Lei do Bem: incentivo à inovação tecnológica como forma de promover o aumento da competitividade do Brasil
Carlos Alberto Marques Teixeira, Lilian Grace Aliprandini e Gleyce L. da Costa*
Há pouco mais de 14 anos, foi promulgada a Lei n° 11.196 de novembro de 2005, conhecida como “Lei do Bem”, cujo objetivo é induzir investimentos empresariais em pesquisa e desenvolvimento (P&D) para estimular e potencializar a inovação e, consequentemente, o aumento da maturidade tecnológica nas empresas brasileiras mediante a concessão de incentivos fiscais federais.
Os benefícios previstos na lei visam motivar empresas de todos os segmentos a empreender atividades de pesquisa e desenvolvimento voltados para a inovação tecnológica, por meio da concessão de incentivos fiscais abrangentes. Os incentivos se distribuem por empresa e por projeto, tendo benefícios fiscais relevantes, a exemplo de:
. Depreciação integral de máquinas e equipamentos utilizados para pesquisa e desenvolvimento (benefício financeiro);
. Exclusão adicional de percentual dos dispêndios/despesas com atividades de P&D, do Lucro Real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL);
. Dedução dos dispêndios classificáveis como despesas operacionais;
. Redução de 50% do IPI incidente sobre máquinas e equipamentos utilizados para P&D, na sua aquisição;
. Exclusão do Lucro Real e da base de cálculo da CSLL dos dispêndios/despesas com atividades de pesquisa e desenvolvimento a ser executado por ICT’s (excludente dos demais benefícios)
. Alíquota de 0% do IRRF incidente sobre remessas ao exterior para registro e manutenção de marcas, patentes e cultivares.
Um dos pontos de maior destaque da Lei do Bem é a possibilidade de aplicação automática dos incentivos de natureza fiscal, significativamente diferente dos mecanismos anteriores, os quais dependiam de aprovação prévia do MCTIC. Devido à sistemática introduzida pela Lei do Bem, as empresas selecionam os projetos e contabilizam os seus investimentos (despesas) em uma conta contábil específica. A etapa seguinte consiste em enviar um formulário anual para o MCTIC, contendo as informações técnicas quanto à execução dos projetos, para que o Ministério se pronuncie, avaliando se recomenda ou não os projetos submetidos, reafirmando seu conteúdo inovador (conforme evidências de P&D) e, posteriormente, remete essas informações para a Receita Federal (para eventual auditoria).
Com efeito, os resultados apresentados desde o primeiro ano de implementação da Lei são muito positivos, tanto em termos de empresas que passaram a adequar seus projetos prevendo etapas bem delineadas de pesquisa básica (PB), pesquisa aplicada (PA) e desenvolvimento experimental (DE), até o impacto das externalidades positivas, como, por exemplo, o aumento na contratação de pesquisadores e a inserção de produtos/serviços e processos novos no mercado.
Acerca de sua utilização, a tabela acima apresenta informações tornadas públicas em uma recente apresentação feita pelo MCTIC em evento realizado em Brasília, com dados extraídos do formulário para informações sobre as atividades de pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica nas empresas (FormP&D/MCTIC – Lei do Bem), traz um balanço da aplicação da lei entre os anos 2011 a 2018. Estes dados informam que 1.850 empresas enviaram um total de 10.931 projetos de PD&I referentes ao ano base de 2017.
É importante frisar que, segundo relato do MCTIC, no lançamento do novo Guia Prático para a Lei do Bem, temos, ao todo, cerca de 150 mil empresas com possibilidade de usufruir dessa política pública em prol da obtenção do benefício, mas, como mostrado, pouco mais de 2% delas se utilizam.
Ainda no mesmo evento foi destacado que para cada 1 real de renúncia fiscal são investidos 4,5 reais em P&D voltado a Inovação pelas empresas.
Segundo dados apresentados por meio de estudo promovido pelo CGEE/MCTIC, em 2018, foi possível identificar que ao longo dos anos de existência dos benefícios, a indústria de transformação lidera a utilização da Lei do Bem, conforme quadro seguinte:
Abrangência setorial:
O último Relatório Anual publicado pelo MCTIC, abordando o resultado da avaliação dos projetos apresentados pelas empresas referentes ao ano base 2014, deixa claro que existem muitas incompreensões quanto ao entendimento da qualificação de projetos de P, D&I.
Fonte: http://www.mct.gov.br/upd_blob/0240/240358.pdf.
Como é possível observar no quadro acima, o número de empresas que não conseguem apresentar evidências de que seus projetos compreendem etapas qualificáveis como pesquisa básica, aplicada e desenvolvimento experimental cresce na medida que o número de empresas participantes aumenta. Há que se destacar que o objetivo da política pública é incrementar o investimento privado em P&D e não em inovação propriamente dita, sendo essa a consequência desejável da sua aplicação.
No sentido mais amplo, entende-se que a associação público-privada determinada pela lei, embute o compartilhamento do Risco Tecnológico pelo Governo Federal com as empresas, de modo a encorajá-las e estimulá-las a realizar os investimentos vitais, que são para ampliar a competitividade e produtividade da economia brasileira.
Aliás, vale ressaltar que esse entendimento é corroborado pelo MCTIC, que afirma em seu relatório publicado em 2014 “[...] não é a inovação em si que é objeto dos benefícios fiscais previstos na citada Lei e sim a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico (pesquisa básica dirigida, pesquisa aplicada e desenvolvimento experimental), ou seja, atividades que buscam adquirir novos conhecimentos e onde ocorrem os riscos tecnológicos [...]”
Fonte: MCTIC REL. 2014
O INT, por sua vez, desde 2008, vem sendo demandado por empresas em dois sentidos: (a) apoiar empresas na identificação prévia dos pré-requisitos de sua qualificação quanto a atender as caracteristicas de classificação de projetos; e (b) apoiar empresas na reavaliação de projetos submetidos ao MCTIC que tenham sido classificados, em seus aspectos técnicos, como não recomendados para utilização da Lei do Bem.
Por meio de um Grupo de Estudos criado em 2007, o Instituto desenvolveu uma metodologia própria de caráter tecnológico e investigativo, de natureza pericial in loco e documental, baseado nos preceitos formais e técnicos, referenciados bibliograficamente nas publicações da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que orientam a classificação de projetos, identificando detalhadamente as etapas de P&D.
Desta forma, o INT vem se manifestando ao longo do tempo na reavaliação dos projetos, tendo como base o amparo legal à consulta e o seu pronunciamento no que dispõe seu Regimento Interno, que atribui ao INT a função de órgão pericial independente, como observado na transcrição abaixo.
“Art. 4º - O INT tem por finalidade promover e executar pesquisas, desenvolver e transferir ao setor produtivo tecnologias e produtos, bem como prestar serviços técnicos especializados e capacitar recursos humanos, com ênfase na inovação, competindo-lhe em especial:
I - executar atividades, programas e projetos de pesquisa e desenvolvimento;
.....................................................................
.....................................................................
VI - exercer a função de órgão pericial técnico independente, na sua área de competência; (grifo nosso)
Desde 2008 foram avaliados pelo Instituto mais de 850 projetos de distintas empresas e segmentos produtivos, os quais evidenciaram, no processo de reavaliação, a identificação de etapas de P&D efetivamente empreendidas em aproximadamente 70% dos projetos. Essa avaliação envolve tanto atividades de P&D, quanto as demais, não qualificadas como projetos de P&D, por serem de engenharia ou de expansão industrial, com baixo ou nenhum risco tecnológico, não sendo possível seu enquadramento.
No portfólio de serviços voltados para a Lei do Bem, o Instituto conta com três produtos específicos: (i) Parecer técnico, (ii) Relatório de Diagnóstico Técnico Prévio e (iii) Relatório de Diagnóstico Posterior.
Vale ressaltar que muitas empresas usuárias desse serviço ampliam seus conhecimentos diante do relacionamento estabelecido com o INT. Isto denota a importância de sua atuação enquanto institutição pública federal de pesquisa tecnológica, com extensa tradição nessa atividade, pela disseminação da politica pública, não raro, sendo requisitada a realizar apresentações formais, sejam de capacitação ou informativas, para empresas, na busca de conhecimento e compreensão da aplicação do marco regulatório. É fato que há evidente melhora dentre as empresas atendidas na qualificação de seus projetos nesse diapasão, alé de atenuação da insegurança jurídica reinante nas empresas.
Por fim, destacamos que essa linha de atividade no INT é continua e encontra-se em expansão de demanda, estando à disposição das empresas e organizações para apoiar na qualificação de projetos. Em linha com tudo isso percebe-se a maior motivação das empresas em buscarem ampliar seus investimentos em P&D, o que sem duvida é alvissareiro e de grande relevância para tornar nossos setores produtivos mais competitivos. Destaca-se ainda a possibilidade de cumulatividade com outros mecanismos de grande calibre disponíveis, como a EMBRAPII.
*Autores:
Carlos Alberto Marques Teixeira
Coordenador-Geral Regional do INT. É engenheiro mecânico, com mestrado em Economia e Gestão Empresarial e especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho. Palestrante em diversos fóruns sobre a aplicação do Marco Legal Regulatório da Inovação e a Lei do Bem. Coordenador de atividades executivas relacionadas a estudos para empresas sobre o conteúdo inovativo de projetos de P&D.
Lilian Grace Aliprandini
Diretora de Inovação da empresa Acceta Especialistas em P&D, realiza consultoria em Lei do Bem e gestão de projetos de P&D. É engenheira agronômica, com MBA em Comunicação e curso técnico de Saneamento Industrial. Experiência na identificação de etapas de pesquisa básica dirigida, aplicada e desenvolvimento experimental em projetos de inovação tecnológica de produtos, processos e serviços.
Gleyce L. da Costa
Consultora e assessora jurídica, colaboradora da Coordenação-Geral Regional do INT. Graduada em Direito, com mestrado em Inovação, Propriedade Intelectual e Desenvolvimento e pós-graduação em Direito Administrativo Empresarial. Experiência em contratos de transferência de tecnologia e na avaliação de projetos/elaboração de pareceres técnicos indicando as fases de P&D para orientar o uso dos benefícios fiscais previstos na Lei do Bem.