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Mecanização na colheita da cana-de-açúcar é a principal responsável pela queda nas emissões de GEE por queima de resíduos agrícolas
A mudança no processo de colheita da cana-de-açúcar ocorrida no Brasil nas últimas três décadas foi a principal responsável pela redução de 72,8% nas emissões de gases de efeito estufa (GEE) de 2016, em relação à 2010, contabilizados no subsetor ‘Queima de Resíduos Agrícolas’ do setor Agropecuária. Os dados constam do Inventário Nacional de Emissões e Remoções de GEE, um dos componentes da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC). O documento, cuja elaboração é coordenada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), foi submetido à UNFCCC em 31 de dezembro de 2020.
Segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) de 2019, o Brasil é o maior produtor global de cana-de-açúcar, representando cerca de 40% do volume mundial de colmos (tipo de caule) colhidos em 2018. A maior região produtora é o Sudeste, majoritariamente o estado de São Paulo, na qual está aproximadamente 68% de toda a área canavieira nacional, de acordo com dados do IBGE de 2019. Na região também estão localizadas 198 das 361 unidades agroindustriais que processam a cultura.
Anteriormente, as áreas de cultivo eram queimadas antes da colheita manual da cana-de-açúcar. Esse processo mudou com a adoção da mecanização que também permitiu aproveitar o palhiço, que são palhas, folhas verdes, etc., como proteção natural do solo e adubo, indicando uma modificação no manejo da cultura e adoção de práticas mais conservacionistas.
A cana-de-açúcar e o algodão são as duas culturas avaliadas no subsetor Queima de Resíduos Agrícolas. O processo de pós-colheita do algodão no Brasil parou de utilizar a queima em 1994. Dessa forma, as emissões atuais são apenas provenientes da cana-de-açúcar, que contribuem com um percentual de 0,1% do total de emissões de CO2 equivalente do setor Agropecuária. Ainda assim, a redução nas emissões provenientes de queima de resíduos agrícolas é importante para o segmento sucroenergético, e indica avanços do setor.
“A redução da queima é um ponto estratégico [para a mitigação das] mudanças climáticas. E, em termos de políticas de commodities, como açúcar e álcool, a certificação é fundamental”, explica a pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente, Ana Paula Packer, que coordenou tecnicamente o subsetor Queima de Resíduos Agrícolas para o IV Inventário Nacional, sobre a importância da rastreabilidade e certificação da produção, em especial para exportação.
Segundo Packer, a problemática da queima da cana-de-açúcar surgiu no estado de São Paulo como uma questão ambiental. Mas passou a ser observada como uma estratégia para a descarbonização do setor, e oportunidade de se obter créditos de carbono. Nesse processo, a pesquisadora aponta a implementação de um conjunto de políticas públicas em que se destacam duas ações: o Protocolo Agroambiental do Setor Sucroenergético do Estado de São Paulo, em 2007, e que se estendeu posteriormente para outras unidades da federação, e a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), de 2018.
“Dentro do contexto geral, a inserção de práticas de manejo sustentáveis tem um papel importante em todos os setores. Por trás de tudo isso há uma ciência de descarbonização. Há uma equipe de especialistas trabalhando. É um esforço coletivo”, avalia a pesquisadora.
Os detalhes estão descritos no estudo técnico referente ao histórico e à dinâmica de produção da cana-de-açúcar brasileira entre 1990 e 2018, elaborado e publicado pela Embrapa Meio Ambiente. Com base nos procedimentos metodológicos e nos resultados obtidos pela equipe brasileira na contabilização das estimativas das emissões oriundas da queima dos resíduos da cana-de-açúcar no Brasil, outros dois temas relacionados à Queima de Resíduos Agrícolas também deverão ser publicados em periódicos científicos. A metodologia que aborda o refinamento realizado para estimar com maior acurácia as emissões de GEE oriundas da queima da palha de cana-de-açúcar no Brasil, com adoção de dados de biomassa disponível para combustão em nível municipal e fatores de emissão para o contexto brasileiro. O outro artigo deve apresentar um protocolo para avaliação da frequência e distribuição espaço temporal de áreas queimadas em cultivos de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo.
Fatores de emissão - Além da mudança no manejo, a engenheira agrônoma e pesquisadora da área de mudança do clima afirma ainda que a utilização de dados georreferenciados (imagens por satélite) e a adoção de fatores específicos para as emissões dos gases CO2, CH4, CO e NOX da cana-de-açúcar permitiram estimar valores mais realistas para as emissões nacionais. Esses fatores são utilizados para a elaboração dos cálculos. Contribuíram para essa redução a adoção de fatores de emissão nacionais, como por exemplo para a relação palhiço/colmo, com a utilização de valores regionalizados por Unidade Federativa e para o fator de combustão, com a adoção de valores específicos para a cana-de-açúcar nacional, em contraponto ao uso de fatores default (padrão) disponibilizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC). Até o Terceiro Inventário Nacional, fatores default eram utilizados, superestimando as emissões nacionais. Em adição, a quantidade de biomassa disponível para combustão e o percentual da produção submetido à queima (quando não utilizada a colheita mecanizada) foram específicos para cada Unidade Federativa e ano, permitindo uma acurácia maior na estimativa das emissões do subsetor.
Acesse aqui a publicação: Dinâmica do cultivo de cana-de-açúcar no Brasil – 1990 a 2018
Acesse aqui a Quarta Comunicação Nacional do Brasil à UNFCCC:
https://issuu.com/mctic/docs/quarta_comunicacao_nacional_brasil_unfccc
Acesse aqui as edições anteriores da Comunicação Nacional do Brasil à UNFCCC:
http://antigo.mctic.gov.br/mctic/opencms/ciencia/SEPED/clima/Comunicacao_Nacional/Comunicacao_Nacional.html