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TOMBAMENTO DE QUILOMBOS
Confira os destaques da cerimônia de assinatura da Portaria de Tombamento dos Quilombos
(Fotos: Mariana Alves/Iphan)
Foi uma data histórica, tanto para o País quanto para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que celebrou ontem (20/11) um novo capítulo das políticas patrimoniais brasileiras, com a assinatura da Portaria de Tombamento dos Quilombos. O evento, que contou com a presença da ministra da Cultura, Margareth Menezes, do presidente do Iphan, Leandro Grass, e de toda a diretoria colegiada do órgão, encheu o auditório do Iphan, em Brasília, com lideranças e representantes de comunidades quilombolas e de povos de terreiro, entre demais convidados. Foi uma cerimônia de discursos emocionantes e emocionados, que saudavam um novo instrumento de reconhecimento do protagonismo da população negra na construção da identidade nacional.
Confira algumas das falas de maior destaque do evento:
Ministra da Cultura, Margareth Menezes:
“Estamos construindo uma história nova, com a compreensão de uma parcela importante da sociedade em relação ao significado dessas ações de reconhecimento dos quilombos. Dessas ciências – que hoje chamamos de tecnologias de sobrevivência – que vão mais além do que apenas à preservação do corpo, vão à preservação da memória, de conhecimentos ancestrais que nos quilombos resistem. […] Eu também tenho uma raiz, por parte da minha mãe, quilombola. Minha família, da Ilha de Maré, vem do quilombo de Bananeiras, e neste momento eu sinto muito forte essa presença e essa responsabilidade dessa ancestralidade.”
Presidente do Iphan, Leandro Grass:
“De nada adiantaria dizer que o patrimônio cultural de matriz afrobrasileira é importante se não colocássemos esforços na prática para que isso tivesse resultados concretos na vida das pessoas. E hoje a gente entrega mais um resultado concreto. [...] O que nós queremos realmente, para além de dar visibilidade a toda a cultura quilombola brasileira, é projetar outras políticas públicas, para que em nenhum quilombo nenhuma criança fique com fome, nem tenhamos idosos e mulheres adoecendo pela falta de assistência em saúde, nem deixemos de ofertar educação. Para que em nenhum quilombo haja violência, agressão, violação da terra, dos direitos adquiridos. O Iphan não vai resolver isso sozinho, essa é uma equação do Estado brasileiro junto com as comunidades. Mas nós vamos dar uma contribuição, porque acreditamos que a partir da cultura muita coisa floresce.”
Diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização, Andrey Schlee:
“Ao cumprir o desejo constitucional, esperamos estar contribuindo para aproximar as políticas do patrimônio cultural das políticas do Estado brasileiro que buscam modificar as rígidas estruturas que durante séculos segregam, discriminam e condenam à morte milhões de cidadãos brasileiros, entre os quais os quilombolas. É por isso que cada segundo importa quando se trata de garantir direitos e construir políticas públicas. No que diz respeito às comunidades quilombolas, os dados têm evidenciado o agravamento das desigualdades e o aumento das violências historicamente praticadas. Nesse sentido, não podemos ficar parados ou aguardar para fazer aquilo que nos compete; aquilo que é nossa obrigação.”
Representante da coordenação executiva da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas), Mário dos Santos Campos Jr.:
“Quantos mais de nós vamos ter que derramar o sangue na nossa terra, que a gente sabe que é nossa? Que é onde minha mãe plantava, onde minha mãe colhia, onde meu tataravô ia buscar suas ervas, a sua lenha para botar no fogão? E hoje chega alguém dizendo que é seu e ainda se acha no direito de nos matar, nos ameaçar, nos expulsar da nossa terra? [...] Muito obrigado, em nome do movimento quilombola do Brasil, por estarem junto com a gente, por a gente saber que não está só. Onde um está caindo, o outro vai lá e dá as mãos. E hoje é isso que a gente sente do Iphan: vocês deram as mãos à gente, e a gente não está só para seguir nessa luta.”
Educadora, representante da Conaq e membro do conselho consultivo do Iphan, Givânia Maria da Silva:
“[Essa portaria é] um instrumento a mais na luta em defesa das comunidades quilombolas. Saber que ela foi construída e publicada me parece ser uma oportunidade importante para as comunidades atuarem indicando para o Iphan quais serão os bens que elas gostariam que fossem tombados. [...] Parabenizo a equipe que se empenhou nessa construção, também disposta a continuar esse diálogo [porque] não existe uma política pública que não tenha necessidade de revisões e aprimoramentos. Essa portaria certamente terá, mas isso a gente vai ver quando da sua aplicabilidade. [...] Desejo sorte a todos e que a gente continue na luta.”
Procurador federal que contribuiu para a elaboração da Portaria de Tombamento dos Quilombos, Paulo Pereira:
“Quando a Constituição Federal trata dos quilombos, ela quer nada mais, nada menos dizer o seguinte: a insurgência [quilombola] é importante para a constituição da Nação. [Aquele] regime jurídico dos mais opressores, que foi a escravidão – e a gente sempre deve lembrar que foi um regime jurídico – teve um contraponto, teve uma insurgência, que se chama quilombo. Trazer isso para a contemporaneidade é extremamente importante porque a insurgência do povo brasileiro através dos quilombos e de outros movimentos [ainda] está presente. Quando o Iphan assume esse compromisso de trazer para as narrativas da Nação essas narrativas quilombolas, dando a mesma dimensão que os sujeitos hegemônicos têm, a gente está dando um grande passo.”
Procuradora federal junto ao Iphan, Mariana Karam:
“Ao longo da história, os quilombos têm desempenhado um papel fundamental na preservação da cultura e identidade afrobrasileira. Hoje celebramos não apenas a resistência do povo negro, mas também o compromisso renovado do Iphan em preservar e valorizar esse patrimônio cultural único. [...] A Portaria é uma ferramenta poderosa, mas seu impacto só será plenamente sentido se nos dedicarmos de coração a implementá-la de maneira justa e inclusiva.”
Assessora de Participação Social e Diversidade do Ministério da Cultura, Mariana Braga:
“Esses passos institucionais que a gente vai dando ao longo da nossa história são muito importantes para a concretização dos direitos. [...] Quero celebrar esse passo e celebrar também algumas questões que estão aqui trazidas, [como] a da autodeterminação. A compreensão que [a Portaria] traz de que o que precisa ser tombado é de fato aquilo que cada comunidade reconhece. Isso talvez seja uma das coisas mais importantes.”
Veja também o discurso na íntegra da Coordenadora-geral de Identificação e Reconhecimento, Vanessa Pereira:
E o discurso na íntegra da coordenadora do Comitê Permanente para Preservação do Patrimônio Cultural de Matriz Africana (Copmaf), Bruna Ferreira: