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Cerrado mineiro ganha planos de ação e guia de campo para proteção de sua flora ameaçada de extinção
Minas Gerais concentra o maior número de espécies da flora do Cerrado que estão criticamente em perigo de extinção. Evitar que essas espécies desapareçam definitivamente é um grande desafio, mas Minas passa a contar agora com três ferramentas valiosas para a conservação de sua biodiversidade. No dia 18 de dezembro, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, por meio do Centro Nacional de Conservação da Flora CNCFlora, lança as publicações Flora Ameaçada do Cerrado Mineiro - Guia de Campo, o Plano de Ação Nacional para a Conservação da Flora Ameaçada de Extinção da Serra do Espinhaço Meridional e o Plano de Ação Nacional para a Conservação da Flora Ameaçada de Extinção da Região de Grão Mogol-Francisco Sá.
Diversidade em risco na Cadeia do Espinhaço
O Plano de Ação Nacional (PAN) para a Conservação da Flora Ameaçada da Serra do Espinhaço Meridional e o PAN para a Conservação da Flora Ameaçada da Região de Grão Mogol-Francisco Sá cobrem duas áreas que fazem parte da Cadeia do Espinhaço, conjunto de montanhas que se estende de Ouro Preto à Bahia. Ambas são definidas como prioritárias para a conservação pelo governo brasileiro.
O Espinhaço Meridional e a região de Grão Mogol-Francisco Sá se diferenciam pelo clima, que é mais seco na segunda, e tem proximidade com a Caatinga. As ameaças à flora são, no entanto, muito parecidas nos dois territórios. Fogo, mineração, pecuária e as monoculturas de Eucalipto e Pinus são alguns dos principais fatores que põem em risco a sobrevivência das espécies nessas áreas. O Cerrado do Espinhaço Meridional sofre também com a expansão urbana, as espécies exóticas e invasoras e o extrativismo de plantas ornamentais, quando feito sem um adequado manejo.
A equipe do CNCFlora identificou 255 espécies ameaçadas de extinção no Espinhaço Meridional, sendo 45 destas categorizadas como criticamente em perigo (CR). Já em Grão Mogol-Francisco Sá são 74 espécies ameaçadas, das quais 12 na categoria CR.
Processo participativo com atores locais
Os PANs definem uma série de ações para evitar que as espécies em risco sejam extintas na natureza. Os documentos foram elaborados de modo colaborativo em oficinas promovidas pelo CNCFlora em 2014 e 2015. Participaram representantes da área acadêmica, instituições de pesquisa, gestores e analistas de Unidades de Conservação, moradores das localidades, empresas, ONGs, proprietários de terras, brigadistas e outros atores relacionados com o território abrangido em cada Plano.
Os PANs representam um consenso entre aqueles diretamente envolvidos com a conservação e aqueles que causam as ameaças. Nas oficinas, nós expomos a situação das espécies naquela área e depois todos se sentam para propor as ações a serem implementadas para evitar a extinção, explica a coordenadora técnico-científica do CNCFlora, Eline Martins.
Se, por um lado, os diferentes pontos de vista trazidos pelos participantes faz da elaboração dos PANs um processo árduo, por outro, a opção pelo diálogo evitando medidas impositivas amplia em muito a possibilidade de que as ações preconizadas nesses documentos sejam efetivadas. Para cada ação proposta em um PAN, define-se também, entre os participantes, os articuladores e colaboradores que serão responsáveis por implementá-la.
O principal papel do PAN é ser um orientador. Tomemos o caso de um agricultor que vai averbar uma reserva legal para fazer o Cadastro Ambiental Rural (CAR). Com o PAN, ele pode averbar uma área indicada pelo documento como prioritária para a conservação. Do mesmo modo, o Ministério Público pode se servir dos PANs para determinar compensações ambientais ou para definir onde empregar verbas dos Termos de Ajuste de Conduta, exemplifica Eline, lembrando que os Planos se tornam documentos oficiais do governo brasileiro.
Abordagem territorial
Os Planos de Ação Nacional para Conservação lançados pelo CNCFlora adotam uma abordagem territorial, em contraposição a um modelo anterior que era centrado nos grupos taxonômicos (famílias, gêneros e espécies de plantas). Isso permite um foco mais preciso nas ameaças, que podem variar de um local para outro, e facilita o envolvimento das pessoas, tornando o resultado mais realista e factível.
Outra vantagem da abordagem territorial é que ela viabiliza a realização de análises espaciais nas áreas abrangidas pelo PAN, com cruzamento de dados, permitindo criar um ranking dos locais prioritários para conservação e das ações mais urgentes que devem ser efetuadas em cada um. Além disso, espécies ainda desconhecidas que eventualmente existam no território abrangido também se beneficiam com esse modelo.
Toda análise dos locais prioritários é realizada pela equipe do Prof. Rafael Loyola, coordenador do Laboratório de Biogeografia da Conservação da Universidade Federal de Goiás (CB-Lab/UFG). Mesmo com uma abordagem territorial, ainda é necessário definir onde as ações elencadas vão trazer o maior benefício para a conservação da flora, diz Loyola, que é também organizador das publicações.
As áreas prioritárias para a execução de ações dos PANs ajudam os tomadores de decisão a atingir a máxima eficiência. Além disso, essas áreas são o primeiro filtro para elaboração de políticas públicas, como aquelas que direcionam a compensação ambiental para locais específicos, complementa o professor. O CB-Lab é realizador das publicações em conjunto com o CNCFlora.
Guia de Campo ensina a encontrar espécies ameaçadas de extinção
Flora Ameaçada do Cerrado Mineiro Guia de Campo é uma publicação voltada para o público em geral, não especialista em botânica, embora seja útil também para os especialistas. Seu principal objetivo é envolver as populações que habitam as regiões de Cerrado no esforço de conservação desse bioma.
A ideia do Guia surgiu durante a elaboração dos PANs. Muitas pessoas locais, como moradores dos municípios abrangidos, analistas de unidades de conservação, brigadistas, demandaram um instrumento que lhes possibilitasse colaborar na busca pelas espécies ameaçadas de extinção, conta Eline Martins.
O Guia de Campo traz informações sobre 82 espécies da flora do Cerrado em todo o Estado de Minas Gerais, sendo 64 consideradas Criticamente em perigo grau máximo de ameaça de extinção, e outras 18 espécies cujos dados são insuficientes para a definição de sua categoria de risco. Na apresentação, os autores alertam que o número de espécies criticamente em perigo ou insuficientes de dados no Cerrado mineiro é bem maior, mas muitas ficaram de fora do livro porque são tão raras que não foi possível encontrar imagens para ilustrá-las.
Com linguagem acessível, centenas de fotos, dispondo de ícones e glossário ilustrado, o Guia ensina como identificar as plantas catalogadas e o que fazer para ajudar a salvá-las. Estudantes de escolas e universidades, guias turísticos, agricultores e donos de terras, brigadistas, gestores e analistas de Unidades de Conservação, todos podem contribuir.
A expectativa dos pesquisadores é de que essas pessoas tragam novas informações sobre as espécies, que ajudem a saber se ainda existem em determinado local onde foram registradas no passado e a descobrir novas populações dessas plantas. Talvez até no quintal de casa.
Flora Ameaçada do Cerrado Mineiro Guia de Campo
Organizadores: Juliana A. de Oliveira, Marcio Verdi, Eline Martins, Gustavo Martinelli
Produção editorial: Andrea Jakobsson Estúdio
CNCFlora Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, 2015
200 p.
Plano de Ação Nacional para a Conservação da Flora Ameaçada de Extinção da Serra do Espinhaço Meridional
Organizadores: Nina Pougy, Marcio Verdi, Eline Martins, Rafael Loyola, Gustavo Martinelli
Produção editorial: Andrea Jakobsson Estúdio
CNCFlora Jardim Botânico do Rio de Janeiro e Laboratório de Biogeografia da Conservação/UFG
Rio de Janeiro, 2015
100 p.
Plano de Ação Nacional para a Conservação da Flora Ameaçada de Extinção da Região de Grão Mogol-Francisco Sá
Organizadores: Nina Pougy, Eline Martins, Marcio Verdi, Daniel Maurenza, Rafael Loyola, Gustavo Martinelli
Produção editorial: Andrea Jakobsson Estúdio
CNCFlora Jardim Botânico do Rio de Janeiro e Laboratório de Biogeografia da Conservação/UFG
Rio de Janeiro, 2015
76 p.
As publicações estão disponíveis em PDF, a partir de 18/12/2015, na página do CNCFlora.
Instituições interessadas podem solicitar exemplares pelo e-mail julioperota@cncflora.net informando seus dados e o endereço de correspondência.