Notícias
PROJETO JANDAÍRAS
Mulheres que Transformam a Sociobiodiversidade Nordestina com Saberes Tradicionais e Sororidade
Foto: Bárbara Mariani
No sertão, onde a terra árida desafia a vida, florescem iniciativas que transcendem as dificuldades e unem a força das mulheres em prol da comunidade, da natureza e da vida. É nesse contexto que surge o projeto Jandaíras: Mulheres e Saberes Tradicionais Transformando a Sociobiodiversidade Nordestina, iniciativa que vai além da produção agroecológica, promovendo o empoderamento de mulheres pertencentes aos povos e comunidades tradicionais do Nordeste e de Minas Gerais.
O nome Jandaíras evoca a essência de uma abelha nativa da Caatinga cuja existência é um indicador de preservação do bioma. Assim como as jandaíras, que trabalham em cooperação para polinizar as plantas da Caatinga, essas mulheres se unem, refletindo a sororidade e o cuidado que são pilares do feminismo comunitário que o projeto busca promover.
Uma dessas mulheres é a jovem Fernanda Nunes, de 27 anos, natural de Sanharó, Pernambuco. Filha de agricultores do agreste e estudante de agronomia na Universidade Federal Rural de Pernambuco, Fernanda encontrou no projeto Jandaíras uma verdadeira paixão e um caminho para sua carreira. "Entrar no projeto foi um norte. Eu estava sem saber por onde seguir no meu curso. Quando conheci o Jandaíras, encontrei um propósito, uma forma de usar os conhecimentos que adquiri com minha família na agricultura familiar e os acadêmicos a favor das comunidades," relata Fernanda.
O primeiro contato de Fernanda com o projeto aconteceu durante uma feira de agricultura familiar, onde ela e seus pais vendiam queijos artesanais de leite de cabra produzidos pela família. Foi ali que conheceu a professora Laeticia Jalil, coordenadora do projeto, que a inspirou a se envolver e a transformar a paixão em ação.
O projeto Jandaíras se destina a mulheres pertencentes a comunidades tradicionais, como quebradeiras de coco babaçu, indígenas, quilombolas, pescadoras artesanais e outras, distribuídas por dez estados brasileiros.
Ao todo, 37 grupos participam do projeto, e em cada grupo jovens mulheres pertencentes a esses grupos atuam como agentes de desenvolvimento rural, fortalecendo a autonomia e a capacidade produtiva dessas comunidades. "Nosso objetivo é gerar renda e promover a inserção dessas mulheres no mercado, respeitando e valorizando a diversidade dos seus produtos, que vão desde alimentos agroecológicos até artesanatos," explica Laeticia.
Joana Franco, de 21 anos, integra uma comunidade de pescadoras artesanais em Barra do Sirinhaém e é participante territorial do projeto. Para ela, o projeto Jandaíras significa mais do que uma oportunidade de aprendizado: é uma forma de honrar a tradição familiar e fortalecer a autonomia das mulheres de sua comunidade. "O Jandaíras trouxe visibilidade para nós, mulheres marisqueiras, e nos deu a força para comercializar nosso pescado" conta Joana.
Estudante de administração, Joana acredita que sua participação pode ajudar as mulheres pescadoras nos processos de pescado, documentações e outras situações práticas. “Sempre estive envolvida com a colônia de pescadores, então acredito que por isso fui escolhida, não necessariamente pelo curso em si, apesar do conhecimento do curso também ser muito útil no dia a dia, em questões de comércio, finanças, e gestão do dinheiro”, esclarece Joana, que, após entrar no projeto, tem como novo objetivo de cursar ciências biológicas.
O projeto Jandaíras surgiu a partir de ações com as redes territoriais e da necessidade de qualificação e adequação das experiências produtivas das mulheres, especialmente para o acesso a mercados. “A ideia era adequar as produções para acesso a diferentes tipos de mercados, como institucionais, convencionais e novos mercados, sem padronizar, mas valorizando a diversidade e a identidade dessas produções”, explica a coordenadora do Projeto, a Professora Laeticia Jalil.
Iniciado em fevereiro de 2024, o projeto já completou a primeira grande etapa, que envolveu a caracterização e o diagnóstico dos grupos. Atualmente, o foco está na visita às comunidades, na capacitação, na compra de equipamentos e no acompanhamento técnico, que acontecerá na forma de intercâmbio entre a juventude. "Queremos que cada grupo encontre seu próprio caminho para a comercialização, seja por meio de e-commerce, feiras, ou mesmo pelo acesso ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)," comenta Laeticia, destacando a importância de respeitar as especificidades de cada grupo.
Composto, em sua estrutura de organização, por jovens mulheres, o projeto liderado por Laeticia busca demonstrar que a juventude desempenha um papel crucial no desenvolvimento local e na geração de oportunidades, mostrando que os jovens não precisam sair de suas comunidades para ter um impacto significativo e criar fontes de renda.
Laetícia esclarece que nesse processo a juventude é fundamental: “Queremos mostrar que os jovens não precisam sair de suas comunidades para gerar renda e ter um papel importante. Além de adequação e compra de equipamentos, o projeto inclui bolsas para jovens que acompanham os grupos, atuando como comunicadores, mobilizadores e participantes de processos formativos. A ideia é que esses jovens, através de intercâmbios, cursos e redes sociais técnicas, se fortaleçam e ampliem suas redes de contato”.
As participantes do projeto são jovens bolsistas. As bolsistas Territorial são indicadas pelos grupos locais, enquanto as universitárias passam por um processo seletivo, que inclui análise de currículo e entrevista. “Buscamos entender o interesse delas em extensão e trabalhar com essas temáticas, como feminismo, antirracismo, e agroecologia”, explica Laeticia.
Parceria com o MDA
O Projeto é fruto de um Termo de Execução Descentralizada (TED) entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), por meio da Secretaria de Territórios e Sistemas Produtivos Quilombolas e Tradicionais (SETEQ), em colaboração com a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). A Secretaria tem o papel de gerenciar a descentralização de recursos, acompanhar e oferecer suportes necessários à execução.
Para Marina Verne, da SETEQ/MDA, "o envolvimento ativo dos jovens é fundamental não apenas para a continuidade das ações após a saída da equipe técnica, mas também para garantir a sucessão e a sustentabilidade do projeto no campo".
Mais do que uma iniciativa de desenvolvimento rural, o Jandaíras é uma rede de apoio e crescimento, onde mulheres e jovens compartilham conhecimentos e constroem um futuro mais justo e sustentável. “Trabalhamos a multidisciplinaridade, que é essencial para atuar junto a projetos de assistência técnica feminista e antirracista,” finaliza Laeticia, reforçando a importância do projeto na transformação da sociobiodiversidade nordestina.