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Decisões sobre adaptação adotadas definirão os impactos da mudança do clima no futuro
A reunião técnica promovida pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), nesta sexta-feira (24), com a região Sudeste reuniu representantes de governos estaduais, instituições científicas, da sociedade civil e da inciativa privada. O evento encerrou o ciclo de eventos regionais organizado ao longo do mês de setembro para compartilhar o conhecimento técnico-científico sobre os estudos de impactos, vulnerabilidades e adaptação à mudança do clima da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção do Clima, documento do governo brasileiro cuja elaboração é coordenada pelo MCTI.
A ideia é que os estudos possam subsidiar o planejamento e a integração de políticas públicas, com um melhor entendimento sobre o que é prioritário e o que pode ser feito em relação à adaptação à mudança do clima de cada região.
“Estamos aqui para uma reflexão sobre a responsabilidade do poder público em relação a lidar com esse tipo de tendência [impactos da mudança do clima] e trabalhar de modo organizado para adaptar e para evitar que um contingente maior da população esteja exposta”, explicou o coordenador técnico-científico da Rede de Mudanças Ambientais Globais (Rede CLIMA) para os estudos de IVA da 4CN, Marcel Bursztyn.
Os estudos de IVA foram conduzidos de modo a considerar os recortes de biomas (Caatinga, Cerrado, Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa), as zonas costeiras e as cidades. O trabalho envolveu 118 especialistas de 114 instituições, e contemplou quatro grandes eixos estratégicos: seguranças hídrica, energética, alimentar e socioambiental.
Outro ponto defendido pelo coordenador é de que o investimento em medidas de adaptação à mudança do clima, por mais que demandem empreendimento inicial da esfera pública, é seguramente menor do que o custo de lidar com as consequências de eventos extremos, como os gerados por alagamentos, deslizamentos e secas, por exemplo. Além disso, as medidas evitam que vidas sejam perdidas.
Esse tópico é relevante para a região Sudeste por concentrar a maior densidade populacional do país em áreas urbanas e pelo histórico de eventos extremos observados, que tende a ser agravado pela mudança do clima. De acordo com dados que constam na 4CN, a espacialização de ocorrências de deslizamentos, enxurradas, alagamentos e inundações ocorridos entre 2005 e 2015, coincidem com as áreas de maior vulnerabilidade urbana. Na imagem (acima), os pontos mais escuros indicam a concentração de eventos observados e de maior vulnerabilidade urbana.
De acordo com o pesquisador, as políticas públicas precisam ser ativas de modo a reduzir a exposição ao risco, em especial das populações mais vulneráveis cuja capacidade de reação é mais limitada. “O poder público tem não só a missão, mas a responsabilidade e a obrigação de empreender a iniciativa, ter algum gasto. Seguramente o custo de não fazer é maior do que fazer”, analisa Bursztyn.
Nesse sentido, o supervisor dos estudos de IVA DA 4CN, Diogo Santos, aponta três aspectos que precisam ser considerados para avaliar a agenda de adaptação diante da velocidade da mudança do clima: a realidade atual, as decisões de longo prazo e a desigualdade social.
No curto prazo, por exemplo, as cidades já apresentam um déficit de adaptação relacionado à falta de saneamento, planejamento urbano, entre outros fatores. Isso quer dizer que no nível local já se sabe onde ocorrem os alagamentos, a falta de água, a baixa qualidade da água. Por outro lado, as decisões de longo prazo, em especial as relacionadas à infraestrutura, precisam considerar as projeções de mudança do clima, pois a decisão tomada agora terá impacto nas décadas futuras. O especialista aponta ainda que esse processo precisa atuar sobre a desigualdade social, educação e renda, pois são fatores que condicionam a capacidade de reação da sociedade frente a situações de estresse hídrico, alimentar, energético ou socioambiental. “As informações da Comunicação Nacional podem ser consideradas, mas cada setor, cada cidade precisa responder: qual o meu problema e o quê é prioritário fazer, de modo a direcionar a tomada de decisão”, explicou Santos.
Mudanças do clima observadas e projetadas – O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE/MCTI), Lincoln Alves, apresentou a componente de mudança do clima, enfatizando os dados observados entre 1980 e 2018 e os cenários futuros, baseados em níveis de aquecimento médio global (1,5 oC, 2 oC e 4 oC, comparado aos níveis pré-industriais), para a região Sudeste.
A temperatura média no Brasil já registrou aumento cerca de 0,5oC, por década, nos últimos 40 anos. Associado a isso, observa-se um incremento de 30% no número de dias com temperaturas extremas e mudança nos padrões de precipitação anual, com redução das chuvas em torno de 20mm a 30mm por década no centro-sul do país. No caso da região Sudeste, levantamento apontou que houve redução de 10% na precipitação. O aumento e a intensidade na frequência de eventos extremos, como a ocorrência de secas é outra tendência apontada. Quanto à elevação do nível médio do mar, observa-se aumento de 3,4 mm por ano nas últimas décadas na costa brasileira.
“A mudança do clima já está mostrando sinais em várias regiões do país, incluindo o Sudeste. E as projeções indicam que as mudanças que já afetam todas as regiões do planeta podem ser exacerbadas significativamente”, explicou Alves.
Saiba mais: As reuniões técnicas regionais são promovidas pelo MCTI, que coordena a elaboração das Comunicações Nacionais do Brasil à UNFCCC. A elaboração e submissão desse documento é um compromisso assumido pelo governo brasileiro em 1994, ao ratificar a adesão do país à Convenção do Clima. O envio dos dados atualizados deve ocorrer a cada quatro anos, conforme determina as regras do acordo internacional para países em desenvolvimento. O projeto executado pelo MCTI, por meio da Coordenação-Geral de Ciência do Clima e Sustentabilidade (CGCL), conta com financiamento do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês), e tem o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) como agência implementadora.
Acesse aqui o documento da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à UNFCCC.
Acesse aqui a Revista Sustentabilidade em Debate publicada pela Universidade de Brasília (UnB) e leia os artigos científicos que embasaram os estudos de IVA da Quarta Comunicação Nacional.
Acesse aqui todo o conteúdo da componente mudança do clima na plataforma Projeções Climáticas no Brasil.