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Painel debate maneiras da sociedade se beneficiar e aproveitar melhor os dados científicos
Foto: Marcelo Castro
As perspectivas do Brasil, da Alemanha e do Reino Unido sobre a interface entre ciência, comunicação, engajamento e políticas públicas buscou responder como as sociedades podem se beneficiar e aproveitar melhor os dados científicos. O painel foi organizado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em parceria com a Rede Clima, Instituto Alana e WWF-Brasil. O objetivo foi esclarecer os principais desafios para incorporar as evidências científicas sobre mudança do clima por todos os setores da sociedade.
O debate foi mediado pelo vice-coordenador da Rede Clima, Jean Ometto, e realizado durante a COP29 no estande ‘Ciência para Ação Climática’, organizado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) e outras instituições parceiras.
O painel foi motivado pelo recente lançamento do relatório ‘Mudança do Clima no Brasil - Síntese Atualizada e Perspectivas Estratégicas’. O documento sintetiza os aspectos relevantes sobre o Brasil contidos nos relatórios do IPCC publicados ao longo de todo o Sexto Ciclo de Avaliação (AR6) e avança em alguns aspectos para conhecimento atual acerca do desafio que a mudança do clima representa para o país.
“A ideia é mostrar o que a ciência já sabe, o que podemos esperar para o futuro e o que devemos fazer para enfrentar a mudança do clima”, afirmou o coordenador-geral de Ciência do Clima do MCTI, Márcio Rojas, ao apresentar as mensagens-chave do documento e a relevância de informações atualizadas sintetizadas para apoio à tomada de decisão.
Rojas mencionou ainda como a ciência tem contribuído com a construção de instrumentos nacionais, como o novo Plano Clima, nas vertentes de adaptação à mudança do clima e de mitigação de emissões de gases de efeito estufa, e na definição da meta para 2035 da segunda NDC brasileira, que menciona explicitamente o compromisso de utilizar a melhor ciência disponível. “Estamos envolvidos e contribuindo para que o Brasil siga em uma boa direção”, sintetizou.
Independência científica
O chefe da Divisão Europeia e Internacional de Adaptação à Mudança do Clima, Ulf Jaeckel, destacou como a ciência tem contribuído para o processo de decisão e priorização das ações de adaptação do governo alemão. “A ciência é muito importante para nossas políticas públicas”, disse. Jaeckel relatou que o governo tem empreendido esforços em prover informações sobre risco climático e destacou a importância de preservar a credibilidade das informações com embasamento científico que são prestadas para a formulação de políticas. “A independência científica permanece mantida. Se isso não acontecer, perde a credibilidade das políticas”, explicou. “Temos que cuidar bem disso o tempo todo. É um tópico importante”, complementou.
Recomendações baseadas em evidências
A chefe para Net Zero do Climate Change Committee (CCC), Emily Nurse, compartilhou a experiência do Reino Unido em ter adotado um comitê independente de especialistas em 2008 para fazer recomendações ao governo sobre metas para redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) e de risco climático para adaptação, e também acompanha o progresso no alcance das metas de todo o Reino Unido com o objetivo de alcançar a neutralidade de emissões em 2050.
O comitê é transdisciplinar composto por profissionais de diversas áreas do conhecimento. A cada cinco anos há um orçamento de carbono, que é juridicamente vinculativo, que estabelece quanto o Reino Unido pode emitir de GEE e que vai reduzindo progressivamente com o objetivo de reduzir continuamente as emissões e que pavimente o caminho até a neutralidade. O Comitê recomenda o nível de orçamento de carbono e isso ocorre 13 anos antes. Segundo Nurse, neste momento, estão debatendo o orçamento do sétimo ciclo, que engloba o período de 2038 até 2042. Isso permite planejar as tecnologias e a infraestrutura necessárias para atender as reduções propostas. “Nós realmente utilizamos evidências científicas para fornecer essas recomendações”, sintetizou.
Segundo ela, o país já conseguiu reduzir em 50% as emissões de GEE, comparado ao ano de 1990, e que recentemente o governo adotou a recomendação da meta de reduzir em 81% as emissões até 2035 para a nova NDC.
Linguagem é primeira barreira a ser vencida
A analista de Natureza do Instituto Alana, Carolina Maciel, aportou ao debate as preocupações sobre a infância relacionadas à formulação de políticas públicas sobre mudança do clima. Segundo ela, no mundo cerca de 1 bilhão de crianças estão enfrentando riscos climáticos diversos. No Brasil, são cerca de 40 milhões com riscos climáticos e ambientais. Atualmente, cerca 99% das crianças respiram ar poluído e representam 25% dos deslocamentos climáticas. “As crianças são vulneráveis pela própria fase de desenvolvimento e pelos processos históricos que as colocam como vulnerabilizadas”, afirmou. “As crianças são muito impactadas e precisam fazer parte das discussões, dos processos de decisão e de formulação de políticas públicas. Elas são um terço da população mundial”, analisou enfatizando a necessidade de escutar as crianças e entender quais são suas necessidades.
Para Maciel, tornar a linguagem mais acessível é a primeira forma de quebrar a barreira de abordar o tema da mudança do clima com crianças, que são hoje um terço de toda a população mundial e são as mais vulneráveis à mudança do clima. “A linguagem precisa ser acessível, precisa ser inclusiva, precisa olhar para as infâncias e considerá-las. Esse é o primeiro caminho”, disse.
Incorporar o conhecimento das comunidades
A especialista de mudança do clima da WWF-Brasil, Flavia Martinelly, abordou a importância de incluir as vozes das comunidades que sofrem diretamente os impactos da mudança do clima nos processos de construção de políticas públicas. “Elas trazem e traduzem com muito mais urgência as questões da crise climática e que cobram a ação das políticas públicas”, explicou.
Martinelly relatou a experiência de apoio a organizações locais na Amazônia, que incluem mulheres e jovens, para aprender a ocupar espaços políticos e sociais, e como foi enriquecedor a participação de cerca de 40 organizações comunitárias que apresentaram diretamente suas demandas para o Plano Nacional de Adaptação. “Houve resultado muito positivo tanto para o governo brasileiro que pode ouvir, quanto para as organizações que puderam entregar suas demandas de modo mais direto e sem mediadores. Esse é um caso de exemplo de como a gente pode fazer as políticas”, avaliou.
Assista à íntegra do painel neste link.