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Ministério debate infanticídio indígena em reunião de autoridades em direitos humanos do Mercosul
Sandra Terena (E), Maíra Barreto, Silvia Waiãpi e Kanhu Kamayurá debateram infanticídio indígena. (Foto: Willian Meira / Ascom MMFDH)
A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, fez nesta terça-feira (26) o discurso de abertura da 16ª Reunião de Altas Autoridades sobre Direitos Humanos e Chancelarias do MERCOSUL e Estados Associados (RAADH). O evento, realizado na Escola Nacional de Governo (ENAP), das 14h às 17h, em Brasília/DF, debateu o tema “Infanticídio Indígena”, que se refere a práticas culturais que preveem o sacrifício de bebês com deficiência, filhos de mães solteiras ou gêmeos.
O evento foi baseado na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais em Estados Independentes, que apresenta importantes avanços no reconhecimento dos direitos indígenas coletivos, com significativos aspectos de direitos econômicos, sociais e culturais. Atualmente, é o instrumento internacional mais atualizado e abrangente referente às condições de vida e trabalho dos indígenas.
“Essa legislação, já recepcionada pelo Congresso Nacional, e que, portanto, têm força de lei, prevê que o direito mais importante é o direito à vida. Temos que buscar o diálogo com essas tribos que ainda praticam esses atos, sem que isso aumente o preconceito contra elas. A cultura da morte jamais deve se perpetuar. O que devemos fazer é evitar que mães tenham que chorar por suas crianças”, defendeu a ministra.
Autora do do documentário “Quebrando o Silêncio” (2009), que denuncia práticas infanticidas de diversas aldeias, a Secretária Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR), Sandra Terena, destacou que infanticídio pode ser praticado tanto por decisão própria da mãe ou do pai como por pressão externa – como por ordem de um cacique.
“Uma mãe que é obrigada a fazer isso sofre para o resto da vida. Mãe é mãe em qualquer lugar. Algumas delas ficam histéricas depois disso, não se recuperam. E como a gente pode considerar isso cultura”, diz Sandra, também uma indígena.
A secretária Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Sílvia Waiãpi, contou a própria história relacionada ao tema. Segundo ela, o irmão, com paralisia cerebral, foi jogado de um precipício por ser considerado “inútil” para a tribo, já que não conseguia caçar ou coletar alimentos. Acabou tetraplégico.
“Minha mãe o salvou e conseguiu leva-lo a uma instituição. Teve o prior tratamento da vida, mas se recuperou. Foi tratado como bicho, como porco. O lavavam com jatos de água fria, pois não se mexia. Hoje é artista plástico e me dá muito orgulho ver no que se transformou”, disse, muito emocionada.
A indígena Kanhu Raka Kamayurá, vítima de tentativa de infanticídio e que acabou paraplégica após a prática, contou que durante a infância foi mantida isolada do restante da tribo e proibida de deixar a oca, por ser considerada amaldiçoada.
Para Maíra Barreto, doutora em Direitos Humanos e especialista no tema, os infanticídios em certas tribos indígenas são geralmente praticados em razão de crenças ou do desejo de manifestar repúdio a atos considerados imorais.
Ela, que é também advogada, explicou que algumas podem ser enterradas vivas, sofrer envenenamento ou simplesmente ser abandonadas. Para a especialista, é possível vencer a barreira cultural e salvar as crianças, sem aumentar o preconceito para com os indígenas.
“Basta contarmos as históricas, basta que as pessoas conheçam essa realidade a partir do depoimento das mães ou das tentativas de feminicídio. Quando as pessoas conhecerem essas histórias vamos mudar essa realidade”, explicou.