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Meio Ambiente
RS tem primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural em um lote da reforma agrária
Este Dia Mundial do Meio Ambiente foi marcado pela oficialização da primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) em um lote da reforma agrária no Rio Grande do Sul. A portaria criando a unidade de conservação foi publicada, em 5 de junho, no Diário Oficial da União. Com 6,95 hectares, o perímetro localizado no assentamento Itapuí/Meridional, em Nova Santa Rita, compõe um sistema familiar ancorado na agricultura regenerativa e na educação ambiental.
A nova reserva pertence ao casal Azilda Ristow e Olímpio Wodzik, que chegou ao local em 1988 e ficou alojado na sede da antiga fazenda. “Era tudo campo limpo”, recorda o marido. Ao invés de adotar insumos comerciais, eles acolheram a biodiversidade em seu cotidiano e estimularam a mata como aliada agrícola. Assim surgiram as bases para projetos ambientais e para a RPPN batizada como Sonho Camponês.
“É o que vai ficar, muitas pessoas vão usufruir”, justifica Wodzik. Ele dedica a conquista a “todos que fizeram parte direta ou indiretamente (da formalização da RPPN) acreditando na reforma agrária, na preservação e na agricultura orgânica. É importante plantar árvores, mas também é importante garantir que sejam preservadas”, defende.
O superintendente regional do Incra, Nelson Grasselli, destaca o caráter de interesse público e perpetuidade deste tipo de unidade de conservação. Segundo o dirigente, a decisão de implantar a RPPN reflete mais uma contribuição dos assentados para o futuro do planeta. A iniciativa estaria profundamente conectada a outras bandeiras da reforma agrária como produção de alimentos e luta por equidade social.
O registro da Sonho Camponês iniciou em 2019 e precisou de anuência do Incra, embora um ano depois os assentados tenham recebido o Título de Domínio (TD) da terra - atrelado a uma série de condicionantes. Conforme o coordenador do Núcleo de Gestão Ambiental da autarquia no estado, Paulo Heerdt Júnior, este foi o primeiro caso de RPPN criada a partir da figura jurídica de assentamento acompanhado pelo instituto no Rio Grande do Sul, e um dos primeiros no país.
“Por se tratar de um lote em processo de titulação, parcialmente transferido ao beneficiário, a unidade de conservação vai competir (com outros imóveis) em igualdade de condições - ressalvadas diferenças de dimensões e de esfera governamental - no sentido de pleitear políticas públicas e capitalizar recursos”, relata o engenheiro agrônomo. Ele considera que a experiência do Itapuí/Meridional pode tornar-se modelo para outras parcelas tituladas pelo Incra. "Sabemos isso não vai ser em escala, mas tende a se multiplicar”, prevê.
Para o profissional, a homologação da RPPN exprime um modo diferente de produzir alimentos, viver e relacionar-se com o ecossistema. Desta forma, fortalece a agrobiodiversidade, se afastando da monocultura e dos fortes impactos ambientais.
Regeneração
Uma das primeiras medidas de Azilda e Olímpio após serem assentados, foi destinar parte do lote de 14 hectares à recomposição florestal. Logo apareceram exemplares de grandiúva, um arbusto de madeira pouco apreciada, que “não queima no fogão, mas dá frutos que os passarinhos vêm comer e trazem outras sementes”, explica o proprietário. Assim, a pioneira abriu caminho para canfístulas, carobas, angicos e árvores frutíferas nascidas de maneira espontânea. Para o agricultor, a experiência reforçou a crença de que “nenhuma planta é ruim, todas têm sua função na natureza”.
Com o tempo, o ambiente diverso atraiu pássaros, gambás, cachorros-do-mato, gatos silvestres, tatus e furões, entre outros animais. Os bichos passaram a ser vistos com frequência pela mata, embora o local fique próximo a moradias de vizinhos assentados, o que poderia afugentar a fauna. A novidade mais recente são pegadas atribuídas a capivaras, que geram especulações, mas ainda não foram confirmadas pelos moradores.
Outras consequências do bosque revigorado foram a revitalização de uma nascente e o microclima amenizado. “A temperatura na casa é mais alta do que no mato. Em Nova Santa Rita sempre está um ou dois graus mais quente do que aqui no verão”, relata Wodzik.
O ambiente equilibrado, com solo fértil e presença de água fornece suporte à agricultura praticada na outra porção do lote. “É agroecologia”, pontua o assentado, lembrando as dimensões ecológica, econômica e social da vertente produtiva. A principal fonte de renda do casal é o morango, seguida por lavouras de mandioca, hortaliças e plantios de subsistência.
Para Wodzik, a própria trajetória comprova a viabilidade da democratização do acesso à terra alinhada à produção de alimentos e à sustentabilidade. “Mesmo usando metade da área e preservando a natureza, formei três filhos - em agronomia, medicina veterinária e engenharia mecânica”, observa. Dois deles construíram moradias no lote, totalizando dez pessoas convivendo no espaço.
Propagação
O processo de criação da RPPN Sonho Camponês também está ligado ao projeto do Centro de Educação Ambiental Camponês (Ceacamp), desenvolvido pela família de Azilda e Olímpio. Desde 2017, eles utilizam a diversidade natural do lote como ferramenta voltada à educação. Grupos de escolas, universidade e agricultores são recebidos periodicamente para conhecer a área durante visitações e palestras sobre o processo ambiental. O sistema composto por agricultura e floresta também é aberto para pesquisas científicas de diferentes vertentes.
A ideia é que a unidade de conservação de característica permanente impulsione mais projetos, agregue pessoas de diferentes gerações e inspire outras propostas focadas na proteção da natureza nos diversos ecossistemas e condições.
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