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Como lidamos com nossas emoções hora de investir? Uma visão da Abordagem Centrada na Pessoa
Segundo a visão da Psicologia Econômica, a oscilação de preços na bolsa de valores não é um fator puramente objetivo. As decisões que os investidores tomam são influenciadas por vieses comportamentais que interferem no modo como os investidores avaliam os preços de mercado e tomam decisões financeiras.
Já vimos em alguns artigos publicados neste blog que a Psicologia Econômica surge buscando explicar observações empíricas que, em princípio, contrariariam pressupostos da teoria econômica clássica – especialmente aqueles relacionados à racionalidade econômica do ser humano que, teoricamente, agiria sempre buscando a maximização de resultados, do ponto de vista financeiro.
Essa área da Psicologia afirma que a subjetividade afeta a percepção e a interpretação dos fatos e, consequentemente, as decisões. Por isso, o estudo do comportamento humano, de suas crenças, ações e sentimentos torna-se importante na hora de fazer escolhas financeiras.
Saindo um pouco da linha de trabalho usualmente explorada pela Psicologia Econômica, a psicóloga Tatiana Tomaselli escreve sobre a tomada de decisões financeiras através de uma perspectiva psicológica pouco utilizada para esse fim, a Abordagem Centrada na Pessoa, desenvolvida por Carl Rogers. A autora resume esse assunto da seguinte maneira:
É um fato que uma determinada ação sofre uma queda de 2%. Mas em relação a isso, o investidor decidirá se vende suas ações desta empresa, se compra mais, ou se não faz nada. Cada atitude que tomar terá um significado diferente para ele. Do mesmo modo, se ele tiver acabado de comprar essas ações ou acabado de vendê-las, logo antes de sua queda, interpretará o mesmo acontecimento de modos diferentes também, de acordo com sua situação.
A Abordagem Centrada na Pessoa é uma abordagem de psicoterapia (embora possa se estender a outras relações humanas) que coloca o indivíduo como alguém capaz de desenvolver suas potencialidades. Não se trata de uma teoria de tomada de decisão, mas busca compreender comportamentos e processos humanos em contextos de terapia e também fora dela.
Carl Rogers (psicólogo estadunidense nascido em 1902) descreve como acontece, segundo sua abordagem, o processo de mudança da personalidade em relação a um contexto em um processo que compreende 7 estágios. Tomaselli traça um paralelo entre estes e o comportamento do investidor, exposto a seguir.
Primeiro estágio: rigidez em relação à mudança, voltado para o passado. Neste cenário o investidor pode demonstrar crenças arraigadas em experiências anteriores. Por exemplo, se uma empresa sempre se mostrou confiável a ponto de valer a pena o investimento, mesmo que haja indícios no presente, contrários à sua crença, eles não se mostrarão relevantes para uma mudança de atitude.
Segundo estágio: experiência ainda determinada pelo passado, presença de sentimentos, mas como algo externo. O investidor que se encontra neste estágio pode perceber a influência de suas atitudes, mas elas ainda não são suficientes para mudar seu comportamento. Por exemplo, se seu investimento não teve tão bom desempenho, o investidor pode atribuir isso ao momento do mercado ou ao fato de ter sido recomendação de algum conhecido.
Terceiro estágio: a pessoa começa a se perceber em relações externas, mas não internamente. Aqui, o investidor pode perceber certo descolamento entre suas atitudes e seus comportamentos, como: planejar comprar ou vender uma ação quando ela estiver em certo valor, mas não agir quando chega o momento.
Quarto estágio: os sentimentos tornam-se mais facilmente identificáveis. O investidor consegue olhar para o passado e identificar comportamentos que o levaram a tomar determinada atitude, que só no momento presente começam a fazer sentido. Por exemplo, o investidor neste estágio rememoraria sua raiva por não ter realizado uma operação a que se propôs. Ou seja, neste estágio já existe a percepção do sentimento, mesmo que ele ainda não seja aceito.
Quinto estágio: a experiência dos sentimentos torna-se mais vívida. Pode perceber com mais clareza a influência de seus sentimentos em suas ações, mesmo que não saiba explicar o como e porquê de se sentir de tal forma. O investidor pode sentir, identificar e aceitar sua ansiedade, por exemplo, perante uma operação, mas não saber identificar suas causas. Depois, ao analisar a situação, ele pode ter uma atitude do tipo “eu sabia que devia ter reagido dessa forma!”.
Sexto estágio: os sentimentos são mais facilmente aceitos. O investidor consegue deixar suas experiências no passado e utilizá-las como aprendizado para observar de forma mais racional os acontecimentos do presente antes de agir. Pode perceber, por exemplo, que uma boa operação realizada no passado pode não se repetir e agirá de acordo com o que dispõe no momento.
Sétimo estágio: experimenta-se com vivacidade os sentimentos no presente e utiliza-se deles como referência para autoconhecimento. Neste estágio, o investidor se sente capaz de confiar em seus conhecimentos adquiridos, pois percebe melhor a influência da sua subjetividade e sua responsabilidade sobre seus atos.
“As emoções servem como um guia efetivo para o comportamento humano.”
É importante ressaltar que os estágios retratados aqui não necessariamente ocorrem de forma ordenada ou universal, podendo variar de uma pessoa para outra. Eles formam um quadro de referência para tentar explicar como, a partir de um desejo de mudança e um processo interno de reflexão, as emoções afetam nosso processo de escolha.
Essa apresentação, a partir da perspectiva da ACP, defende que não é necessário tratar os processos emocionais como “inimigos” à racionalidade, indicando que é possível relacionar-se harmonicamente com eles através de um processo mais consciente.
De outra perspectiva, mas em linha com os estudos desenvolvidos na área de Psicologia Econômica, esse enfoque da ACP defende que a conscientização dos aspectos emocionais envolvidos na tomada de decisões pode contribuir mais para sua otimização do que a simples rejeição das emoções em busca de uma racionalidade pura que, como seres dotados de subjetividade, talvez não seja possível atingirmos.
No entanto, destacamos que esta apresentação em estágios apresentada pela autora, oriunda da Abordagem Centrada na Pessoa, representa apenas uma das vertentes da Psicologia e que outras abordagens podem entender o comportamento humano de forma diferente – o que só enriquece a discussão.
E você, leitor? Consegue identificar as influências emocionais pelas quais passa ao realizar operações financeiras? Conte nos comentários!