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No Dia Mundial da Língua Portuguesa - 5 de maio, conheça a Camoensia scandens
Desde 2009, o 5 de Maio foi instituído como Dia Internacional da Língua Portuguesa pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), formada por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. A data foi declarada também como Dia Mundial da Língua Portuguesa pela Unesco, em 2019. Para celebrar esse dia, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro destaca hoje, em sua coleção, a Camoensia scandens, uma espécie africana com flores que chamam atenção por sua beleza e delicadeza. O gênero Camoensia foi assim nomeado em homenagem ao poeta português Luís Vaz de Camões (c. 1524 – 1579 ou 1580), autor, entre outras obras, de Os Lusíadas, primeiro poema no idioma a receber reconhecimento como uma obra prima da literatura mundial.
Segundo o curador da Coleção Viva do JBRJ, pesquisador Marcus Nadruz, o gênero Camoensia, pertencente à família Leguminosae, é encontrado na África Central (Angola, Cabinda, Camarões, Congo, Guiné Equatorial, Nigéria e Zaire) e possui somente duas espécies, sendo a C. scandens cultivada no Arboreto do JBRJ. O tecnologista Marcos Gonzalez, também da equipe de Coleção Viva do JBRJ, pesquisou a história da planta, que você pode conferir no texto abaixo:
Camoensia Welw. ex Benth. & Hook.f no JBRJ
Por Marcos Gonzalez (JBRJ)
O gênero botânico Camoensia foi descrito pelo médico e naturalista austríaco Friedrich Welwitsch (1806-1872), a partir de material colhido por ele em Golungo Alto, Angola, durante a longa expedição (sete anos) que ele coordenou, como naturalista contratado, ao território africano recém-ocupado por Portugal (1855).
Esse período da história portuguesa, marcado pela transição de uma monarquia absolutista para uma monarquia constitucional, é conhecido como Regeneração (1851-1875), pois a intelectualidade nacional estava empenhada em uma ‘regeneração’ social a partir de reformas capazes de estimular o desenvolvimento cultural, moral, político, econômico e tecnológico da nação (Albuquerque et al., 2020). Com aquele epíteto, Camoensia, o naturalista austríaco parece brindar o espírito ufanista que tal empreitada inspirava, homenageando o icônico escritor Luís de Camões (Quattrocchi, 1999, p.418), autor do poema épico Os Lusíadas, em que se narram as heroicas conquistas portuguesas no Oriente. Henry Hamilton Johnston (1883, p.228), botânico inglês que também observou a planta em seu ambiente natural, elogiou o associação: ‘bela e poética’, a Camoensia estava apropriadamente nomeada.
Embora seja mais conhecido por seu trabalho derivado da expedição em Angola, Welwitsch também contribuiu significativamente para o aprimoramento da horticultura em Portugal. O naturalista foi superintendente dos vários jardins do Duque de Palmela e esteve, em diferentes momentos até 1853, à frente dos Jardins Botânicos da Ajuda, em Lisboa, e o de Coimbra (Hiern, 1896). Parte do material que coletou em Angola, por exemplo, foi enviado para este último, incluindo propágulos vivos de Camoensia, conforme ele mesmo nos conta (Welwitsch, 1859). Incomodava-o o fato de que “a maior parte ou quase todos os vegetais que hoje estão ornando os jardins portugueses” eram comprados em países estrangeiros (Welwitsch, 1855), donde seus esforços para introduzir no cultivo do país uma variedade de plantas oriundas das possessões ultramarinas, várias das quais suculentas (Figueiredo et al., 2018).
Não sabemos (ainda) quando, por que ou por quem a Camoensia foi introduzida no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Certamente já fazia parte da coleção viva em 1926, pois há no herbário da instituição o registro de uma coleta da espécie no arboreto realizado neste ano (RB 20416). O fato é que suas flores, saudáveis e acessíveis, continuam amparando investigações contemporâneas sobre, por exemplo, filogenia (Cardoso et al., 2012; Lee et al., 2021) ou polinização (Leite et al., 2021) no grupo das Fabáceas.
Bibliografia
ALBUQUERQUE, Sara; FIGUEIRÔA, Sílvia; FELISMINO, David. The Forgotten Library of the Botanist Friedrich Welwitsch (1806-1872). E-journal of Portuguese History, v.18, n.2, p.83-112, 2020.
CARDOSO, Domingos; QUEIROZ, Luciano P. de; PENNINGTON, R. Toby, et al. Revisiting the phylogeny of papilionoid legumes: New insights from comprehensively sampled early-branching lineages. American Journal of Botany, v.99, p.1991-2013, 2012.
FIGUEIREDO, Estrela; SILVA, Vasco; SMITH, Gideon F. Friedrich Welwitsch and the horticulture of succulents in Portugal in the 19th century. Bradleya, v.36, p.200-211, 2018.
HIERN, William Philip. Introduction. In: WELWITSCH, F. e HIERN, W. P. (Ed.) Catalogue of the African plants collected by Dr. Friedrich Welwitsch in 1853-61. London: Hazell, Watson & Viney, 1896. v.1 [Dicotyledons], p.v-xvii.
JOHNSTON, Henry Hamilton. The River Congo, from Its Mouth to Bólóbó; With Notes on the Physical Geography, Natural History, Resources, and Political Aspect of the Congo Basin. Proceedings of the Royal Geographical Society and Monthly Record of Geography, v.5, n.12, p.692-711, 1883.
LEE, Chaehee; CHOI, In-Su; CARDOSO, Domingos, et al. The chicken or the egg? Plastome evolution and an independent loss of the inverted repeat in papilionoid legumes. The Plant Journal, v.107, n.3, p.861-875, 2021.
LEITE, Viviane Gonçalves; TEIXEIRA, Simone Pádua; GODOY, Fernanda, et al. Resolving the non‐papilionaceous flower of Camoensia scandens, a papilionoid legume of the core genistoid clade: development, glands and insights into the pollination and systematics of the group. Journal of Plant Research, v.134, p.823–839, 2021.
QUATTROCCHI, Umberto. CRC world dictionary of plant names: common names, scientific names, eponyms, synonyms, and etymology. Boca Raton/London/New York/Washington: CRC Press, v.1 [A-C], 1999.
WELWITSCH, Friedrich. Jardins d’acclimatação na Madeira e Angola na Africa austro-occidental. Jornal Scientifico e Litterario, v.3, p.126-127; 144-145, 1855.
______. Carta do dr . Welwischtz ao sr. Bento Antonio Alves [acompanhado de catalogo das sementes a que se refere a carta] Annaes do Conselho Ultramarino (Portugal), v.Parte Não Official, serie 1 (Fevereiro de 1854 a dezembro de 1859), n.1, p.581-592, 1859.