Geral
Obras de Mestre Valentim são restauradas em ateliê aberto ao público
Em meio às belezas naturais do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, um tesouro com mais de dois séculos de existência muitas vezes passa despercebido pelo visitante. Desde o início do século vinte, quatro esculturas de um dos mais significativos artistas do Brasil Colônia, o Mestre Valentim, fazem parte do acervo da instituição. Além do valor artístico, as peças são as primeiras esculturas fundidas no Brasil e possuem inestimável valor histórico.
Trata-se de Eco, Narciso e duas aves pernaltas, esculturas originalmente projetadas para o Chafariz das Marrecas e o Chafariz do Jacaré. No século XIX, estas fontes serviram para abastecer a cidade de água e embelezar o Passeio Público, primeiro espaço planejado para o lazer da população carioca e o projeto de maior destaque de Mestre Valentim.
Datadas de 1785, as peças foram produzidas na Casa do Trem, local onde eram confeccionados e reparados os armamentos na época, que hoje integra o conjunto arquitetônico do Museu Histórico Nacional.
Atualmente, as esculturas se encontram deterioradas pelo tempo e umidade. Em 2015, alinhado a um projeto de valorização de seu patrimônio e em comemoração ao aniversário da cidade do Rio de Janeiro, o Jardim inicia a restauração destas obras.
Para celebrar o aniversário de 207 anos, a instituição abre as portas do Ateliê de Restauração Mestre Valentim. Lá, o público observa de perto as técnicas de restauro empregadas para garantir que o legado do artista para o Rio de Janeiro conserve sua autenticidade.
Mestre Valentim, artista multifacetado do Brasil Colônia
Considerado por estudiosos da cultura brasileira como um dos mais significativos artistas do Rio de Janeiro no século XVIII, Valentim da Fonseca e Silva teve um papel fundamental na modernização do Brasil Colônia. Filho de um fidalgo português e de uma escrava brasileira, atuou ativamente no processo de urbanização da cidade, destacando-se como escultor, entalhador, arquiteto e urbanista.
Nasceu em Minas Gerais em 1745, mas desenvolveu seu trabalho no Rio de Janeiro em um período em que a cidade, elevada ao status de capital, se consolida como o principal porto da colônia. Sua obra mais notável, o Passeio Público é inaugurado em 1783 e rapidamente se torna o principal local de lazer da população carioca. Um marco de modernização, o espaço simboliza as transformações pelas quais passou a cidade.
Destacou-se também pela arte sacra. Suas esculturas de estilo barroco ornamentam o
interior de igrejas, como a da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo e a Igreja de
Santa Cruz dos Militares.
Natureza e Cultura: duas dimensões de um Jardim
Para a museóloga do Jardim Botânico do RJ e coordenadora do projeto, Luísa Rocha, em um jardim com mais de 200 anos de história, cultura e natureza estão em constante diálogo.
Originalmente, o valor cultural das obras de Mestre Valentim esteve ligado ao seu uso artístico em um jardim construído com o intuito de urbanizar a cidade. Com a aceleração desta urbanização no século XX, ocorre a valorização do natural como patrimônio, frente a preocupação com os recursos naturais do planeta. No Jardim Botânico, patrimônio cultural e natural, arte e natureza, originais da cidade maravilhosa, se encontram e convivem na sua monumentalidade. Esta harmonia nos mostra como um espaço artificialmente construído tem o potencial de integrar e expressar múltiplas facetas da criação humana
Sobre a Restauração
O processo de restauração das obras de Mestre Valentim tem previsão de término em agosto de 2015. Nas fases de diagnóstico e levantamento de danos, equipes especializadas realizaram a fotogrametria das esculturas, resultando em um mapeamento digital e tridimensional das peças. O modelo resultante deste trabalho, guia os restauradores na identificação de fissuras, limos, rachaduras entre outros problemas a serem recuperados.
Para Silvia Puccioni, responsável pela restauração, o maior desafio diz respeito à conservação da autenticidade das peças e dos materiais usados.
Estas esculturas são as primeiras fundidas no Brasil, e mais do que valor artístico, têm valor histórico. Sua restauração deve seguir critérios de autenticidade e, principalmente, preservar os materiais originais. Em seu interior, as peças Eco e Narciso têm areia de fundição, material normalmente usado em moldes. Mas Mestre Valentim, optou por deixar o núcleo desta forma, provavelmente para dar sustentação ao exterior da peça, formado por uma fina camada de cobre. Não mexeremos na camada interna e toda a restauração será realizada a frio, sem soldas. É um processo altamente criterioso
O projeto de restauração é coordenado pelo Museu do Meio Ambiente do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e tem patrocínio da Hope Recursos Humanos, através da Lei de Incentivo à Cultura da Prefeitura do Rio de Janeiro - a Lei do ISS.
O Ateliê de Restauração Mestre Valentim está aberto a visitação nas quintas-feiras, das 10h às 16h.
O agendamento de visitas deve ser feito no Centro de Visitantes, ou pelo telefone (21) 3874-1808