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Desafios científicos e tecnológicos para a chegada do homem à Lua
Poetas, seresteiros, namorados, correi! É chegada a hora de escrever e cantar, talvez as derradeiras noites de luar
Com os primeiros versos da letra de Lunik 9, de 1967, Gilberto Gil alertava aos incautos que estava chegando ao fim o tempo de contemplação romântica dos céus. Fazia pouco mais de um ano que os soviéticos haviam tocado o solo da Lua, alcançando aquilo que até então era reservado à poesia, filosofia e literatura. O encantamento com o espaço dava lugar à pesquisa e à engenharia.
O maior marco da exploração espacial é, sem dúvida, a chegada do ser humano ao nosso satélite natural, ocorrida em 20 de julho de 1969. Inúmeros são os livros, filmes, documentários que tratam dessa histórica viagem, mas muito pouco se fala sobre as dezenas de missões, sejam elas robóticas ou tripuladas, que precederam e pavimentaram o caminho para aquele “pequeno passo para um homem”.
Foram diversos programas, sejam da NASA ou de seus concorrentes do Programa Espacial Soviético, como os Sputnik, Mercury, Pioneer, Explorer, Luna (ou Lunik), Ranger, Mariner e Surveyor que, com suas dezenas de missões – algumas bem-sucedidas, outras não – contribuíram direta ou indiretamente para o avanço do conhecimento científico e para o desenvolvimento da tecnologia necessária para garantir o cumprimento do objetivo então estabelecido: o de levar homens à Lua e trazê-los de volta em segurança.
A seguir, trazemos um pequeno resumo dos principais fatos nesse curto e, como se verá, muito intenso período de nossa história.
Desde o final da Segunda Guerra Mundial, tanto os EUA como a União Soviética vinham desenvolvendo tecnologia de foguetes, baseados nos espólios que ambos os países obtiveram dos mísseis alemães V-2, que tanto terror trouxeram nos bombardeios a Londres.
A vertente civil desse esforço visava utilizar tais foguetes para levar a humanidade para fora de nosso planeta, efetivamente iniciando a exploração espacial, que até então era um tema quase que exclusivo da ficção científica. Buscando mostrar ao mundo qual lado era superior – e consequentemente aumentar sua esfera de influência entre as demais nações –, as então “superpotências” iniciaram aquilo que ficou conhecido como a Corrida Espacial.
Os soviéticos largaram na frente, com o lançamento do primeiro satélite artificial, o Sputnik-1, em 04 de outubro de 1957. Logo a seguir, o Sputnik-2 colocava em órbita o primeiro ser vivo, a cachorra Laika. No período de apenas um mês, se havia demonstrado as tecnologias necessárias não só para sair de nosso planeta e orbitá-lo, mas também para manter vivo um passageiro durante essa viagem!
Em resposta a isso, os norte-americanos lançaram seu primeiro satélite, o Explorer-1, em 31 de janeiro de 1958. Por alguns anos, esse padrão se repetiu: os soviéticos alcançavam um grande feito na área espacial, e os norte-americanos tentavam igualá-lo, por vezes conseguindo apenas alguns meses, ou mesmo semanas, após seus concorrentes
Foi assim com o primeiro homem levado ao espaço (Yuri Gagarin, em abril de 1961), a primeira mulher (Valentina Tereshkova, junho de 1963), o primeiro equipamento a se aproximar da Lua (a sonda Luna 1, em janeiro de 1959), o primeiro a alcançar nosso satélite (Luna 2, que se chocou com o solo lunar em setembro de 1959), o primeiro a enviar fotos do lado oculto (Luna 3, outubro do mesmo ano) e o primeiro a pousar suavemente (a já citada Luna/Lunik 9, em fevereiro de 1966).
Uma curiosidade é que esse período também marca a entrada do Brasil na pesquisa e desenvolvimento tecnológico para o espaço: imediatamente após retornar de seu feito histórico, Gagarin foi levado pelo governo soviético em uma espécie de turnê mundial, visitando diversos países e recebendo inúmeras homenagens. Em maio de 1961 esteve em nosso país, recebendo do então presidente Jânio Quadros a Ordem do Cruzeiro do Sul, a maior condecoração brasileira. Em julho daquele mesmo ano, certamente ainda impressionado pela realização soviética, Quadros assinou o decreto para a criação do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE), que mais tarde daria origem ao INPE.
Enquanto o Brasil dava seus primeiros passos rumo ao espaço, as diversas missões das superpotências traziam informações importantíssimas para as vindouras missões tripuladas, na forma de registros fotográficos e de sensores diversos, como os magnéticos, de radiação e de temperatura. Por exemplo, à época não se tinha a certeza se a superfície da Lua seria sólida o suficiente para permitir um pouso de equipamento pesado, sem que o mesmo afundasse na poeira lunar.
Inúmeras eram as tecnologias criadas para o cumprimento das missões, como as de circuitos eletrônicos resistentes à radiação, diferentes formas de controle térmico, técnicas para apontamento no espaço livre, captação de energia por meio de painéis solares, metodologias de tolerância a falhas de equipamentos, a lista poderia continuar por algumas páginas.
Os norte-americanos alcançaram a Lua em julho 1964 com a sonda de impacto Ranger 7, cinco anos após os soviéticos. Eles estavam perdendo feio a corrida.
O ponto de virada para a NASA veio apenas com a missão Apollo 8, em dezembro de 1968, quando uma missão tripulada foi capaz de orbitar a Lua pela primeira vez. Imaginem a enormidade desse feito: faziam menos de quatro anos desde que os EUA haviam conseguido fazer um de seus foguetes chegar à Lua – e se espatifar nela -, e agora estavam levando três homens para orbitá-la e os trazendo de volta!
Nas missões seguintes, a Apollo 9 (março de 1969) e 10 (maio do mesmo ano), a NASA foi progressivamente avançando nos testes e validação das etapas do que que seria a missão final: a Apollo 9 qualificou o módulo lunar, que desceria à superfície, inclusive com a realização de manobras de acoplagem das diferentes configurações necessárias ao pouso e retorno da Lua, enquanto que a Apollo 10 realizou uma descida a até 15 km de distância da superfície lunar, retornando e novamente se acoplando ao módulo de comando e serviço.
Em julho foi a vez da Apollo 11, e com ela a humanidade, finalmente colocar os pés em nosso satélite. A cadência das missões, uma sendo lançada quase que assim que a anterior retornava – a contar da Apollo 9, foram três missões tripuladas em quatro meses! – mostra que o termo “Corrida Espacial” não foi cunhado à toa.
omo se vê, os famosos primeiros passos de Neil Armstrong foram, na verdade, precedidos de incontáveis outros, dados por inúmeros cientistas, engenheiros, técnicos, astronautas e muitos outros profissionais que contribuíram para o desenvolvimento da ciência, das técnicas e da tecnologia necessárias para “pousar um homem na Lua e trazê-lo de volta”, conforme havia sido determinado, apenas sete anos antes, pelo presidente John F. Kennedy.
Os soviéticos, que sempre tiveram uma abordagem mais cautelosa com seus cosmonautas, seguiram desenvolvendo missões lunares robóticas, com seu programa de jipes telecontrolados Lunokhod. Ao se verem vencidos na corrida à Lua, optaram por mudar o foco de seu programa e investir em outro aspecto da exploração espacial: a permanência do ser humano no espaço. Fizeram isso primeiramente por cápsulas pressurizadas, que cresceram gradativamente até se tornarem complexas estações espaciais.
Os norte-americanos, claro, não ficaram para trás, e também investiram no tema. Com o passar dos anos, entretanto, a disputa deu lugar à cooperação, e o principal resultado disso é a Estação Espacial Internacional, um projeto multilateral liderado conjuntamente por EUA e Rússia
Com o passar dos anos, as missões tripuladas à Lua perderam apoio popular – a Corrida Espacial estava vencida, afinal – e, por serem muito custosas, foram descontinuadas após a Apollo 17, de dezembro de 1972. Desde então não voltamos a visitar nosso satélite em missões tripuladas.
A partir da década de 1990, Japão, China, Índia e União Europeia também começaram a lançar missões lunares. A Índia contou com apoio do INPE no rastreio de suas missões Chandrayaan-1 e 2.
Atualmente os EUA estão liderando um novo esforço, com parcerias internacionais, para o retorno à Lua no programa Artemis (irmã gêmea de Apollo, na mitologia grega). A previsão é que tenhamos novas pegadas humanas em solo lunar muito em breve, em 2025. A China tem planos de fazer o mesmo, tendo como meta a década de 2030.
Mas a incomparável fase inicial de pioneirismo no desenvolvimento de tecnologia espacial na segunda metade do século passado é o que permitiu a criação das inúmeras aplicações do espaço presentes em nosso cotidiano, como a telecomunicação por satélites, sistemas de posicionamento global como o GPS, sensoriamento remoto e tantas outras, além de avanços científicos impressionantes, como a instalação de telescópios fora de nossa atmosfera, permitindo-nos enxergar o universo além do que seria possível em nosso planeta.
Muitas outras tecnologias desenvolvidas para a exploração espacial foram incorporadas ao nosso dia-a-dia, como filtros de água mais eficientes, sensores para câmeras miniaturizadas (como a do seu smartphone), termômetros infravermelhos, mantas térmicas usadas por socorristas no atendimento a acidentados, sistemas de monitoramento hospitalar, além de diversos novos tipos de materiais, entre eles cerâmicos e polímeros sintéticos, presentes em inúmeros produtos.
Na atualidade, a atividade espacial se configura em uma importante infraestrutura para o desenvolvimento e crescimento de um país. Como instituição pioneira no Brasil em diversas áreas de conhecimento associadas ao espaço, o INPE busca o contínuo avanço em ciência e tecnologia, o qual se converte em autonomia e benefícios para a sociedade brasileira.
Créditos: Coordenação-Geral de Engenharia, Tecnologia e Ciência Espaciais (CGCE).
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