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Em entrevista coletiva, CNDH manifesta preocupação com militarização da política e teme acirramento da violência durante processo eleitoral
Em entrevista coletiva concedida na tarde da última quinta-feira (12), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) manifestou preocupação com o clima de intolerância política vivido no país nos últimos meses. Para o CNDH, o Brasil vive um cenário de instabilidade democrática e de real ameaça ao Estado Democrático de Direito.
De acordo com o Conselho, a intervenção federal no Rio de Janeiro, o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), o ataque à caravana do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Sul e as declarações do General Villas Boas no Twitter são exemplos de fatos recentes que sinalizam um aprofundamento Estado de exceção, e compõem este cenário de instabilidade que coloca o Estado Democrático de Direito em jogo.
“Desde o impeachment temos assistido o aprofundamento do Estado de exceção em várias frentes. Por isso, deliberamos por sistematizar um documento com a memória do que o CNDH tem manifestado de preocupação nesse sentido, para encaminhar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”, afirma Fabiana Severo, presidenta do colegiado.
Intolerância e violência política
Darci Frigo, vice-presidente do Conselho, informou que vários fatos que marcaram a conjuntura recente foram tratados como muito graves pelo colegiado, cujo Plenário, reunido em Brasília nos últimos dias 11 e 12 de abril, entendeu como sinais de fascismo o aumento da intolerância e da violência política.
“O que aconteceu no país, seja na expressão da execução da vereadora Marielle, seja contra a caravana do ex-presidente Lula, mostra que temos um aprofundamento do fascismo no Brasil, que é não combater a ideia do outro, mas procurar eliminar o outro de quem se diverge”, pontua Frigo, que cita também as ameaças que as vereadoras Talíria Petrone (Niterói/RJ) e Natália Bonavides (Natal/RN) vêm recebendo.
“Tratamos todas essas questões e decidimos por uma série de providências: vamos enviar ofício aos governadores dos três estados do Sul por conta da omissão das autoridades policiais em relação ao ataque à caravana do Lula; no caso da Marielle, já havíamos ido ao RJ e agora estamos oficiando novamente o Ministério Público e as autoridades locais para cobrar resultados sobre a apuração do caso; e no caso das vereadoras, vamos pedir informações às autoridades locais buscando também a adoção de medidas para garantir a vida dessas pessoas”.
Liberdade de atuação política, violência e eleições
Fabiana Severo alerta também para o “cerceamento da livre expressão democrática e da liberdade de atuação política” que, segundo ela, se dá não apenas por meio do aumento da violência policial contra manifestantes e defensores de direitos humanos, mas também da tramitação de Projetos de Lei e de ações no Supremo que apontam para a restrição do direito à manifestação e para a criminalização dos movimentos sociais.
Ela afirma que há uma tentativa de silenciamento do debate público, por meio da promoção de um ambiente de insegurança e da política do medo. “Nos posicionamos contra esse discurso de medo e insegurança. Precisamos manter as nossas instituições sólidas, democráticas. Precisamos manter os poderes constituídos, para que as eleições democráticas sejam realizadas num contexto de livre manifestação política, sem esse cenário que ameaça se instalar”, reforça Fabiana.
Ela avalia, porém, que há uma tendência ao acirramento desse contexto com as eleições. “É porque tememos que isso vá se acirrar até o processo eleitoral que estamos nos posicionando agora. Para mostrar para a sociedade que esse rumo não é o mais adequado, e que precisamos ser intransigentes na defesa da democracia”, completa.
Seletividade e insegurança jurídica
Questionada sobre a prisão em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a presidenta do CNDH lembra que o Conselho já havia se posicionado sobre o princípio da presunção da inocência e da prisão em segunda instância, inclusive, levou os temas para a audiência com a presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF), Carmen Lúcia, em março do ano passado.
“Esse cenário de ameaça e instabilidade é acentuado pela judicialização da política. Temos um direito penal seletivo. Em relação a ricos e pobres, que promove o encarceramento em massa, e em relação à judicialização da política. Nós temos seletividade até quanto à velocidade dos processos”, afirma Fabiana, ressaltando que isso ameaça “outra estrutura basilar do Estado Democrático de Direito”, que é a separação dos poderes.
Frigo complementa dizendo que, o fato de romper a presunção da inocência gera uma insegurança e uma instabilidade na sociedade. “Se a Justiça é capaz de prender um ex-presidente da República através de um processo de seletividade, o que vai acontecer com um pessoa comum da sociedade, ou com um representante do movimento social? O Judiciário dá uma sinalização muito grave de não mais preservar as garantias constitucionais, e os mais fracos certamente serão os maiores prejudicados nesse processo”.
Militarização da política e intervenção no Rio de Janeiro
O Conselho também demonstrou preocupação com a militarização da política, manifestada pela ocupação de cargos importantes no Estado por membros das Forças Armadas, pelas falas públicas de generais, e pelo fato se ser um general o interventor no Rio de Janeiro.
“A intervenção no Rio de Janeiro é lida por nós como um ensaio político-militar para outras ações”, ressalta Darci Frigo, acrescentando que, em reunião realizada no Rio de Janeiro no dia 5 de março para tratar do tema, o Conselho verificou que a condução de uma pessoa detida pelo Exército já não foi de acordo com o que é normal num Estado Democrático de Direito.
“A pessoa foi levada para uma unidade do Exército, e nenhum defensor, advogado ou advogada sabia onde essa pessoa poderia se encontrar para ser defendida. Isso é manifestação clara de dois anos de aprofundamento do Estado de exceção”, finaliza Frigo.
Nota pública
No dia 6 de abril, o havia manifestado publicamente seu repúdio às reiteradas ameaças ao Estado Democrático de Direito, além de “extrema preocupação com o atual contexto de judicialização da política no Brasil”.
Para o CNDH, “a aplicação seletiva do direito penal, inclusive quanto à velocidade do processo, em detrimento das garantias do devido processo legal e da ampla defesa, bem como do respeito ao princípio constitucional da presunção de inocência, fortalece expressões que não prezam pelo Estado Democrático de Direito e pela defesa dos direitos humanos, e gera um ambiente de permissão à utilização de instrumentos de criminalização da livre atuação política e manifestação democrática”.
Na nota, o CNDH também reafirmou o seu compromisso com a defesa dos princípios democráticos e do direito à liberdade de atuação política e de manifestação, como pressupostos dos direitos humanos, garantidos pela Constituição Cidadã de 1988 e pelos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro. Leia a nota na íntegra: https://bit.ly/2uXbTQ8
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