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Direitos Humanos
Estado brasileiro pede desculpas à família de sem-terra assassinado
(Imagem: Reprodução - YouTube/Corte IDH)
O Estado brasileiro reconheceu que violou direitos e garantias na condução do processo penal sobre o assassinato do trabalhador rural sem-terra Manoel Luiz da Silva, morto a tiros em maio de 1997, em São Miguel de Taipu, na Paraíba. O trabalhador foi morto em um contexto de luta por terra e pela reforma agrária.
O caso foi parar na Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), com sede na Costa Rica. Nessa quinta-feira (8), a Corte IDH ouviu a acusação e os representantes do Estado brasileiro sobre o caso. Não há prazo para o Tribunal emitir a sentença final.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) participou intensamente do debate. A diretora de Conciliação e Mediação de Conflitos Agrários, Claudia Dadico, atuou como perita do Brasil e a diretora da Câmara de Conciliação Agrária do Incra, Maíra Coraci, compôs a representação brasileira no caso.
"Essa foi a primeira vez que o Brasil reconheceu a violação de direitos humanos e trouxe publicamente a importância da política de reforma agrária neste enfrentamento", confirma Coraci.
Durante a sessão, a representante da Advocacia-Geral da União (AGU), Taiz Marrão, pediu desculpas à família de Manoel Luiz.
“O Estado brasileiro manifesta publicamente seu pedido de desculpas aos familiares do senhor Manoel Luiz da Silva. O Estado brasileiro, assim, reafirma sua plena disposição em honrar os compromissos assumidos internacionalmente quanto à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e com o Sistema Interamericano de Direitos Humanos”, diz o comunicado da AGU.
O Estado brasileiro reconheceu que os 16 anos para processar o caso, com absolvição dos acusados, violou o direito da família a um processo com prazo razoável, causando sofrimento pela demora excessiva, violando a integridade psíquica e moral dos familiares de Manoel Luiz da Silva.
“A perda de um ente querido, somada à espera alargada por uma resposta estatal, constitui inelutável violação da integridade psíquica e moral dos familiares do senhor Manoel Luiz da Silva”, informa a AGU.
Na audiência, a representante da AGU reconheceu que a desigual distribuição de terras no país é uma mazela secular que repercute, ainda hoje, na conjuntura brasileira. “Reconhece-se que a alta concentração de terras gera exclusão social, impacta a produção e os preços de gêneros alimentícios e é, sem dúvida, motivo de intenso conflitos no meio rural” afirmou a advogada Taiz Marrão.
As organizações que representam o trabalhador na Corte internacional, em nota, saudaram o reconhecimento do Estado brasileiro e o pedido de desculpas.
“As representantes também consideram positivo o reconhecimento da violação à integridade pessoal dos familiares de Manoel, que esperam há mais de 20 anos por uma resposta efetiva do Estado”, afirmaram a Justiça Global, a Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 e a Dgnitatis.
Por outro lado, as organizações questionam a decisão do Estado brasileiro de reconhecer as violações apenas na audiência na Corte Interamericana, “quando poderia tê-lo feito antes, impedindo que se abrisse um espaço de diálogo real com as vítimas e suas representantes quanto aos limites desse reconhecimento, bem como sobre as medidas de não repetição.”
As entidades pedem que o Estado se manifeste sobre as demais violações apontadas pela denúncia, como “direito à verdade e sua relação com a violência aos trabalhadores e trabalhadoras rurais; impactos na vida familiar durante as décadas que se passaram desde os fatos; e a necessidade de empreender modificações legislativas que garantam a não repetição de violações semelhantes”.
O filho do sem-terra assassinado, Manoel Adelino, hoje com 31 anos, afirmou à Agência Brasil, antes da audiência desta quinta, que espera que o julgamento faça justiça e que a Corte IDH puna o Estado Brasileiro por omissão e por não investigar e punir corretamente os responsáveis pelo homicídio do pai.
“A esperança é que esse julgamento, que a Corte, possa analisar e penalizar os responsáveis, que são o Estado brasileiro, que deixa ocorrer essas fatalidades. A esperança é que seja feita justiça”, afirmou Adelino.
Caso Manoel Luiz
O caso foi parar na Corte IDH por iniciativa de organizações como a Comissão Pastoral da Terra da Paraíba e a Justiça Global, que apelaram ao órgão internacional para cobrar a responsabilidade do Estado brasileiro em relação a esse crime.
Antes de a Corte IDH julgar o caso, ele foi investigado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Ao concluir seu parecer em novembro de 2021, a CIDH afirmou que, apesar das inúmeras provas que apontavam os responsáveis pelo crime, “a omissão da polícia com relação às diligências essenciais inviabilizou a persecução penal dos responsáveis, entre eles do autor intelectual”.
O órgão lembrou que “uma das pessoas acusadas foi absolvida, que as demais ainda não foram julgadas, que as deficiências probatórias não foram sanadas e que não se esgotaram todas as linhas de investigação, o que é incompatível com o dever de investigar com a devida diligência”.
A Corte IDH
A Corte Interamericano de Direitos Humanos (Corte IDH) é um dos tribunais regionais de proteção dos direitos humanos. É uma instituição judicial autônoma, com objetivo de aplicar a Convenção Americana Sobre Direito Humanos. O Brasil, enquanto integrante da Organização dos Estados Americanos (OEA) reconhece a competência da Corte para julgar violações de direitos humanos nos Estados-membros sob sua jurisdição.
Se o Estado brasileiro for considerado culpado, a Corte IDH pode determina que o país tome medidas para reparar as famílias afetadas e capazes de evitar que novos crimes como esse ocorram no país.
Com informações da Agência Brasil