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MATERIAL E IMATERIAL
Arte Santeira do Piauí e Igreja Nossa Senhora de Lourdes são reconhecidas como Patrimônio Cultural do Brasil
A Arte Santeira do Piauí se destaca nas cidades de Teresina, Parnaíba, Campo Maior, Pedro II e José de Freitas. (Fotos: Daniel Oliveira)
A Arte Santeira em Madeira do Piauí e a Igreja de Nossa Senhora de Lourdes, em Teresina (PI), foram definitivamente reconhecidas como Patrimônio Cultural do Brasil. A decisão foi tomada nesta segunda-feira (11), durante a 106ª Reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural.
Esta é a primeira vez que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional promove ação de reconhecimento que abrange, ao mesmo tempo, o registro de um bem imaterial e o tombamento de uma edificação e seu acervo. Com a decisão, a Arte Santeira em Madeira do Piauí será inscrita no Livro das Formas de Expressão e a Igreja Nossa Senhora de Lourdes será inscrita no Livro do Tombo das Belas Artes, Livro do Tombo Histórico e Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.
A igreja recebeu tombamento provisório em 2011, e a proteção, agora definitiva, compreende seu acervo de bens móveis e integrados, assim como a poligonal de entorno. De acordo com o conselheiro José Reginaldo Gonçalves, relator do processo, a Igreja da Vermelha, como é conhecida localmente, possui forte ressonância na comunidade dos artistas santeiros do Piauí. “É parte de seus mitos de origem [da Arte Santeira]. Constitui-se num lugar de memória, altamente significativo para a memória coletiva e para a autopercepção dos artistas enquanto uma cultura”, destaca o relator em seu parecer técnico.
O documento acrescenta, ainda, que o acervo de obras que se abriga na igreja possui valor não apenas estético, mas principalmente social e religioso. “A igreja foi construída segundo pressupostos da Teologia da Libertação, para a qual a ênfase deveria estar em igrejas simples, despojadas e ao alcance do povo mais pobre. A arte em madeira é simbólica e socialmente parte inseparável desse discurso”, explica o parecer.
Processo de reconhecimento
A solicitação de registro da Arte Santeira em Madeira do Piauí como Patrimônio Cultural do Brasil foi realizada em 2008 pelo Conselho de Jovens Artesãos e Memorial Mestre Dezinho. O pedido foi endossado por um abaixo-assinado com 21 assinaturas do Conselho de Jovens Artesãos.
O pedido passou então por uma primeira fase que consistiu em análise documental, que considerou pertinente o pedido. Em 2011, o processo foi corroborado pelo resultado do Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC), realizado pelo próprio Iphan, com um resumo do universo de santeiros em mestres, localidades e saberes inventariados.
Expressão popular em madeira entalhada
A Arte Santeira em Madeira do Piauí é uma manifestação plástica que utiliza a madeira como matéria-prima para o entalhe de esculturas tridimensionais. A arte produz peças variadas e com formas de referências religiosas, elementos da natureza, paisagens locais e modo de vida da população.
A forma de expressão é fruto de fenômeno sociocultural que emergiu no Piauí na década de 1970 e se destaca em cidades como a capital Teresina, Parnaíba, Campo Maior, Pedro II e José de Freitas. A arte ganhou notoriedade por meio de iniciativas eclesiásticas, governamentais e do mercado de arte. Hoje, o estado reúne cerca de 50 santeiros em atividade.
Na produção de cada peça, o bloco de madeira é trabalhado primeiro com instrumentos maiores, como serrotes e enxó. Em seguida, é modelado com formão, facas, goivas e instrumentos feitos pelos próprios santeiros. As figuras são riscadas no bloco e, a partir disso, é iniciado o entalhe. A qualidade do bloco de madeira é que definirá o que será esculpido nele, considerando seu tamanho, dureza e movimento do que pode ser impresso.
A maior parte das peças é mantida monocromática, com acabamento de lixa e cera, embora alguns santeiros apliquem cores misturando pigmentos à cera para escurecer alguns elementos das figuras. Apesar da técnica comum a todas as peças, cada resultado é único, as obras nunca saem iguais.
“Os santeiros reivindicam com veemência sua singularidade artística, a marca individual embutida em cada uma das peças, que, para eles, jamais se repetem”, destaca o dossiê de reconhecimento da Arte Santeira em Madeira do Piauí. “Não se trata, com efeito, de uma arte ligada a processos de reprodutibilidade técnica, mas de uma produção com especificidades estilísticas apreciadas por um público de dentro e de fora do estado”, complementa o dossiê.
Com o registro da Arte Santeira em Madeira do Piauí como Patrimônio Cultural do Brasil, será elaborado o Plano de Salvaguarda, documento norteador para a formulação de políticas públicas que garantam a sustentabilidade do bem cultural. A elaboração do Plano de Salvaguarda envolve a participação social dos santeiros e de instituições parceiras.
Acesse o Parecer técnico e o Dossiê de Registro da Arte Santeira em Madeira do Piauí
Um templo para o povo
Construída entre as décadas de 1960 e 1970, a Igreja de Nossa Senhora de Lourdes tem imenso valor histórico, etnográfico e artístico. Seu processo de tombamento definitivo tramitou em conjunto com o processo de registro da Arte Santeira em Madeira do Piauí.
A construção de um novo espaço litúrgico no bairro da Vermelha, na capital piauiense, foi idealizada após o Concílio Vaticano II. A edificação pretendia uma aproximação entre a Igreja Católica e a população, em especial, as camadas trabalhadoras. Para isso, o espaço da igreja foi concebido com diversos elementos que buscavam reforçar essa aproximação, incorporando ao ambiente litúrgico a expressão cultural popular e o imaginário local.
A ideia era construir um templo rústico e sem muitos adornos, uma “oficina de almas”. Assim, a construção da sede da paróquia proposta à comunidade, e realizada em mutirão com os moradores do bairro, tinha como objetivo a constituição de um espaço amplo e simples. Em todos os aspectos buscou-se aproximação com a realidade dos fiéis que se juntaram à construção, privilegiando os materiais e soluções construtivas de uso da população.
Desse modo, a convite do pároco local, Francisco Carvalho, os mestres Dezinho e Expedito, ambos fazedores de ex-votos, esculpiram em madeira peças de devoção e decoração, a partir de referências do artista plástico Afrânio Castelo Branco, também autor das pinturas de cavalete presentes na igreja. A construção do templo é, portanto, um evento marcante para a produção santeira a partir dos anos 70, uma vez que os santeiros criaram peças especialmente para o acervo da igreja.
Assessoria de Comunicação Iphan
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Letícia Maciel - leticia.vale@iphan.gov.br
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