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Seminário comemorou 200 anos da chegada de Saint Hilaire ao Brasil
O Programa Reflora promoveu, de 1 a 3 de março, o I Seminário Franco-brasileiro de Botânica e História, na Escola Nacional de Botânica Tropical (ENBT/JBRJ). Biólogos, historiadores e especialistas em informática falaram sobre o passado, o presente e o futuro das pesquisas em biodiversidade, e dos projetos que estão sendo desenvolvidos nesta área pelos dois países.
O evento comemorou os 200 anos da chegada do naturalista francês Auguste de Saint Hilaire (1779-1853) ao Brasil e teve como coordenadores os pesquisadores Rafaela Campostrini Forzza (Jardim Botânico do Rio de Janeiro - JBRJ) e Marc Pignal (Museu Nacional de História Natural de Paris - MNHN)
Na abertura, o Cônsul Geral Adjunto da França no Rio de Janeiro, Jean-François Laborie, leu uma carta enviada pela ministra da Ecologia da França e presidente da COP21, Segolène Royal, sobre a importância da parceria de mais de dois séculos entre os dois países no conhecimento científico. O encontro contou também com a presença da presidente do JBRJ, Samyra Crespo, do diretor de Pesquisa Científica do JBRJ, Gustavo Martinelli, do representante da Vale parceira da primeira fase do Reflora, Sandoval Carneiro Junior, e do vice-reitor do Museu Nacional/UFRJ, Renato Rodriguez Cabral.
A pesquisadora Luci Senna do Valle, representando o Museu Nacional/UFRJ, recebeu das mãos de Marc Pignal o fac-símile do Herbário da Princesa Isabel, cujo original está no MNHN. Luci deu uma palestra sobre as plantas do Brasil central com base nas coletas feitas pelo paisagista e naturalista francês Glaziou no século XIX. O Herbário da Princesa Isabel também foi tema de uma apresentação da botânica Mariana Reis de Brito (PUC-Rio), que falou da pesquisa sobre a expedição da Princesa e de Glaziou ao Itatiaia, onde foi coletado o material do herbário. À tarde, os pesquisadores Marc-André Selosse (MNHN) e Melissa Bocayuva (UFV) deram palestras sobre fungos micorrízicos e sua relação com as orquídeas nas regiões tropicais, principalmente no Brasil.
O segundo dia do Seminário foi dedicado à apresentação da plataforma de livre acesso Xper, desenvolvida pelos franceses, e suas possíveis aplicações para o estudo da biodiversidade, notadamente na construção de chaves de identificação interativas. Régine Vigne Lebbe (MNHN) contou como foi desenvolvida a plataforma e falou de algumas de suas funcionalidades, até chegar à versão colaborativa, Xper3, que está online desde 2013. Já Livia Echternacht Andrade (UFOP) mostrou alguns usos da plataforma para pesquisa, ensino e extensão. Xper é uma forma de comunicação seja para um colega especialista, uma criança ou um curioso, ressaltou Livia. As duas pesquisadoras ministraram, em seguida, oficinas sobre o uso da plataforma.
Ainda no segundo dia, Marcelo Morales, diretor de Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde do CNPq, falou sobre o Reflora, uma iniciativa do CNPq, que está repatriando digitalmente as amostras e dados de plantas brasileiras depositados em herbários estrangeiros, como o do MNHN, e que passou a incluir também o material de diversos herbários brasileiros. Morales destacou a importância do Reflora para o CNPq e do papel do Jardim Botânico do Rio de Janeiro para o país. O encontro contou também com a presença do diretor de Pesquisas do JBRJ, Gustavo Martinelli, e da Dra. Ana Maria Giulietti-Harley, uma das idealizadoras do projeto.
O terceiro dia teve a manhã dedicada ao homenageado: Auguste de Saint Hilaire. O pesquisador francês Jean-Yves Mérian (Université Rennes 2- IdA) fez um panorama sobre o contexto social, político e econômico do Brasil na época em que Saint Hilaire chegou ao país, em 1816, abordando algumas expedições que o precederam e o interesse de D. João pelo conhecimento das riquezas naturais do Brasil para uso prático. Com suspeita de zika, a pesquisadora Maria da Graça Lins Brandão (UFMG) não pôde comparecer ao encontro.
Já a historiadora Alda Heizer (JBRJ) falou sobre pesquisas que vem sendo realizadas no Jardim Botânico do Rio de Janeiro referentes à história da Botânica e apontou algumas vertentes que ainda demandam investigação no que se refere ao trabalho de Saint Hilaire e de outros naturalistas de seu tempo. Ela ressaltou que as coleções de ciências naturais devem ser analisadas como elementos patrimoniais e poderosos instrumentos de investigação. Um projeto como o Reflora ou iniciativas dessa amplitude nos permitirão reconhecer, nas coleções, referências materiais associadas a descrições, e podem ser comparadas a banco de dados ou arquivos sistemáticos da biodiversidade e da História da Terra., afirmou.
A historiadora Lorelai Kury (Casa de Oswaldo Cruz) falou sobre Saint Hilaire como representante da chamada Botânica Filosófica, que buscava identificar o que as diversas espécies de plantas tinham em comum, mais do que suas diferenças, e como o trabalho do naturalista francês foi influenciado pelo do escocês Robert Brown. Ela lembrou ainda o cuidado, a precisão e a riqueza dos relatos e descrições de Saint Hilaire, que não se atinham à botânica, mas registravam também expressões e costumes das populações locais, entre outras coisas.
À tarde, a botânica Caroline Loup (Universidade de Montpelieur) falou sobre um campo de estudo chamado arquitetura das plantas (Plant Architecture), que investiga o processo de crescimento das espécies em suas diferentes partes e fases. Esse tipo de abordagem ajuda a fazer o diagnóstico das plantas individuais, sua idade, que tipos de ramos podem ser podados ou não e como uma poda mal feita pode acelerar a morte de uma árvore. Há relações também entre a arquitetura da planta e as propriedades da madeira.
Em seguida, Eva Perez Pimparé (MNHN) e Rafael Fonseca (MCTI) falaram sobre o sistema francês e o sistema brasileiro de infraestrutura de dados sobre biodiversidade, respectivamente. O francês, ReColNat, se propõe a reunir e disponibilizar virtualmente as informações das diversas coleções biológicas e de saúde da França. O sistema brasileiro SiBBr oferece serviços de publicação, integração, análise de dados e apoio aos tomadores de decisão, trabalhando alinhado às instituições parceiras, como o JBRJ e o ICMBio, para garantir o atendimento às necessidades destas e evitar duplicação de esforços. Ambos os sistemas estão em desenvolvimento.
Os coordenadores do Seminário, Rafaela Campostrini Forzza e Marc Pignal, encerraram o evento com o anúncio de que será organizado um relatório do encontro e que um livro sobre Saint Hilaire será publicado ainda este ano. Também em 2016, uma segunda edição do Seminário poderá ser organizada em Paris.