Notícias
Estudo mapeia espécies de animais em risco de extinção por desastres naturais
Papagaio-de-são-vicente | Foto: Faraaz Abdool, Michael Edgecombe/Birding the Islands
Cerca de 10% das espécies de vertebrados terrestres correm risco de extinção nos próximos anos devido a fenômenos naturais como terremotos, furacões, vulcões e tsunamis. São quase 4 mil espécies potencialmente ameaçadas e expostas a esses eventos, com uma prevalência significativamente maior em ilhas e regiões tropicais. As conclusões estão em artigo publicado em 17 de junho na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), assinado por pesquisadores de 20 instituições estrangeiras e brasileiras, incluindo o Centro para Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças no Clima (CBioClima) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus Rio Claro, o Instituto Tecnológico Vale (ITV), a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Os cientistas mapearam como a ocorrência e magnitude desses fenômenos naturais se sobrepõe às áreas de distribuição de anfíbios, aves, mamíferos e répteis. Para formular a lista de animais que estão ameaçados por novas ocorrências desses fenômenos, os autores selecionaram as espécies que têm menos de mil indivíduos na natureza ou espécies que vivem uma área consideravelmente pequena, menos de 2500 quilômetros quadrados – ou seja, espécies que terão dificuldades em se reproduzir e, consequentemente, recuperar a viabilidade da população diante de eventos naturais críticos.
A região neotropical, que se estende do sul do México até o norte da Argentina, engloba quase 40% das espécies ameaçadas, segundo o estudo. A maioria das espécies são suscetíveis a furacões, no Mar do Caribe e no Golfo do México, e a vulcões, terremotos e tsunamis nas regiões do Anel de Fogo do Pacífico. Os resultados indicam que 70% das espécies mais susceptíveis são restritas a ilhas. É o caso do papagaio-de-são-vicente (Amazona guildingii), nativo das montanhas densamente florestadas da ilha caribenha de São Vicente, nas Pequenas Antilhas. A espécie está classificada como em alto risco devido à atividade vulcânica e em risco devido a furacões. O trabalho também destaca que cerca de 30% das espécies vivem completamente fora de áreas protegidas, o que pode aumentar ainda mais o risco de extinção devido ao grande impacto humano em áreas não protegidas.
O pesquisador Fernando Gonçalves exemplifica que espécies como o urso panda, originário da China, e o beija-flor-de-barriga-safira, presente na Colômbia correm risco de serem extintos por esses fenômenos naturais. Segundo sua avaliação, no Brasil, apenas duas espécies correm risco, já que esses eventos não são frequentes no território brasileiro: o lagarto da areia (Liolaemus lutzae), que vive na costa fluminense, e o sapo-de-barriga-vermelha (Melanophryniscus cambaraensis), que vive entre os estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. A análise levou em conta o tsunami de baixa magnitude que atingiu a costa do Rio de Janeiro em 2004 e o furacão de baixa magnitude que atingiu a região sul no mesmo ano.
Gonçalves aponta que, quando acontecem no território brasileiro, terremotos, furacões e tsunamis são geralmente de baixa magnitude. “Apesar de não estar localizado próximo às bordas das placas tectônicas, onde a maioria dos terremotos ocorre, o Brasil ainda possui falhas geológicas que podem gerar atividade sísmica”, explica Gonçalves. “Quanto aos tsunamis, quando ocorrem, geralmente estão associados a eventos localizados, como deslizamentos submarinos e/ou terremotos distantes”.
As conclusões do estudo evidenciam a necessidade de ações intensivas e urgentes de conservação dessas espécies e de seu ambiente. “Além dos impactos humanos, a frequência e a magnitude dos fenômenos naturais impulsionados pelo clima, como por exemplo furacões, devem aumentar nos próximos anos, lembra Gonçalves. O pesquisador frisa que os impactos desses eventos na biodiversidade, apesar de ainda pouco estudados, podem ser significativos.
“É um estudo inédito ao trazer o risco de extinção por fenômenos naturais para espécies que se encontram ameaçadas por outras formas de ação humana, como desmatamento e perda de habitat. A boa notícia é que podemos mitigar estes riscos com ações concretas de conservação” – aponta a pesquisadora Carine Emer, pesquisadora associada ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Ela acrescenta que o método é válido para outros grupos, inclusive plantas, no entanto, a limitação para aplicação desse método são os dados. "Trabalhamos com dados secundários (ou seja, já coletados) e, no caso de plantas, em sua maior parte, são deficitárias ou ausentes as informações sobre área de vida e número de indivíduos na natureza. Muitos outros grupos além de plantas também têm esse problema, como fungos, insetos e toda forma de micro-organismo. Daí a importância de expedições de campo para coleta de dados primários de biodiversidade que possam servir, entre outros, como subsídio para preencher as lacunas de conhecimento em termos de distribuição e tamanho populacional de espécies dos grupos deficitários", conclui a pesquisadora.
Acesse o artigo original (em inglês).