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Quais são as decisões mais difíceis enfrentadas por day traders?
Comumente, pesquisas de economia comportamental sobre tomada de decisão são feitas baseadas na descrição dos cenários de risco. Nessa abordagem, as probabilidades de perdas e ganhos e os resultados possíveis de uma determinada tarefa são apresentadas para o indivíduo. No Penso, Logo Invisto, já divulgamos pesquisas que usam essa abordagem, como essa .
Claire McAndrew e Julie Gorey, pesquisadoras inglesas, fizeram algumas críticas a essa abordagem. A primeira é que este delineamento não reproduz o mundo real, onde as pessoas não têm acesso ao detalhamento dos riscos de suas decisões. Elas também apontam que esse método foca em uma forma que seria a ideal de como as pessoas deveriam tomar decisões, apontando os desvios ou erros que se distanciam disso.
As autoras propõem outra abordagem para pesquisar o processo de tomada de decisão, umaque seja baseada na experiência . Ela se baseia na avaliação do participante sobre a tarefa proposta, dos possíveis feedbacks que ela fornece e na ponderação do participante acerca dos possíveis resultados. Dessa forma, as autoras pretendem compreender qual é o papel das pistas dadas pelo contexto e do conhecimento prévio das pessoas na tomada de decisão. A teoria usada por elas foi a naturalistic decision making (tomada de decisão naturalista, em tradução livre), que estuda as decisões a partir de problemas do mundo real, considerando as incertezas, o dinamismo, prazos, múltiplos atores e outros fatores que interferem na tomada de decisão. A ênfase é em duas habilidades do tomador de decisão: (i) o reconhecimento de padrões familiares em situações desconhecidas; e (ii) a habilidade de notar e extrair dicas de situações novas a partir de experiências anteriores.
No artigo que discutiremos neste post, as autoras utilizam este referencial teórico para compreender a tomada de decisão de day traders . Elas procuraram entender quais são as escolhas mais exigentes cognitivamente desses investidores, buscando mapear quais processos tornam essas decisões mais complexas.
Segundo as pesquisadoras, os day traders gastam muita energia gerando hipóteses sobre as situações com as quais se deparam, desenvolvendo opções de resposta apropriadas e reconhecendo se estão em uma situação que permite escolher entre mais de uma resposta. A prática do trade vai sendo moldada a partir de experiências de ganhos e perdas, das respostas emocionais a essas últimas e do desenvolvimento de crenças sobre o mercado baseadas no efeito das decisões tomadas. A aversão ou apetite ao risco, assim, é um dos fatores que somado a esses culmina no comportamento financeiro dos investidores.
Para realizar a pesquisa, foram feitas entrevistas qualitativas com 8 day traders , homens, com uma média de idade de 34 anos. Todos eles trabalhavam profissionalmente como traders em bancos, corretoras ou empresas de energia. Em média, tinham experiência de 10 anos no mercado financeiro e 5 no cargo atual.
O método usado chama-se ACTA ( Applied Cognitive Task Analysis , ou análise de tarefas cognitivas aplicadas, em tradução livre). Esse método de entrevista pretende identificar os elementos cognitivos chave requeridos para performar uma tarefa de forma eficiente.
A entrevista tinha duas fases. Na primeira, pesquisadora e entrevistado discutiam uma tarefa realizada pelos traders em seu cotidiano, e destrinchavam as etapas necessárias para executá-la. Era pedido ao entrevistado que dissesse qual dessas etapas exigia mais esforço cognitivo para ser concluída. Ambos focavam nessa tarefa, mais exigente, para passar para a segunda fase da entrevista.
Na segunda fase, eram feitas oito perguntas para o entrevistado a respeito dessa etapa. Essas perguntas visavam a aferir as habilidades requeridas por um profissional experiente para realizar tarefas de forma bem sucedida. As habilidades que cada pergunta buscou avaliar estão descritas juntamente com a pergunta.
As perguntas, em tradução livre, eram:
No artigo, as autoras apresentam um exemplo de entrevista feita, com as respostas de um dos participantes a essas etapas.
Neste post, apresentaremos a síntese dos dados coletados em todas as entrevistas. Os pesquisadores sintetizaram quais atividades foram mais frequentemente apontadas como mais exigentes pelos traders , quais eram as dificuldades e os erros mais comuns apontados por eles.
Uma terceira etapa da entrevista consistiu em investigar quais são as atitudes tomadas pelos traders diante dessas tarefas. Com esses dados em mãos, as pesquisadoras puderam avaliar a aversão ou apetite ao risco dos entrevistados. Elas observam que os investidores tem uma exposição ao risco que varia dependendo da avaliação que fazem de cada atividade, no tocante a sua probabilidade de ganhos ou perdas financeiras.
De modo geral, os investidores são mais avessos ao risco quando há probabilidade grande ou pequena de perdas grandes; ou quando há poucas chances de ter ganhos grandes. Quando há grandes probabilidades de se obter ganhos grandes, eles se arriscam mais.
Por exemplo, identificar tendências emergentes é uma tarefa que, na avaliação dos entrevistados, apresenta grandes probabilidades grandes de ganhos financeiros. Nesse caso, a análise das condutas dos participantes mostra que eles se arriscam mais. Outras tarefas, como responder a mudanças do mercado depois que a posição foi estabelecida, são avaliadas como tendo uma probabilidade pequena de haver uma grande perda financeira. Nesse caso, os traders adotam condutas mais avessas ao risco.
Assim, um mesmo investidor pode ter comportamentos de maior ou menor exposição ao risco, a depender de como ele avalia os riscos da tarefa. Essa conclusão traz novos elementos para compreender a exposição ao risco, mostrando que ela não é estável nos indivíduos. Um mesmo investidor pode adotar condutas de maior ou menor exposição ao risco, a depender de como ele interpreta os elementos que dispõe para tomar decisões financeiras.
Os dados obtidos no estudo mostram como é complexa a tomada de decisão no mercado financeiro. Os profissionais participantes, experientes no mercado, apontam que é um processo exigente cognitivamente saber ler o contexto, antecipar o futuro e organizar sua ação diante disso. Muitos dos desafios apontadas por eles advêm da dificuldade em ler uma situação nova a partir de seu repertório e de padrões anteriores, dificultando a previsão de cenários futuros. Por isso, é necessário ter cautela e conhecimento ao realizar investimentos, desconfiando se as decisões não estão sendo influenciadas por vieses comportamentais.
E, além de apontar quais são os pontos nodais do comportamento do investidor, a metodologia do estudo pode fornecer orientações produtivas para avaliar a tomada de decisão e resolução de problemas dos investidores.
Referência
McAndrew, Claire; Gore, Julie. Understanding Preferences in Experience-Based Choice: A Study of Cognition in the “Wild”. Journal of Cognitive Engineering and Decision Making, v. 7, n. 2, 179 – 197, 2013.