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Expedição científica ao extremo sul da Bahia gera conhecimento para a conservação da biodiversidade brasileira
Por Gláucia Crispim Ferreira, Carlos Ferreira & Eduardo Fernandez
O Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora), do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ), realizou, de 16 a 30 de agosto último, uma expedição científica na região do extremo sul da Bahia. Esta iniciativa faz parte da implementação do recém-lançado Plano de Ação Nacional para a Conservação de Árvores Ameaçadas de Extinção do Sul da Bahia (PAN Hileia Baiana), no âmbito do Projeto GEF Pró-Espécies: todos contra a extinção.
A expedição abrangeu quatro municípios baianos - Prado, Porto Seguro, Itamaraju e Guaratinga -, e incluiu visitas a áreas críticas para a conservação regional, como o Parque Nacional do Descobrimento, o Parque Nacional e Histórico do Monte Pascoal, o Parque Nacional do Alto Cariri, Assentamento Pedra Bonita, Assentamento Pau Brasil e os Inselbergs (Afloramentos Rochosos) de Guaratinga.
A região do extremo sul da Bahia enfrenta uma série de ameaças complexas e interconectadas, incluindo o desmatamento histórico e atual, decorrente da expansão agropecuária, a exploração madeireira, o corte seletivo de espécies madeireiras de alto valor comercial, e os conflitos territoriais. Outros desafios incluem a expansão da pecuária, da silvicultura de eucalipto, o crescimento urbano desordenado e o turismo não regulamentado, especialmente nos municípios costeiros, todos exacerbando a pressão sobre os recursos naturais da região.
A expedição documentou a pressão severa exercida pelas monoculturas e pastagens sobre as formações naturais, representando uma ameaça significativa às espécies nativas e ameaçadas, inclusive em áreas próximas às Unidades de Conservação. Nesse contexto, as Unidades de Conservação da região constituem refúgios críticos para a conservação da biodiversidade, preservando verdadeiras ilhas de vegetação natural em meio à crescente degradação das áreas circundantes.
Apesar da existência do Plano de Ação Nacional (PAN) para a conservação de espécies ameaçadas na região, os pesquisadores entendem que é imperativo fortalecer medidas de proteção, como a expansão de projetos de restauração, adoção de práticas agrícolas sustentáveis, criação de corredores ecológicos para conectar Unidades de Conservação e aprimoramento da fiscalização contra atividades ilegais.
Ao término da expedição, foram coletadas aproximadamente 650 amostras vegetais, que serão incorporadas ao herbário RB e duplicatas compartilhadas com outros herbários. Adicionalmente, amostras de tecido foram coletadas para estudos de biologia molecular e espécimes para cultivo (em consonância com as ações previstas no PAN), representando uma rica diversidade de 75 famílias botânicas. Algumas amostras ainda não identificadas podem até mesmo revelar novas espécies para a ciência ou novas ocorrências em relação a espécies previamente desconhecidas para a região. Os dados coletados na expedição contribuem, assim, para o conhecimento da flora nacional e para as estratégias de conservação no contexto do PAN Hileia Baiana.
Liderada por Eduardo Fernandez, coordenador de projetos do Núcleo Avaliação do Estado de Conservação (NuAC) do CNCFlora/JBRJ, a equipe contou com a colaboração da analista de dados espaciais para conservação Gláucia Crispim e o professor e pesquisador da Universidade Estadual de Santa Cruz André Amorim, articulador de diversas ações previstas no PAN Hileia Baiana, incluindo aquelas relacionadas a atividades de campo e busca ativa pelas espécies-alvo contempladas pela estratégia.
Além disso, a equipe contou com a colaboração de diversos atores locais, entre eles José Lima da Paixão e Lucas Barbosa, do Programa Arboretum de Conservação e Restauração da Diversidade Florestal, a pesquisadora Rafaela Forzza e a chefe do PARNA do Descobrimento, Juliana Fukuda, ambas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e com atuação de destaque para o sucesso da expedição na região de Prado e de Porto Seguro.
Também participaram os analistas Marcio Amparo, Eronaldo, Alino, Lorran e Eides, lotados no PARNA Descobrimento, e a pesquisadora Laryssa Negri, do Projeto GEF Pró-Espécies e à frente das ações de erradicação de espécies exóticas invasoras no PARNA Monte Pascoal. Colaboraram ainda com as atividades os auxiliares de campo Antônio, Roberta, Vanda, Valdeci e Claudia, dos Assentamos Pedra Bonita e Pau-Brasil, e Adriana Prestes e Diego Fernando, do PARNA Alto Cariri/ ICMBio, todos desempenhando papéis de destaque na pesquisa e na implementação das ações de conservação do PAN Hileia Baiana.
Sobre o CNCFlora/JBRJ
O Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora), do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ), é referência nacional na geração, coordenação e disseminação de informações relacionadas à biodiversidade e à conservação da flora brasileira ameaçada de extinção.
O CNCFlora é encarregado da elaboração da lista das espécies ameaçadas de extinção da flora brasileira em colaboração com o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Além disso, está sob sua responsabilidade a formulação e implementação de ações direcionadas à conservação em áreas especificamente designadas.
Entre as principais missões do CNCFlora estão a coordenação, promoção e contribuição para todas as condições necessárias destinadas a evitar a extinção de espécies da flora brasileira. Isso é feito em consonância com as metas estabelecidas pela Estratégia Global para a Conservação de Plantas (GSPC) e o mandato nacional de avaliar o risco de extinção das espécies da flora brasileira, visando à construção da Lista Vermelha Nacional.
Além disso, o CNCFlora coordena a elaboração de planos de ação e a identificação de áreas prioritárias para a conservação de espécies ameaçadas de extinção. Também realiza expedições científicas para coletar dados primários em regiões consideradas prioritárias para a conservação da flora brasileira.
Sobre o PAN Hileia Baiana
Em um importante marco para a conservação da biodiversidade, o Plano de Ação Nacional para a Conservação de Árvores Ameaçadas de Extinção do Sul da Bahia (PAN Hileia Baiana) foi oficialmente publicado. Este plano, de vigência até 2028, é uma iniciativa coordenada pelo Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) e visa ao aumento da conservação e do conhecimento das espécies-alvo e de seus ambientes na região da Hileia Baiana.
Para alcançar esse objetivo ambicioso, o PAN estabelece 31 ações de conservação divididas em quatro objetivos específicos que abrangem temas como: pesquisa e monitoramento, capacitação e comunicação, manejo e conservação e políticas públicas. Essas ações serão conduzidas por 19 articuladores e contarão com o apoio de 118 colaboradores.
A região da Hileia Baiana, conhecida por sua riqueza biológica e elevada diversidade de espécies, abriga inúmeras árvores ameaçadas de extinção, sendo lar de 21 espécies classificadas como Criticamente em Perigo. O PAN Hileia Baiana representa um esforço conjunto de diversas instituições, incluindo empresas, organizações de pesquisa, órgãos governamentais e a sociedade civil, para garantir a sobrevivência dessas preciosas espécies e preservar o patrimônio natural da Mata Atlântica na região sul da Bahia.
Planos de Ação Nacionais
Cada Plano de Ação Nacional para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção (PAN) é um instrumento de gestão e política pública, construído de forma participativa, para o ordenamento e a priorização de ações para a conservação da biodiversidade e seus ambientes naturais, com um objetivo estabelecido em um horizonte temporal definido.
As estratégias são definidas a partir da análise das principais ameaças que contribuem para a diminuição das populações de espécies classificadas como ameaçadas de extinção. Dessa forma, os PANs têm o potencial de promover o desenvolvimento sustentável, a pesquisa, a educação ambiental, a conservação dos ecossistemas, a recuperação populacional e, consequentemente, a diminuição do risco de extinção.
Iniciativas como o Pró-Espécies auxiliam na conservação da biodiversidade brasileira. O projeto é coordenado pelo MMA, financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, da sigla em inglês para Global Environment Facility Trust Fund), implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e tem o WWF-Brasil como agência executora. A proposta é implementar políticas públicas voltadas à conservação de pelo menos 290 espécies brasileiras categorizadas como ameaçadas de extinção e alavancar iniciativas que reduzam as ameaças à fauna e à flora do país.