a Comissão de Anistia e o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgãos colegiados da pasta.
Memória e Verdade
O histórico de criação da ADMV, a estrutura organizacional da assessoria e os critérios para análise dos requerimentos apresentados — tanto na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) quanto na Comissão de Anistia — foram algumas das pautas detalhadas ao relator. De acordo com Janine, entre 2001 e 2024, foram recebidos 80 mil requerimentos de anistia política, dentre os quais 94% já foram analisados. A expectativa é de que, até o final de 2026, todos os requerimentos recebidos sejam analisados pela Comissão de Anistia, que também conta com representantes da sociedade civil em sua composição.
No âmbito da Coordenação de Políticas de Memória e Verdade, foram apresentados projetos que vêm sendo implementados referentes aos períodos pós-ditaduras militares no Brasil. Em relação às ações da CEMDP, foi destacada a importância da retomada dos trabalhos após a interrupção das atividades durante o governo anterior, além de apresentadas as iniciativas relacionadas ao esforço nas atividades de busca e identificação de mortos e desaparecidos político; às retificações das certidões de óbito com alteração da causa da morte; ao recente pedido de desculpas quanto à negligência da União na guarda e identificação dos remanescentes ósseos da Vala Clandestina de Perus; e à perspectiva de um segundo encontro de familiares de vítimas da ditadura.A expectativa é de que 416 certidões retificadas sejam entregues aos familiares das vítimas com a causa da morte alterada para a informação de “morte não natural, violenta, causada pelo Estado a desaparecido no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política no regime ditatorial instaurado em 1964”. Ainda que os debates sobre a pauta tenham se aquecido pela repercussão do filme "Ainda Estou Aqui", Janine explicou que os colegiados ainda dependem de alterações legais a serem realizadas pelo Congresso Nacional para que haja uma ampliação do escopo das vítimas atingidas pela ditadura.
Durante a agenda, também foi mostrada a estrutura da Coordenação-Geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas (CGMET), voltada para a implementação de políticas de valorização da memória em torno da escravidão e do comércio de africanos escravizados para o Brasil. Um dos destaques no âmbito do governo Lula foi a criação do projeto de fixação de 100 placas para identificação de lugares de memória durante o período da escravidão no país; além da elaboração de um projeto conceitual da nova Casa da Tia Ciata como centro de referência.
Reparação histórica
A presidente da Comissão da Anistia, Ana Maria de Oliveira, apresentou um panorama dos trabalhos realizados pelo colegiado. Desde 2002, quando foi criado, o órgão analisou mais de 80 mil processos. Atualmente, 280 estão em tramitação e outros 4,4 mil aguardam por análise. A maior parte são ações individuais, mas também há casos coletivos, como crimes cometidos contra os povos originários Guarani Kaiowá.
Ana Maria defendeu, ainda, que crimes de direitos humanos não devem prescrever e que, além das reparações econômicas, as vítimas de violações recebam pedidos de desculpas formais. “Entendemos que a falta de punição aos violadores são o principal fatore de repetições de violação aos direitos humanos”, afirmou. “O Estado brasileiro precisa reconhecer essas violações e dar a esses perseguidos o direito à memória, à justiça e à reparação para que as vítimas acolhidas e essas violações nunca mais se repitam”, disse.
GT Rubens Paiva
Representantes do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) leram uma carta assinada por representantes de familiares das vítimas de violações de direitos humanos. Entre outros pontos, eles pediram a abertura dos arquivos dos órgãos de segurança de Estado, a realização de exames de DNA nos restos mortais das vítimas do Araguaia, acesso aos livros de registros dos cemitérios brasileiros nas décadas de 1960 e 1970, a reinterpretação da Lei da Anistia e a responsabilização judicial dos crimes cometidos durante o período da ditadura militar no Brasil.Eles entregaram ao relator um documento elaborado pelo Grupo de Trabalho Rubens Paiva — um dos 400 desaparecidos vítimas da ditadura militar no Brasil e que nunca foram encontrados, e cuja história foi abordada recentemente no filme "Ainda Estou Aqui" —, que pede que seja feita a análise e coleta de toda a documentação existente sobre o caso; a coleta de depoimentos de familiares, amigos e testemunhas; a requisição de informações e documentos de órgãos públicos e privados; e a realização de diligências e vistorias em locais relacionados ao caso, assim como a colaboração de organismos internacionais e a promoção de debates sobre o caso a fim de que seja elaborado um relatório final com o detalhamento dos fatos apurados incluindo a identificação de eventuais responsáveis e recomendações ao Estado brasileiro.
“A impunidade precisa ser resolvida para que a gente não perpetue essas ações de violência que são fruto da ditadura militar e que têm desdobramentos até hoje”, defendeu a vice-presidente do CNDH, Ivana Leal. “Precisamos de instituições fortes que cambatam essas violências e ajudem a fortalecer a democracia”, declarou.
Relatório final
O Relator Especial das Nações Unidas para a Promoção da Verdade, Justiça, Reparação e Garantias de Não-Repetição apresentará, em setembro deste ano, durante sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o relatório da visita feita ao Brasil, com recomendações ao país. No dia 7 de abril, ele fará uma coletiva de imprensa híbrida com as primeiras impressões da visita.
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Texto: R.M./D.V.
Edição: F.T.
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