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Lista de espécies da flora do Itatiaia será primeira a integrar Catálogo online
Iniciativa de pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e de outras sete instituições cria instrumentos para apoiar a gestão de Unidades de Conservação.
Os primeiros resultados do projeto interinstitucional Redescobrindo espécies ameaçadas em Unidades de Conservação da Floresta Atlântica: bases para gestão, conservação e acesso à informação foram apresentados na sexta-feira, 30 de novembro de 2018, durante o Sarau de Pesquisa e Cultura realizado no Parque Nacional do Itatiaia. O evento reuniu pesquisadores, estudantes e técnicos de diversas instituições e áreas relacionadas à biologia, ecologia e meio ambiente.
O projeto, que conta com recursos do CNPq, ICMBio e FAPES, está reunindo e organizando dados das espécies de plantas com ocorrência em três UCs do Sudeste: o Parque Nacional do Itatiaia (PNI), o Parque Nacional do Caparaó (PNC) e a Floresta Nacional do Rio Preto (FNRP). Um dos objetivos é prover listas atualizadas dessas espécies com informações úteis para a gestão dessas unidades. Além disso, o projeto visa refinar o conhecimento sobre as espécies classificadas pelo Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora) em alguma categoria de ameaça ou com deficiência de dados e que ocorrem nessas áreas.
Apesar de haver muita informação em bancos de dados como os da Flora do Brasil, Reflora, CNCFlora e Jabot, esses sistemas foram pensados para outras finalidades. Por isso estamos aproveitando as informações dessas bases, mas vamos disponibilizá-las de uma maneira amigável para os gestores e pesquisadores que atuam nas UCs, explicou a coordenadora Tatiana Carrijo (UFES).
O primeiro resultado do projeto é a Lista de Espécies da Flora do PNI, que está na fase final de verificação dos nomes. Esta lista será a primeira a integrar outro produto desse trabalho: o Catálogo de Plantas das Unidades de Conservação do Brasil, um sistema no qual listas de plantas de todas as UCs brasileiras poderão ser disponibilizadas online. O catálogo foi desenvolvido com a colaboração de uma equipe de Tecnologia da Informação do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ), onde o sistema estará sediado.
Dez integrantes da equipe do projeto participaram do evento no PARNA Itatiaia
A equipe do projeto Redescobrindo espécies ameaçadas em UCs da Floresta Atlântica está também desenvolvendo três protocolos para elaboração dessas listas, com base na situação bem diferente de cada uma das três unidades abordadas. O PNI tem muito material coletado e depositado, em sua maior parte, em um único herbário o RB cujas amostras já estão digitalizadas e, em sua maior parte, identificadas. Já o PNC tem muito material coletado, porém disperso em vários herbários e apenas parcialmente digitalizado. E a FNRP tem pouco material coletado, o que permitirá estabelecer um passo a passo para todo o processo da coleta à disponibilização online de forma mais sistemática e racional. Esses protocolos poderão ser replicados por outros pesquisadores que desejem gerar listas para outras UCs, anunciou Tatiana.
A Lista de Espécies da Flora do Parque Nacional do Itatiaia conta com a colaboração de 45 taxonomistas na verificação e limpeza dos dados, a partir de uma lista preliminar que teve como fonte as bases de dados e bibliografia já existente. A lista final manteve 86% das espécies que estavam presentes na lista preliminar, afirmou a pesquisadora Marina Muniz Moreira (UFES), bolsista do projeto e segunda palestrante da equipe.
Marina falou sobre o método de trabalho para a elaboração da lista e do protocolo para o PNI. Ela ressaltou a importância de se conhecer bem a unidade de conservação para fazer a limpeza das listas preliminares geradas com dados brutos. Também contou que, para algumas etapas, como a seleção das localidades (estados e municípios) de abrangência das UCs, foram desenvolvidos scripts no ambiente R (software aberto para cálculos estatísticos e gráficos) para automatização das buscas e limpeza de dados.
O que se descobriu até agora sobre as espécies de plantas do PNI foi o tema da palestra da pesquisadora Marli Pires Morim (JBRJ). A elaboração da lista revelou a ocorrência de 2567 espécies, e mais 300 podem ser incluídas nos próximos meses. Os números até agora mostram 1705 espécies de angiospermas, 519 briófitas (Costa et al. 2015), 341 de samambaias e licófitas e 2 de gimnospermas, com nomes já verificados. Orchidaceae, Asteraceae, Melastomataceae, Rubiaceae e Myrtaceae são as cinco famílias com maior riqueza e diversidade de espécies no PNI. A expressão dessa UC para a Mata Atlântica é significativa e, até o momento, demonstra que no Parque Nacional do Itatiaia encontram-se 11% das angiospermas desse bioma.
Identificou-se também, somando-se as angiospermas, as samambaias e licófitas e as briófitas, que há 89 espécies ameaçadas no PNI, sendo que 15% delas contam com apenas um voucher para o Itatiaia, com coleta anterior a 1980. Constatou-se que 76 espécies ameaçadas são angiospermas e apresentam maior concentração nos campos de altitude. Saber disso só é possível porque temos herbários e bancos de dados com os dados disponibilizados, afirmou Marli, lembrando que 97% dos vouchers que validam as espécies do PNI são originários do herbário RB e acessíveis pelo sistema Jabot.
A pesquisadora do JBRJ Marli Pires Morim fala sobre os primeiros resultados do projeto
Entre outras funcionalidades, a Lista do PNI traz a informação das espécies por categoria de ameaça de acordo com a avaliação realizada pelo CNCFlora para a Lista Vermelha da Flora do Brasil (http://cncflora.jbrj.gov.br/portal/pt-br/listavermelha). Como explicou o pesquisador Leandro Freitas (JBRJ) em sua palestra sobre Estudos populacionais e reprodutivos para a conservação de plantas ameaçadas, essas categorizações foram feitas com base principalmente na distribuição geográfica das espécies e no histórico de redução de habitats. Ele defende que, além disso, o conhecimento de características populacionais e reprodutivas de cada espécie em seu ambiente, como, por exemplo, as formas como interagem com seus polinizadores, são fundamentais para determinar a probabilidade de extinção delas ao longo do tempo, o que permite maior precisão nas ações para evitar que desapareçam.
Atualmente, o Brasil conta com alguns Planos de Ação Nacional para Conservação de plantas ameaçadas, também elaborados pelo CNCFlora, que utilizam uma abordagem territorial. Leandro concorda com essa abordagem, pois ao conservar um território, presumivelmente todas as espécies presentes nele são beneficiadas. Ele acrescenta, porém, que as espécies, por suas características próprias, respondem de forma diferente às ameaças. Por isso, não se pode perder de vista também o conhecimento para a conservação de cada espécie individualmente nas UCs.
As espécies raras correspondem à maioria das espécies ameaçadas. Para encontrá-las e estimar o tamanho de sua população numa área, o pesquisador considera que o método de amostragem adaptativa é o melhor que se tem atualmente, e será utilizado no projeto para ajudar a estimar o risco de extinção de forma mais precisa.
Os principais desafios apontados por Leandro no PNI são a quantidade de registros únicos, as incertezas na classificação taxonômica, os gradientes de altitude e mudanças climáticas, o fogo e as espécies invasoras, entre outras ameaças. Temos que dar garantia de ambiente não apenas para que as espécies possam subsistir na situação atual, mas também para que continuem evoluindo, concluiu.
Além da Universidade Federal do Espírito Santo e do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, o projeto Redescobrindo espécies ameaçadas em Unidades de Conservação da Floresta Atlântica: bases para gestão, conservação e acesso à informação conta com a colaboração dos herbários da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade Federal do Paraná (UFPR), Centro de Pesquisas do Cacau (CEPEC), e Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), bem como da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Universidade de Vila Velha (UVV) e Universidade de São Paulo (USP).