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A Independência - substantivo feminino!
Uma das mais importantes pinturas sobre a independência política do Brasil foi feita por uma mulher: Georgina de Albuquerque (1885-1962), a primeira diretora da Escola Nacional de Belas Artes, precursora da pintura impressionista no Brasil. Num terreno dominado por homens, Georgina aventurou-se na pintura histórica em 1922, com a obra “Sessão do Conselho de Estado”, que lhe rendeu o prêmio da Exposição de Arte Contemporânea e Arte Retrospectiva do Centenário da Independência, um concurso cujo objetivo era selecionar as pinturas que melhor representassem acontecimentos históricos ligados ao processo emancipatório.
A vanguarda da pintura não se limita, porém, à sua história ou à de sua autora, mas, sobretudo, ao seu conteúdo. Nela, D. Leopoldina aparece presidindo a Sessão do Conselho de Estado, sentada na extremidade esquerda da mesa, em posição de escuta atenta a José Bonifácio, que parecia expor as razões para que a decisão política de emancipação fosse defendida pela imperatriz em correspondência a D. Pedro I, que a essa altura estava em São Paulo.
A imagem traz o papel de centralidade da “princesa esclarecida de Viena”, nas discussões sobre a Independência. A obra de Georgina nos permite a identificação de uma personagem negligenciada até então. Assim como tantas outras, que foram excluídas ou apareciam apenas como coadjuvantes, o protagonismo da arquiduquesa da Áustria no processo de emancipação ficou eternizado na pintura que retrata o momento em que ela se tornou a primeira mulher a governar o Brasil. Em razão da ausência do príncipe, caber-lhe-ia a regência, assim como o envio de papéis vindos da metrópole, além das famosas cartas de José Bonifácio e outra de sua própria autoria, ambas exigindo uma atitude imediata do príncipe herdeiro.
Leopoldina foi educada na Áustria, para servir aos interesses públicos de sua dinastia - os Habsburgo - e de seu Estado. Falava 11 idiomas, dominava ciências da natureza. Seus estudos, retratos e coletas, feitos pela Missão Científica Austríaca que trouxe consigo em 1817, fundou no seu país de origem o Museu Brasileiro, despertando interesse dos europeus em conhecer as belezas naturais do "Novo Mundo”. A imperatriz também caçava pequenos mamíferos e coletava minerais, ajudando e incentivando estudos sobre a História Natural do Brasil.
Longe da figura da mulher melancólica, Georgina de Albuquerque retratou uma mulher forte, decidida a contribuir para formação de um país emancipado. Talvez, por essa razão, pela importância de sua atuação política e científica é que esteja estampado em nossa bandeira o amarelo e o verde, as cores que representam as duas Casas que deram origem ao Brasil independente: o verde da Casa de Bragança, de D. Pedro I, e o amarelo da Casa de Habsburgo, de Leopoldina.
* A convite do MAST, a historiadora do Museu Histórico Nacional Patrícia Wanzeller produziu esse artigo para o projeto 200 Anos de Ciência e Nação.