Notícias
Quarta Comunicação Nacional apresenta impactos da mudança do clima para a segurança energética no Brasil
Aumento da temperatura média global implica redução do potencial de geração hidroelétrica no país
Publicado em
24/11/2021 14h57
Atualizado em
01/11/2022 17h05
Os impactos provocados pela mudança do clima, em especial as implicações sobre as vazões de cursos d’água, apresentam desafios importantes para a segurança energética nacional. As análises encontram-se no capítulo de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação (IVA) à Mudança do Clima da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), documento do governo brasileiro, cuja elaboração é coordenada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
“O sistema energético é predominantemente hidroelétrico e está sujeito aos impactos das mudanças climáticas sobre a hidrologia”, explica André Lucena, professor do Programa de Planejamento Energético da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ), e ponto focal da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede CLIMA) do MCTI para a segurança energética dos estudos de IVA.
Segundo dados de 2019 da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a hidrelétrica é a principal fonte de geração de energia elétrica no Brasil, responsável por 66,6% da oferta total em 2018. Esse número é significativo diante do contexto de agravamento dos riscos de escassez hídrica, por mudanças nos volumes de precipitação e de evapotranspiração esperados em diversas regiões do país, dentre outros fatores condicionantes. Análises do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE/MCTI) demonstram que já houve uma redução de 10% no volume de chuvas na região sudeste nos últimos 40 anos, que concentra cerca de 35% da geração de hidroeletricidade do país, por exemplo.
O estudo avaliou os impactos da mudança do clima na perda de potencial de geração hidrelétrica e suas consequências para a expansão da oferta de energia elétrica, sobretudo em termos de custos e da necessidade de alteração no mix de fontes. Para isso, adotou como base o cenário de Expansão de Referência do Plano Decenal de Expansão de Energia 2026 da EPE, sobre o qual foram aplicadas projeções de clima futuro, com base em modelos climáticos regionalizados (Eta-HadGEM2-ES e Eta-MIROC5), diante de cenários em que a temperatura média global (SWL) aumenta em 2 oC e 4 oC graus. Lucena analisa que a diversificação de fontes é positiva, mas alerta que para evitar impactos significativos é necessário reduzir, em esforço global, as emissões de gases de efeito estufa para evitar mudanças climáticas mais drásticas.
“Nos cenários climáticos futuros, há uma queda na energia natural afluente das usinas, ou seja, há menos água e, portanto, menos energia gerada pelo parque hidrelétrico instalado”, detalha Lucena.
Energia Natural Afluente é a quantidade de água que chega em uma usina para gerar eletricidade. As vazões afluentes foram utilizadas como dado de entrada do Modelo Computacional de Decisão de Investimentos. O modelo que simula o atendimento da demanda de energia para determinado período a um custo mínimo de expansão, considerando restrições técnicas e econômicas, é utilizado para projetar a participação da geração hidrelétrica e as implicações para o mix de fontes no Sistema Interligado Nacional (SIN) em cenários de mudanças climáticas.
As análises indicam uma diminuição da capacidade de geração hidrelétrica para todos os cenários. Pelo modelo Eta-HadGEM2-ES, o impacto é mais significativo, com uma redução que varia entre 27% e 41%, de acordo com a região do país. Já o modelo Eta-MIROC5 apresenta uma redução no potencial de geração hidrelétrica entre 6% e 10%, conforme indica a figura técnica.
O pesquisador esclarece que o exercício de cenário é uma abordagem metodológica que tem a vantagem de facilitar a comunicação dos resultados. Os cenários são construídos para simular o sistema nesses contextos de aquecimento global e reforça a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE), pois o nível de alterações climáticas e quando seriam alcançadas depende da trajetória de emissões.
Além disso, o pesquisador alerta que os modelos matemáticos não consideram o desmatamento, que influencia diretamente a evapotranspiração. No caso da floresta Amazônica, por meio desse fenômeno a vegetação produz vapor responsável pela formação dos rios voadores, que geram os corredores de umidade para o centro-sul do país. “Os impactos podem piorar ainda mais”, analisa Lucena.
A segunda etapa do estudo indica o que o sistema elétrico precisa construir para compensar a perda e atender ao aumento da demanda de energia. O pesquisador explica que o modelo que simula a adaptação é de otimização, ou seja, busca as opções mais baratas para suprir a demanda.
O portfólio de alternativas de energia para aumentar a capacidade de geração inclui gás, biomassa, eólica e solar. O modelo não indica expansão relevante para a fonte hidrelétrica. A seleção das fontes pelo modelo considera despachabilidade, restrições, disponibilidade de recursos, intercâmbio entre os sistemas, entre outros aspectos.
“Construir e adaptar são medidas de longo prazo. Assumimos que, dado o novo clima, haverá tempo de construção para fornecer a eletricidade. Isso é uma forma de adaptação. Mas se isso [alterações climáticas] vier muito rápido e não houver tempo, o risco é de déficit, é de não atender a demanda”, afirma Lucena.
Diante desse contexto de agravamento dos impactos climáticos sobre a oferta de energia elétrica, a Comunicação Nacional traz opções de adaptação na segurança energética que incluem as diferentes etapas da cadeia energética, visando a potencializar a sinergia entre as ações. Além da consideração das informações climáticas no planejamento energético de longo prazo, discute-se a promoção da eficiência energética nos diversos setores usuários, dentre demais opções. Quanto menor a demanda de energia, menor será a pressão sobre o sistema de geração elétrica, e portanto, maior a resiliência do sistema como um todo.
Saiba mais:
Acesse aqui os artigos científicos publicados na revista Sustentabilidade em Debate, editada pela Universidade de Brasília, que embasam as análises de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à mudança do clima da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção do Clima.
Acesse aqui o documento da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção do Clima e conheça em detalhes as análises de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à mudança do clima que envolvem a segurança energética.