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Vulnerabilidades financeiras na terceira idade
A longevidade atual é consequência de muitas variáveis, destacando-se os avanços no campo da medicina. Essa tendência se acelera cada vez mais nos países em desenvolvimento e, por isso, suas economias devem estar atentas para se adaptarem a esta nova realidade.
Por este motivo, torna-se muito importante divulgar o conhecimento acerca das experiências econômicas na terceira idade, sua relação com produtos financeiros, além de pesquisas e relatórios realizados sobre o assunto, como o elaborado pelo Comitê 8 da IOSCO em março de 2018 a ser discutido neste artigo.
O aumento da população idosa é um fator que impacta a demanda por produtos e serviços financeiros. Alguns governos têm buscado reformular suas políticas de aposentadoria, oferecendo novas opções às três fontes mais comuns de renda de aposentadoria: aposentadoria financiada pelo governo, programas patrocinados por empregadores e economias pessoais.
Diante deste cenário, aspectos relacionados a aposentadoria devem não só considerar o acúmulo de renda durante os anos de trabalho, mas também a redução da riqueza durante a aposentadoria. “Desacumulação” (no termo original, decumulation) é o termo relacionado ao processo de desconstituir reservas financeiras, ou seja, consumir a poupança acumulada. Este processo deve ser feito de forma a minimizar o risco de os indivíduos ficarem sem recursos antes do falecimento.
Uma população mais longeva requer uma reinterpretação do que se conhece hoje sobre Proteção dos Investidores. As especificidades do público sênior evocam não só a necessidade de educação dos investidores e consultoria financeira, mas a forma de como os processos e a comunicação ocorrerão para este grupo.
O cenário atual de baixas taxas de juros dificulta a preparação da aposentadoria, pois os investidores tendem a optar por alternativas mais arriscadas, que prometem retornos mais altos, podendo comprometer reservas já acumuladas. Esses aspectos sinalizam a necessidade urgente de capacitar investidores mais velhos a tomarem boas decisões de investimento durante a fase de desacumulação.
O envelhecimento é de particular importância para os reguladores, devido à sua natureza a longo prazo. Os riscos financeiros associados a essa etapa da vida podem demorar a aparecer e podem emergir apenas em grandes crises, levando muito tempo para se tornarem ameaças reais à proteção dos investidores. Portanto, os membros da IOSCO, como a CVM, estão atentos para mitigar estes efeitos.
Em março de 2018, o Comitê 8 da IOSCO sobre Investidores de Varejo apresentou o relatório “Vulnerabilidade do Investidor Sênior”, no qual foram coletados dados relevantes sobre o tema (através de revisão de literatura) e pesquisados os pontos de vista e experiências relacionadas a este público, junto aos membros do comitê consultivo.
A relatório procurou analisar os riscos crescentes que os investidores seniores enfrentam hoje e buscou identificar boas práticas para gerenciar esses riscos. O trabalho da IOSCO concentrou-se em: a) fraude de investimento direcionada a investidores seniores, considerando consultoria financeira não registrada ou estrangeira; b) consultores financeiros registrados visando investidores seniores para investimentos inadequados.
A pesquisa revelou que os idosos correm um risco maior de serem vítimas de fraudes financeiras do que investidores de outras faixas etárias. Foram identificados também maiores riscos de indicação de investimentos inadequados, de fraude financeira cometida por não familiar, tomada de decisão financeira impactada pela capacidade cognitiva, indicação de produtos complexos e pouco compreensíveis, alfabetização financeira deficiente e isolamento social.
Até recentemente, considerava-se que a regulamentação e os programas de proteção geral aos investidores já contemplavam muitos dos riscos para investidores seniores e, portanto, esses investidores não demandariam medidas de proteção específicas. No entanto, esta abordagem vem sendo revista e no decorrer de seu trabalho, a IOSCO detectou um interesse crescente de seus membros em estratégias de proteção focadas no investidor sênior.
A mudança demográfica está afetando diferentes regiões de maneiras diferentes e em diferentes velocidades. A importância e o senso de urgência que são atribuídas às questões relacionadas aos idosos dependem de como estas são vistas localmente. A vulnerabilidade do investidor é, portanto, também definida pelo seu contexto local e cultural.
O Relatório identificou as seguintes práticas positivas para reguladores e prestadores de serviços financeiros, em relação aos investidores seniores:
a) Oferecer programas e recursos educacionais direcionados a investidores seniores.
b) Fomentar o desenvolvimento de especialização voltada para os seniores dentro das normas regulatórias, educacionais ou programas de consultoria.
No que se refere aos reguladores em particular, o relatório lista exemplos práticos dos países que fazem parte do Comitê.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Brasil criou um grupo de trabalho com acadêmicos (principalmente da área de Psicologia) e instituições públicas (Escritórios de Ministério Público e Defensor Público) para estudar as vulnerabilidades dos investidores seniores e projetar iniciativas educacionais para eles.
O grupo de trabalho realizou quatro eventos educacionais para idosos investidores e palestrou sobre tópicos como: formas de violência (incluindo violência financeira) contra idosos, proteção ao consumidor, bem-estar financeiro e planejamento financeiro. O grupo também editou uma cartilha com dicas e recomendações para o público-alvo sênior e está realizando pesquisa sobre risco, bem-estar financeiro e tomada de decisão entre investidores, especialmente idosos.
O relatório “Vulnerabilidade do Investidor Sênior” de março de 2018, pode ser acessado aqui.