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PARTICIPAÇÃO SOCIAL
Avançar no acesso à justiça e enfrentar impunidade: o que dizem especialistas sobre a não violação de direitos nas empresas
Quatro especialistas apresentaram propostas para subsidiar a política pública (Foto: Divulgação)
A construção da Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas passou por mais uma agenda nesta terça-feira (11). Durante a 7ª oitiva promovida pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), evento que integra o Grupo de Trabalho Interministerial sobre Direitos Humanos e Empresas, mais quatro especialistas apresentaram propostas para subsidiar a política pública.
Com o tema “Desafios à responsabilização das empresas e o sistema de justiça”, a coordenadora de Direitos Humanos e Empresas no MDHC, Beatriz Nogueira, mediou o encontro virtual ao provocar os convidados com a pergunta “Quais são as limitações que o sistema judiciário enfrenta ao tratar de violações de direitos humanos cometidas por empresas, sejam nacionais ou transnacionais, que operam no Brasil?”.
Professora do Departamento de Ciências Sociais na Universidade Federal do Espírito Santo, Cristiana Losekann, ressaltou que em conflitos socioambientais, por exemplo, há a presença de empresas. “O sistema de justiça é central nesse conflito. E as pessoas atingidas não terão o mesmo grau de influência sobre o sistema de justiça que as empresas têm”, ressaltou a cientista política, destacando que movimentos sociais e comunidades locais sempre estão em situação de desvantagem.
Para enfrentar a impunidade, Cristiana sugeriu o fortalecimento de instâncias como Ministério Público e Defensoria Pública e garantia de mecanismos de mediação e negociação que não se submetam aos interesses de grandes empresas, ignorando a atuação do Estado. “No caso brasileiro, as empresas vão sempre preferir fazer acordo. Ou seja, a legislação é vista como algo ruim, como se fosse um empecilho aos negócios”, exemplificou.
Acesso à justiça
Sobre a atuação internacional, o professor e doutor em Direito Comercial na USP Carlos Portugal Gouvêa comparou as ações civis-públicas do Brasil às ações coletivas utilizadas em países europeus e norte-americanos, e aponta para uma desvantagem nas experiências da países do Sul Global diante desse aspecto jurídico.
“No caso brasileiro, perdemos um movimento importante que acompanhou a área de direitos humanos e negócios, que foi a expansão e a globalização das ações de classe, que se iniciaram nos EUA na década de 1970. América Latina e a África não têm esse modelo”, destacou, sugerindo mudanças legislativas para haver ações de classe.
De acordo com o especialista, a vantagem se dá no aspecto de que quem move as ações coletivas são as vítimas. “A ação de classe se dá quando uma pessoa entra com ação que pede para que um coletivo seja reconhecido – o que beneficia o grupo inteiro. Isso também faz com que se tenha financiamento mais adequado”, explicou ao defender que esse processo aumentaria o poder das pessoas atingidas, diminuindo pressões por fazer acordos que, em geral, beneficiam as empresas.
Formação e monitoramento
Além de enfrentar as disparidades entre o poder econômico das empresas e ausências no cumprimento e garantias de direitos de pessoas atingidas, o encontro explorou a importância da formação acadêmica em direitos humanos por atores do sistema de justiça, como afirma o representante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap), o professor Emiliano Maldonado.
“Boa parte do sistema de justiça não possui formação adequada em direitos humanos e desconsideram os avanços em tratados internacionais. A gente tem uma carência na formação [acadêmica] da magistratura”, denunciou o advogado. Para enfrentar essa realidade, ele defende maior participação de povos originários e comunidades tradicionais no tema para garantia do direito à informação.
Para tanto, o advogado popular sugeriu a criação de canais públicos, como observatórios, para monitoramento das atividades empresariais, em especial aquelas que já cometeram violações de direitos humanos.
Raízes desiguais
Em sua fala, Emiliano ressaltou o contexto de extrema violação de direitos humanos nas empresas ao frisar as raízes brasileiras como traço da mesma linha histórica. “É preciso compreender as mazelas oriundas da nossa formação histórica, social e econômica marcada pelo colonialismo, racismo e estruturas nas quais os interesses das corporações sempre foram defendidos”, contextualizou o advogado.
Nessa mesma linha de pensamento, o presidente do Instituto Luiz Gama, Renato Aparecido Gomes, advogado e acadêmico negro, usou da cultura africana para relembrar a imagem de Sankofa, símbolo da ancestralidade, representado por um pássaro que está voando, mas olhando para trás. “A gente deve avançar, mas sempre considerando nossas origens”.
O representante do Luiz Gama aproveitou a oportunidade para refletir sobre as primeiras violações após a chegada dos portugueses ao Brasil: a escravização de africanos. “O início desse processo cria um vínculo fundamental na estrutura do pensamento que nos acompanha. A estrutura da formação, da imaginação e da constituição de mundo parte daí, por isso há uma naturalização do descomprometido das normas relacionadas aos direitos humanos”, descortinou.
“O problema é complexo. Não bastam soluções simples. É necessário um conjunto de soluções que consigam efetivamente dar as respostas necessárias a essa estrutura”, reconheceu, sugerindo avanços como necessidade de inovação jurídica, desde a formação dos juristas; criação de tratado internacional; incentivos fiscais; regulação de mercado e criação de selo de responsabilidade governamental.
Assista à íntegra da oitiva.
Sobre o GTI
Criado em novembro de 2023 por meio de decreto presidencial, o Grupo de Trabalho Interministerial para elaboração da Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas conta com representantes de 17 ministérios e tem como competência a elaboração estudos sobre os ordenamentos jurídicos nacional e internacional de proteção de direitos humanos com relação à atividade empresarial.
Leia mais:
Conheça todas as fases da criação da Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas
Texto: R.D.
Edição: B.N.
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