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A virada do Patrimônio Cultural: seis meses de retomada e fortalecimento do Iphan
Na semana em que completamos seis meses da nova gestão do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), podemos dizer com alegria e entusiasmo: o jogo virou! Avançamos em uma agenda de reconstrução, resgate e valorização do Patrimônio Cultural brasileiro. Isso não significa que vamos nos acomodar e deixar de trabalhar para manter e ampliar as conquistas já alcançadas. Mas o fato é que, depois de termos encontrado a instituição destruída, amedrontada e desmotivada, demos passos importantes na reconstrução do Instituto para que volte a ser uma das principais ferramentas de transformação do Brasil.
Temos comunicado os avanços e resultados do esforço coletivo empregado por servidores, superintendentes, coordenadores e diretoria colegiada. Retomamos obras paradas, programas estruturantes, ações esquecidas e estamos ousando em novos projetos. Apostamos no diálogo interno, externo e na construção coletiva, em conjunto com a sociedade. Cumprindo a determinação do presidente Lula, sentamos à mesa com mais de cem lideranças públicas, entre elas prefeitos, governadores, secretários municipais e estaduais e parlamentares que querem construir a agenda do Patrimônio Cultural.
Foram dezenas de reuniões com movimentos sociais, indigenistas, quilombolas e demais representações da sociedade civil organizada. Abrimos um canal com a iniciativa privada para atrair investimentos e soluções em prol do Patrimônio Cultural. Estamos trabalhando em parceria com as universidades e institutos federais em projetos de pesquisa e intervenções nos centros históricos. Para surpresa de muitos, o Iphan abriu suas portas à sociedade brasileira por inteiro.
Quem conhece e se dedica ao Patrimônio Cultural sabe da paixão, do afeto e dos desafios inerentes ao tema e sua rotina. Dos tapetes e telhados desgastados, passando pelos casarões particulares escorados por falta de manutenção, as intervenções em áreas e bens tombados, a exigência da análise arqueológica nos empreendimentos, até as complexas iniciativas em cidades históricas, tudo adquire o mesmo grau de atenção e movimenta uma rede de grandes tensões sociais.
Da “agulha ao avião”, se tem patrimônio, tem intensidade. Seja tombado, registrado, valorado ou não, é no Iphan onde chegam os problemas e se buscam soluções, mesmo que não haja responsabilidade absoluta ou direta do órgão com a situação. Entendo que isso é um sinal da credibilidade que essa quase centenária instituição adquiriu. Assim, temos dedicado energia para esclarecer quais são as nossas atribuições e como podemos ajudar outras instituições, além de estados e municípios, a assumirem seu papel nessa gestão.
Por isso, entendemos que a constituição do Sistema Nacional do Patrimônio Cultural é prioridade e pode colaborar profundamente para uma preservação mais ampla dos nossos bens culturais, incluindo melhor a sociedade nessa empreitada. Estamos trabalhando para que este seja um dos principais legados do novo Governo Lula.
Para lidar com uma exigente mediação diária, apostamos na boa política do diálogo e na capacidade técnica dos nossos servidores. Nem sempre é fácil. Cheguei à conclusão de que tais micro e macro desafios fazem do Iphan uma das instituições brasileiras pela qual a sociedade nutre sentimentos absolutamente contraditórios. Com a mesma intensidade que construímos laços profundos com aqueles e aquelas que são nossos parceiros na promoção do patrimônio, por outro lado, há uma aguerrida oposição às decisões institucionais e até quem defenda a extinção do Iphan em nome de uma concepção imediatista que não reconhece o passado e o presente e tampouco pensa no futuro do Brasil.
Sabemos que a “boiada” do governo anterior não era apenas na área ambiental. Ela também passou por cima do Patrimônio Cultural e seus efeitos ainda reverberam. Um dos exemplos foi a quase extinção dos investimentos nas ações do patrimônio imaterial nos últimos quatro anos. Como resposta, no próximo dia 25 de julho, retomaremos uma política que não acontece desde 2015: o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI).
Com um investimento inédito em nossa história, serão mais de 7 milhões de reais em pesquisa, salvaguarda e fomento da cultura popular. Mas não paramos apenas nisso. Já implementamos 16 unidades do Canteiro Modelo nas cinco regiões do País, em uma política que visa mapear danos e promover assistência técnica em imóveis de famílias vulneráveis que vivem em centros históricos. Avançamos na atualização das normas de preservação em sítios históricos tombados, dando segurança jurídica e criando oportunidades de desenvolvimento para estas regiões. Lançaremos um robusto edital com foco na Educação Patrimonial, que apoiará projetos em todo o Brasil. Retomamos obras interrompidas, demos sequência às que estavam em andamento e iniciamos dezenas de novos projetos para restaurar bens culturais nos diversos estados brasileiros. Isso tudo acompanhado de um forte movimento de planejamento e gestão, com monitoramento de indicadores, capacitação e apoio aos técnicos.
Reconhecemos que ainda há desafios a serem superados em diversos aspectos do nosso trabalho, especialmente quando olhamos para a realidade dos nossos servidores. Nesse sentido, temos intensificado o diálogo sobre a criação do plano de carreira, recomposição do quadro de pessoal e melhores condições para o desempenho das ações finalísticas do Iphan.
Vamos implementar o Programa de Gestão e Desempenho com objetivo de aumentar a eficiência e incrementar a qualidade de vida dos servidores. Nesta direção, celebramos um feito importante, oriundo da compreensão e do belíssimo trabalho realizado pelo Ministério da Gestão e da Inovação. Foi anunciada pela ministra Esther Dweck a tão esperada convocação do cadastro de reserva do nosso último concurso, realizado em 2018. Assim, 102 servidores chegarão ao Iphan nos próximos meses para se somarem nessa grande missão que o órgão possui. Isso também só foi possível graças ao empenho da ministra da Cultura, Margareth Menezes, sensível a todas as demandas apresentadas, do nosso secretário Márcio Tavares e de toda a equipe do Minc. Sem deixar de valorizar, claro, a luta incansável da nossa área de Administração e Planejamento, que vem se desdobrando para dar fôlego a uma instituição que estava na UTI do descaso.
Digo novamente que reconstruir dá muito mais trabalho do que destruir. Leva mais tempo, exige paciência e resiliência todo dia. Contudo, tem sido animador ver que esse movimento de União e Reconstrução está irradiando por toda a sociedade e estimulando segmentos a se inserirem na política do Patrimônio Cultural.
Um dos mais fortes e recentes exemplos foi o da construção do Hip Hop Nacional em torno dos inventários participativos que culminaram em um dos mais densos e consistentes pedidos de registro de patrimônio imaterial que o Iphan já recebeu. Também destaco nosso diálogo com os representantes dos terreiros tombados e a retomada dos processos paralisados no Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização.
Aliás, falando de fiscalização, estamos investindo em um robusto processo de formação dos técnicos para uma relação mais pedagógica e efetiva no combate aos danos em bens tombados. Adotamos medidas importantes junto aos quilombos e sítios arqueológicos inseridos em comunidades indígenas. Avançamos nas estratégias de promoção da memória e do patrimônio sensível. Colocamos as matrizes culturais historicamente excluídas no centro de nossas ações de forma prática, com orçamento e medidas concretas. Decidimos democratizar e levar o Iphan a lugares físicos e simbólicos que o momento histórico exige. Acreditamos que a hora é de ousar e inovar com responsabilidade e disciplina, pois não sabemos quando a história nos dará outra oportunidade como essa.
Seguimos sem perder de vista o 8 de janeiro. Ali estava a bílis de um período sombrio da nossa história. Além de fracassarem, os inimigos do País viram que nossa capacidade de reconstrução é enorme. Em poucas semanas, praticamente já estava tudo restaurado e recomposto.
O mesmo se aplica ao Iphan que, ao ser depredado, com seus protagonistas isolados e acuados, depois desses seis meses, está com a casa em melhores condições, num estado permanente de conservação para a inovação. Seguiremos trabalhando para que ela fique ainda mais firme e fortalecida. Dia a dia, seguimos celebrando muitas entregas. E virão mais! O segundo semestre será uma enxurrada de trabalho, boas agendas, lançamentos de novos programas e muita construção coletiva. Com paciência, sabedoria e amor pelo povo brasileiro, queremos fazer ainda mais. E faremos.
*Leandro Grass é presidente do Iphan - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional