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Brasil compartilha com países da América do Sul experiência sobre vigilância de vírus em animais silvestres
Especialistas em vigilância epidemiológica do Brasil e de mais seis países da América do Sul reuniram-se nesta quarta-feira (16) para compartilhar experiências sobre vigilância de vírus em animais silvestres e debater possibilidades de cooperação, incluindo a criação de alertas rápidos na região. A oficina foi proposta pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), por meio da Secretaria de Pesquisa e Formação Científica (SEPEF), em parceria com o Ministério das Relações Exteriores (MRE), por meio do Programa Diplomacia e Inovação. Participaram mais de 20 especialistas, representantes da Argentina, Colômbia, Guiana Francesa, Paraguai, Peru e Uruguai.
A América do Sul possui rica diversidade de fauna e pode ter potencial aumento no número de zoonoses em cenários de mudanças climáticas e de emergência de novos vírus.
Na abertura da reunião, o Diretor do Departamento de Ciências da Vida e Desenvolvimento Humano e Social (DECIV) do MCTI, Fábio Larotonda, apresentou as estratégias adotadas pela pasta para o enfrentamento da pandemia no Brasil. O diretor detalhou as iniciativas no âmbito da RedeVírus MCTI e enfatizou uma das linhas de ação que envolve sistemas de vigilância epidemiológica, por meio de águas residuais e de monitoramento de animais silvestres. “O monitoramento de águas residuais é um sistema de alerta precoce que permite antecipar entre uma e duas semanas possíveis surtos de Covid-19 em determinada região”, detalhou Larotonda.
Em relação ao monitoramento de animais silvestres, o diretor destacou a criação da Rede Nacional de Vigilância de Vírus em Animais Silvestres (Rede Previr). A rede de pesquisa, que, atualmente, envolve oito instituições-chave e cerca de 50 pesquisadores, foi criada em fevereiro de 2020 pelo MCTI e dedica-se à vigilância epidemiológica de patógenos em animais silvestres com potencial de emergência para as pessoas. O monitoramento é realizado nas cinco regiões do País e é uma das estratégias financiadas pelo MCTI para o combate à pandemia da Covid-19.
As ações do Brasil, que possui território com dimensões continentais, para a vigilância epidemiológica e coleta de material, podem ser úteis para toda a região. Por isso, segundo Larotonda, a pasta ministerial considera de grande relevância a cooperação entre os países em face de futuros novos desafios que possam surgir com vírus emergentes e zoonoses. “A ideia é aproveitar a expertise nacional, contribuindo com os demais países da região. Os pesquisadores já se conhecem e colaboram em pesquisa. Isso facilita muito uma possível cooperação”, afirmou o diretor.
A experiência da Rede Previr - De acordo com a coordenadora da Rede Previr e professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Clarice Weis Arns, em dois anos de trabalho os pesquisadores brasileiros conseguiram coletar cerca de 4 mil amostras em morcegos e outras 4 mil em aves em diferentes regiões do Brasil. “É um volume enorme”, analisa Arns considerando toda a logística necessária para a coleta do material biológico em áreas silvestres de diferentes regiões do Brasil. Depois de coletadas as amostras, os animais capturados são soltos no ambiente.
“O que o Brasil está fazendo na área de vigilância epidemiológica é inédito, nunca houve uma ação dessa natureza com essa magnitude”, explica Arns.
Nesse processo, a Rede Previr precisou criar uma logística específica para levar os materiais de pesquisa até os cientistas e garantir que as amostras de material biológico coletadas chegassem em segurança e com qualidade até o laboratório. Uma parceira com os Correios foi estabelecida para transportar os materiais de apreensão dos animais. Para se ter ideia da complexidade desse processo, as amostras precisam ser mantidas em temperaturas de negativas. Arns conta que foram adquiridos tubos de nitrogênio cujas temperaturas atingem 150 graus negativos para que as amostras se mantenham intactas até chegarem ao laboratório. “O material biológico precisa ser conservado, os vírus são frágeis”, explica ao descrever que algumas áreas de coleta ficam a mais de 400km das capitais.
A partir das amostras coletadas e analisadas, os pesquisadores identificaram mais de 700 vírus. “Esses vírus não são iguais ao Coronavírus [SARS COV 2], que causou a pandemia de Covid-19. São vírus que podem desencadear problemas no futuro”, alerta a cientista.
Além dos mamíferos, o grupo de pesquisadores também monitora aves, por conta do vírus causador da influenza e da gripe aviária. Arns alerta que o compartilhamento regional de informações e a implementação de sistemas de alerta rápido entre os países é um trabalho de prevenção para evitar danos a todo o continente. A gripe aviária, por exemplo, não atinge humanos, mas pode exterminar cerca de 20 mil aves em um único dia. “O Brasil é o segundo exportador de aves do mundo. Pode ser uma catástrofe”, analisa Arns. “Que os colegas da América do Sul se sensibilizem sobre o compartilhamento de informações sobre vigilância epidemiológica”, concluiu.