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ANTÁRTICA: projeto brasileiro busca quantificar plástico transportado do Pacífico para o Atlântico Sul
O estreito de Drake, localizado entre o extremo sul do continente americano e a península Antártica é considerado uma das regiões mais biodinâmicas no globo terrestre. Além das profundezas que impõem cautela aos mais experientes navegadores, guarda segredos que a ciência ainda busca desvendar.
“É uma região extremamente complexa, muito turbulenta, agitada, no limite perigosa, grande quantidade de naufrágios historicamente”, explica vice-reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Moacyr Araújo.
O pesquisador coordena o Mephysto, um dos seis projetos selecionados em 2018 pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e que integram a 41ª Operação Antártica (Operantar). Iniciada em outubro deste ano, a Operação se estende até abril de 2023. Ao longo de todo o verão austral, cerca de 130 pesquisadores brasileiros realização pesquisas no continente gelado. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) é o responsável pela gestão científica do programa, que completou 40 anos em 2022.
É no Drake que a roseta, um equipamento que coleta amostras de água, é lançada ao mar pelo navio Polar Almirante Maximiano. Nesta operação, o navio conseguiu que o equipamento descesse a 2 mil metros de profundidade. O objetivo é identificar e quantificar o plástico transportando do oceano Pacífico para o Atlântico por meio da corrente marítima Círculo Polar Antártica, que gira com força em torno do continente antártico. A corrente age como uma centrífuga atraindo os materiais. “A corrente circula e funciona como um sistema acumulador de plástico”, afirma o pesquisador.
A complexidade para coletar as amostras nessa região envolve segurança. O navio percorre o trecho em baixa velocidade, cerca de 3 nós náuticos (o que equivaleria a de 5,5 km/h). É quando o equipamento é lançado ao mar e fica arrastando por aproximadamente 20 minutos. Eles chamam de ‘rede mansa’.
É a segunda ocasião em que a coleta com essa finalidade foi efetuada por pesquisadores brasileiros. Os dados da primeira coleta, realizada em 2019, ainda estão em processamento em decorrência da pandemia. Mesmo assim, Araújo antecipa que dados preliminares indicam uma quantidade muito grande de plástico encontrada nessa região e que pode ser comparada ao quantitativo encontrado em regiões costeira, que são mais sujeitas à ação antrópica.
A coleta de amostras no Drake integra o projeto europeu denominado AtlantECO, que também avalia a o transporte de plástico do oceano Índico para o Atlântico. As medições são realizadas no Sul da África, a partir da corrente das Agulhas – ponto em que ocorre a troca da água mais quente e salgada para o Atlântico. “Seremos capazes de identificar um balanço quantitativo e qualitativo de plástico, pelo menos nessa época do ano. Tanto o que chega do Índico quanto do Pacífico. Isso é de fato uma contribuição científica enorme”, avalia Araújo indicando que há necessidade de avaliar o tipo, a composição, e a quantidade de plástico. “Precisamos quantificar essa dinâmica. Conhecemos muito da distribuição, sobretudo no Atlântico Norte e no Pacífico. No Atlântico Sul, conhecemos um pouco, mas na antártica conhecemos quase nada. É uma fronteira a ser conhecida”, relata o pesquisador.
Outro aspecto que o pesquisador menciona é de que aliado ao derretimento da calota polar antártica, o descolamento para o sul da corrente do círculo polar antártica contribui para a erosão da calota polar antártica, ou seja, um efeito retroalimentador.
Vórtices – A rota para a Antártica inclui também a passagem pela confluência entre as correntes marítimas do Brasil e das Malvinas, considerada uma área de atividade em larga escala. O encontro das águas quentes do Atlântico com a temperatura mais baixa do Pólo Sul ocorre abaixo do rio da Prata, mais ou menos na altura do Uruguai. As correntes formam vórtices quentes e frios, que têm comportamento totalmente distinto.
De modo simplificado, os vórtices são redemoinhos em alto-mar. Segundo Araújo, eles apresentam estruturas internas com comportamento dinâmico, biológico e ecológico peculiares. “Quando se começa a analisar a biodiversidade dentro desses vórtices vê-se que há uma biocomplexidade elevada, totalmente diferente do que há ao redor”, explica o pesquisador. “Compreender isso auxilia no entendimento de como pode influenciar toda a distribuição de componentes biológicos que podem chegar à costa do Brasil por meio das correntes marítimas”, complementa.
Além disso, o pesquisador aponta que as trocas de dióxido de carbono (CO2) atmosféricas com o oceano são totalmente diferentes dentro desses vórtices, ou seja, há troca de calor diferenciada que influencia na interação oceano atmosfera toda a formação de ciclones naquela região. “Tudo isso tem um impacto enorme na própria dinâmica do clima brasileiro. Entender isso é fundamental”,
O projeto Mephysto agrega ainda uma componente atmosférica no escopo de pesquisa. As coletas de partículas presentes na atmosfera oceânica são realizadas desde a partida do navio do Rio de Janeiro. As medições são realizadas em toda a rota avaliando distribuição, concentração, estrutura meteorológica em todo o trajeto até a chegada na Estação Antártica Comandante Ferraz.
Acompanhe a série especial de reportagens que o MCTI preparou sobre 41ª Operação Antártica e conheça melhor os projetos científicos brasileiros desenvolvidos no continente gelado.
Leia aqui a reportagem que aborda o trabalho dos pesquisadores brasileiros no continente gelado e o projeto que que avalia os impactos sobre o corpo humano, e neste link conheça a importância para a biotecnologia sobre a maior coleção de fungos antárticos
Amanhã vamos conhecer como a realização de pesquisas são fundamentais para a manutenção do Brasil no Tratado da Antártica.