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Ilhas florestais formadas por barragem na Amazônia perdem biodiversidade
A construção da usina hidrelétrica de Balbina, entre 1985 e 1989, inundou uma área de 2360 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica. Como consequência, apenas os pontos mais altos do relevo local se mantiveram acima do nível da água, formando mais de três mil ilhas florestais. Nas últimas décadas, os cientistas têm buscado compreender o impacto dessa fragmentação do habitat nas espécies de animais e plantas nativas. Agora, em um artigo publicado na revista Science Advances em 26 de agosto de 2022, os pesquisadores usaram Teoria de Redes para comprovar a extinção local de espécies e o empobrecimento da biodiversidade em ilhas formadas pela intervenção humana no ambiente natural.
A grande maioria (95%) dessas ilhas florestais são pequenas, com pouco menos de um quilômetro quadrado. Para os pesquisadores Ana Filipa Palmeirim, da Universidade do Porto - Portugal , Carine Emer, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Carlos Peres, da Universidade de East Anglia – Inglaterra e demais coautores do estudo, as ilhas do lago de Balbina constituíram um laboratório vivo sobre o que acontece com as espécies quando a paisagem é fragmentada, restringindo a floresta e sua fauna a manchas cada vez menores.
Eles estudaram 22 dessas ilhas e três áreas próximas de floresta intacta que não foram inundadas, onde registraram 608 espécies de oito grupos biológicos: médios e grandes mamíferos, pequenos mamíferos (exceto morcegos), lagartos com hábitos diurnos, pássaros de sub-bosque, sapos, besouros, abelhas polinizadoras de orquídeas e árvores. Esses remanescentes florestais e as espécies que neles ocorrem foram analisados como unidades conectadas em uma escala de paisagem, formando uma rede chamada ‘espécie-habitat’, o que se mostrou uma abordagem eficaz para a compreensão de paisagens complexas perturbadas pela ação humana.
Uma das conclusões é de que, após pouco mais de três décadas, apenas espécies mais adaptáveis, de pequeno e médio porte, como tatus e cutias, conseguiram sobreviver nesse ambiente fragmentado. Mamíferos maiores, como onças e antas, desapareceram. Além disso, as espécies especialistas dependentes das florestas praticamente não são mais encontradas nas ilhas. Somente as poucas ilhas maiores foram capazes de manter toda ou a maior parte da sua biodiversidade.
Com base nas conclusões da pesquisa, os autores recomendam que projetos futuros de hidrelétricas evitem a inundação de grandes extensões de florestas com a consequente criação de muitas ilhas pequenas, de forma a reduzir a perda de biodiversidade e permitir a continuidade dos ecossistemas. Eles também questionam se, frente a essas perdas e outros custos ambientais, a construção de barragens nos rios tropicais megadiversos ainda é uma opção viável.
O estudo resultou de uma colaboração internacional de diferentes instituições: a Universidade de East Anglia, no Reino Unido, o Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO) da Universidade do Porto, em Portugal, o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, a Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), a Universidade Estadual de Mato Grosso (UNEMAT) e o Instituto Federal Farroupilha de Educação, Ciência e Tecnologia, no Brasil. Além disso, esse estudo só foi possível graças ao apoio logístico fornecido pela Reserva Biológica do Uatumã (Rebio Uatumã).
Acesse a íntegra do artigo original Emergent properties of species-habitat networks in an insular forest landscape.
Veja também texto de divulgação publicado em The Conversation.