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Estudo revela que extinção de grandes mamíferos altera os danos foliares causados por patógenos
Um artigo científico inovador foi publicado na revista científica Journal of Ecology - uma das mais importantes em Ecologia no mundo, investigando sobre as complexas relações entre mamíferos herbívoros de grande porte, diversidade filogenética e inimigos naturais das plantas e o subsequente impacto nos ecossistemas de florestas tropicais.
A pesquisa, conduzida por cientistas brasileiros e espanhóis em florestas tropicais do Brasil, explorou o papel crucial dos inimigos naturais nos danos foliares das plantas. Esses inimigos naturais variam desde ungulados mamíferos de grande porte até patógenos microscópicos. O estudo testou as consequências amplamente inexploradas das extinções locais de mamíferos herbívoros de grande porte nas interações entre plantas e seus inimigos naturais, especialmente em relação aos insetos herbívoros e aos patógenos que atacam as folhas do sub-bosque das florestas.
A base foi um experimento de defaunação de longo prazo conduzido em quatro áreas protegidas da Mata Atlântica. Nestas áreas, foram instaladas parcelas permanentes de exclusão de mamíferos herbívoros de grande porte, como queixadas, antas, cutias, pacas e veados-catingueiros, onde a dinâmica da vegetação vem sendo acompanhada desde 2015 pelo grupo de pesquisa do Prof. Mauro Galetti, da UNESP de Rio Claro, principalmente pelos pesquisadsores Sergio Nazareth e Valesca Ziparro, co-autores do estudo.
Ao investigar como a perda dos animais de grande porte afetam os danos foliares causados por insetos herbívoros e patógenos, os pesquisadores encontraram uma redução significativa (9%) nos danos foliares de 10.050 folhas de 3.350 plantas do sub-bosque. Esta diminuição deve-se principalmente a uma redução notável (até 29%) nos danos causados por patógenos foliares - e não por herbivoria de insetos, nas parcelas fechadas - onde animais de grande porte foram excluídos. Os autores também encontraram uma correlação positiva entre danos foliares, defaunação e a distinção evolutiva das plantas, revelando um efeito cascata até então desconhecido da extinção de grandes herbívoros em ecossistemas florestais.
O estudo conclui que a extinção de mamíferos herbívoros de grande porte tem um efeito indireto nos danos foliares causados por patógenos. Estes efeitos indiretos podem diminuir o potencial das plantas de diluir os danos causados por patógenos através da diminuição da riqueza de espécies de plantas, reforçando seu papel de reguladores top-down nas dinâmicas florestais. Essas descobertas têm implicações significativas para a aptidão das plantas e, em última análise, para a manutenção e geração de biodiversidade em alguns dos ecossistemas mais diversos do planeta.
A pesquisadora Carine Emer, do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, primeira autora do artigo, relata que eles não esperavam estes resultados: "Inicialmente, pensávamos que a ausência de grandes mamíferos resultaria em um efeito cascata na herbivoria por insetos, mas apenas os patógenos foram afetados pela defaunação e isso está correlacionado com as características evolutivas das comunidades de plantas. Esses resultados inesperados mostram que sabemos muito pouco sobre a dinâmica das interações multitróficas em florestas tropicais e ressaltam a importância de observar os inimigos 'invisíveis', que são fundamentais para manter o equilíbrio da natureza e a regulação dos serviços ecossistêmicos que ela fornece."
Em entrevista à revista Pesquisa Fapesp, Emer explica por que a redução dos danos causados por patógenos pode afetar o equilíbrio ecológico, a biodiversidade e a evolução das plantas nessas áreas: "As plantas interagem com seus inimigos naturais há milhares de anos, em uma corrida armamentista de defesa e ataque. Para isso, desenvolvem defesas, tanto físicas quanto químicas. Por sua vez, os inimigos naturais, como os patógenos, criam novas formas de ataque, no que as plantas criam novas defesas. Esse é um fator importante para a manutenção e geração de biodiversidade, uma vez que nesse processo podem surgir espécies novas tanto de plantas como de organismos que interagem com elas”, explica Emer,
Outro membro da equipe, o pesquisador Nacho Villar, atualmente no Instituto de Ecologia dos Países Baixos, destaca a robustez dos resultados: "Apesar do experimento ter sido realizado em quatro florestas diferentes, com diferentes composições e densidades de plantas e mamíferos grande porte, encontramos efeitos cascata de mamíferos de grande porte nos danos foliares patogênicos em todas elas. Mesmo na floresta onde os maiores mamíferos, como antas e queixadas, estão ausentes, a extinção de mamíferos de médio porte, como veados-catingueiros, pacas e cutias, tem efeitos cascata comparáveis. Isso é notável e sugere claramente que esses efeitos cascata podem estar presentes em outras florestas com diferentes composições de espécies de mamíferos de grande porte, quase certamente em outras florestas tropicais úmidas. Obviamente, nosso estudo é um primeiro passo, então a generalidade de nossas descobertas precisa ser confirmada com
experimentos adequados em outros tipos de florestas".
Essa pesquisa inovadora abre novos caminhos para entender as redes complexas das interações entre diferentes inimigos naturais de plantas e suas consequências para a saúde e diversidade geral dos ecossistemas florestais.
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