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Poupança na pandemia: um hábito que vai perdurar?
Recentemente, foi publicado o Guia de Economia Comportamental (The Behavioral Economics Guide) 2021, que trouxe inúmeros artigos e reflexões sobre temas ligados ao assunto. Um dos temas tratados nessa edição do guia foi a mudança de hábitos financeiros pelos consumidores durante a pandemia (poupança, uso de dinheiro e online-banking). Um dos artigos questionou se alguns “novos hábitos” relacionados ao uso desses três comportamentos financeiros iriam perdurar no mundo pós pandemia.
Especificamente no que tange ao hábito de poupança, dados coletados pelo Banco Central Europeu nos cinco maiores países da Europa em PIB (Alemanha, França, Itália, Espanha e Holanda) demonstraram que o nível de poupança dobrou nesses países com a pandemia: a popança média permaneceu estável em 12% da renda líquida, entre 2018 e 2020, mas pulou para 25% em 2020.
É verdade que no último quadrimestre de 2020, quando diminuíram as restrições impostas pela pandemia, o percentual de poupança caiu, mas ainda assim continuou mais elevado do que antes, conforme se depreende do gráfico a seguir:
Insta ressaltar que o percentual de poupança aumentou entre aqueles que tinham renda certa (empregados e aposentados). Já em relação aos autônomos e desempregados, foi notada uma queda da capacidade de poupança, pois claramente essa parcela da população foi mais afetada pelo lockdown.
Segundo os pesquisadores, os 2 maiores fatores que impulsionaram o hábito de poupar foram:
a) poupança involuntária – que se deveu majoritariamente ao lockdown, pois os consumidores tiveram menos oportunidades de gastar; e
b) cenário incerto – que fomentou uma atitude mais precavida e conservadora por parte dos consumidores.
A pergunta que se faz é: esse novo patamar de poupança veio para ficar?
Para tentar prever o futuro desse hábito, os pesquisadores usaram como premissa 2 fatores: hábitos e compras por impulso.
Em geral, decisões de poupança são vistas como deliberadas, como por exemplo, decidir poupar para comprar um carro. Todavia, existem decisões em menor escala que estão mais relacionadas a hábitos do que a deliberações racionais, como, por exemplo, apagar as luzes quando não se está usando o ambiente. É a formação do hábito de poupar que fará com que o ato de poupar perdure no longo prazo.
O que aconteceu na pandemia, no entanto, tem mais relação com à impossibilidade de compra, devido às restrições de circulação, e com atos de precaução dos consumidores, dada a incerteza do momento, do que de fato à construção do hábito de poupar. Poupar em tempos incertos é uma tendência já vista em outras ocasiões, uma vez que as pessoas tendem a ser mais precavidas como reação a um aumento do risco.
O mesmo raciocínio se aplica às compras por impulso. É preciso levar em conta que a impulsividade está relacionada ao baixo nível de autocontrole do consumidor quando exposto a estímulos de compra. Dessa forma, a redução da impulsividade depende do treino do autocontrole. Provavelmente, a queda nas compras por impulso se deve menos ao desenvolvimento de um maior autocontrole pelos consumidores durante a pandemia – o que, de fato, seria capaz de reduzir compras por impulso no longo prazo – e mais à ausência de exposição aos estímulos de compra.
Diante disso, a expectativa dos pesquisadores é de que o nível de poupança volte a cair com a queda das restrições impostas pela pandemia, como é de se esperar com o avanço da vacinação. A poupança por precaução também tende a arrefecer, sendo que a velocidade dessa mudança vai depender da força da narrativa a respeito da reconstrução econômica e da Prova Social (viés comportamental que indica uma tendência de nos comportarmos de acordo a decisão de terceiros).
É apontado como evidência dessa conclusão o fato de que já houve queda do nível de poupança no último quadrimestre de 2020, o que coincide com o retorno de circulação de pessoas nos países pesquisados.
Por outro lado, a poupança forçada pelas restrições da pandemia pode ter introduzido novas rotinas, o que pode ser uma oportunidade para a criação de novos hábitos, como, por exemplo, formar uma reserva financeira ou comer fora com menor regularidade. Só o tempo dirá se esses novos hábitos vieram para ficar ou se o excedente de recursos será redirecionado para compras, como uma espécie de “revenge spending” – compras por vingança – sob influência do Viés do Presente, que é a tendência à gratificação imediata.
E você leitor: conseguiu poupar na pandemia? Acha que esse hábito veio pra ficar? Conte nos comentários.
Referências: