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Debate mostra desafios da propriedade intelectual frente mudanças trazidas pela pandemia
A aceleração do processo de digitalização trazida pela pandemia trouxe novas perspectivas e desafios com o aumento do comércio eletrônico e a pressão pela inovação em áreas estratégicas como vacinas para combate ao coronavírus. É nesse contexto que ocorreram os debates do 4º Seminário de Propriedade Intelectual, realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) no dia 29 de outubro, com apoio do INPI e do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), e correalizado pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI).
Na abertura, o coordenador-geral de Disseminação para Inovação do INPI, Felipe Melo, ressaltou que há um crescimento da percepção da sociedade sobre a propriedade intelectual como instrumento de desenvolvimento social e econômico. Ele informou que está em andamento a construção da Estratégia Nacional para a Propriedade Intelectual.
Segundo o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Abijaodi, são muitas as questões que ainda precisam ser discutidas para se promover a melhoria do sistema de propriedade intelectual frente aos novos desafios.
O diretor regional da OMPI, José Graça Aranha, apontou a modernização do sistema de propriedade intelectual no Brasil, com destaque para a adesão ao Protocolo de Madri, que permite ao país integrar o sistema internacional de registro de marcas, e o Programa de Combate ao Backlog de Patentes, que pretende reduzir em 80% o estoque de patentes sobre análise do INPI até 2021.
Amadurecimento do sistema
Na palestra magna, o ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseverino disse que, apesar de o Brasil ter sido um país de vanguarda no Direito de Propriedade Intelectual – a primeira lei sobre o assunto é de 1830 –, o número de litígios sempre foi pouco significativo. No entanto, nos últimos dez anos, a situação se inverteu com aumento de mais de sete vezes de processos relacionados à propriedade intelectual no STJ. Segundo ele, isso é positivo porque mostra um amadurecimento do próprio sistema e mais conhecimento da população. O desafio do Poder Judiciário agora é se familiarizar com casos pouco comuns decorrentes dessas transformações.
Entre as principais preocupações do setor industrial no momento, é com o crescimento da pirataria no comércio eletrônico, como comentou o gerente-executivo de Política Industrial da CNI, João Emílio Gonçalves, que moderou o primeiro painel, sobre comércio ilegal.
A secretária nacional do Consumidor, Juliana Domingues, comentou que o Guia de Boas Práticas no Comércio Eletrônico, lançado em abril pelo Conselho Nacional de Combate à Pirataria, tem um papel importante na questão.
Especialização do Judiciário
No segundo painel, mediado pelo ministro do STJ Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, o destaque das discussões foi o recente lançamento do Wipo Lex Judgments, banco de dados da OMPI que reúne decisões judiciais de diversos países. Atualmente dez nações integram a plataforma, entre elas o Brasil, e outras 30 manifestaram interesse. Ela aceita até cem sentenças por país, é gratuita e disponibiliza um tradutor automático.
Segundo Eun Joo Min, diretora do Instituto Judicial da OMPI, apesar de ter sido criada a partir de pedidos de juízes da América Latina, a ferramenta beneficia tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento. "As tecnologias evoluem rapidamente e o esforço legislativo nem sempre consegue acompanhar”, afirmou.
Ela destacou ainda a forte colaboração com o Ministério das Relações Exteriores para a entrada do Brasil no Wipo Lex Judgments. Dentro desse esforço inicial, o País incluiu na base de dados 36 sentenças judiciais, a maioria em direito autoral, segundo informou Heitor Figueiredo Sobral Torres, da Divisão de PI do Itamaraty. Os magistrados que queiram incorporar sentenças devem procurar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que está à frente do acordo.
Para o desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), o modelo deu certo. Tanto que se verificou um aumento das demandas judiciais na área de propriedade intelectual, seja em número, seja em complexidade. “Há uma dificuldade de conjugar nossa formação jurídica com questões tão técnicas como as da propriedade industrial, sobretudo em relação aos julgamentos de patentes e de desenhos industriais. Mesmo em marcas, vemos que discussões como trade dress trazem aspectos de direito e de fato extremamente técnicos”, analisou.
Liliane Roriz, sócia do escritório de advocacia Licks Attorneys, tratou da “guerra de liminares” decorrente dos dois caminhos existentes para as ações de propriedade industrial – a Justiça Estadual recebe casos de infração a direitos de PI e a Justiça Federal, ações de nulidade desses direitos.
Propriedade Intelectual e Negócios
O terceiro painel foi dedicado à discussão sobre a relação entre a Propriedade Intelectual e os negócios, incluindo as políticas públicas que contemplam esta temática. Em sua apresentação, o coordenador-geral de Disseminação para a Inovação do INPI, Felipe Melo, destacou a relevância do programa INPI Negócios na estratégia atual do Instituto. Segundo ele, o objetivo deste programa é estimular a geração de ativos de Propriedade Intelectual no País e sua utilização como diferencial competitivo, inclusive por micro e pequenas empresas, bem como startups. "O programa INPI Negócios sintetiza um novo modo de atuação do INPI em escala nacional", afirmou Melo.
Veja a reportagem completa sobre as ações do INPI Negócios abordadas no terceiro painel.
Neste contexto, o coordenador-geral do INPI destacou a importância de parcerias estratégicas, incluindo o Sistema S, a Apex-Brasil (com foco na internacionalização de empresas nacionais) e a Embrapii. Melo também ressaltou que as atividades realizadas já apresentam resultados: no caso da carteira de empresas que atuam nas unidades Embrapii, já houve aumento de 15% no volume de ativos de PI gerados.
Encomendas tecnológicas
Bruno Portela, secretário especial adjunto de Emprego, Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia, mostrou as ações do governo para viabilizar a compra, de maneira ágil, de uma futura vacina para a Covid-19. A saída encontrada foi estabelecer um contrato de encomenda tecnológica entre a Universidade de Oxford, a farmacêutica Astrazeneca e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Trata-se de uma compra pública do desenvolvimento da tecnologia, que assume os riscos envolvidos e determina a transferência de tecnologia para a instituição brasileira no final. “Não compramos vacinas, compramos esforço de P&D (pesquisa e desenvolvimento). Isso que é encomenda tecnológica”, explicou Portela.
Segundo o secretário, o Brasil pagará US$ 3,50 por dose da vacina, o menor valor no mundo. A previsão é que 15 milhões de doses sejam fabricadas em dezembro deste ano e mais 15 milhões em janeiro de 2021, que serão distribuídas após a aprovação do registro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Desafios com as novas tecnologias
Como em todas as áreas, as novas tecnologias estão mexendo com as estruturas do sistema de propriedade intelectual. Fabiano Barreto, especialista em Política e Indústria da CNI, que moderou o último painel, afirmou que a instituição está produzindo um estudo sobre os desafios que novas tecnologias impõem sobre a propriedade intelectual, como a discussão sobre a quem pertencem as invenções geradas por inteligência artificial.
De acordo com Daly Alica, representante da OMPI, o sistema de propriedade intelectual sempre teve de se ajustar a novas tecnologias e a tendências, como bioteconologia há alguns anos.
Entre as polêmicas trazidas pelo novo cenário está a questão dos dados pessoais como passíveis de proteção. Segundo Rodrigo Leme, da Adobe, eos dados poderão, por exemplo, ser protegidos com código, assim como no modelo de bitcoin, que trabalha com a chamada escassez digital, em que não existe pirataria.
*Com informações da CNI.