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Preservação
Reserva Legal de assentamento cearense protege sítio paleontológico
Já foram encontrados cerca de 8 mil itens em sítios paleontológicos de Itapipoca (CE), município onde fica o assentamento Taboca/Laginha. Foto: Celso Ximenes.
O sítio paleontológico Laginha, no município de Itapipoca, a 130 quilômetros de Fortaleza (CE), tem toda a extensão (cerca de 2 km²) dentro da área de reforma agrária Taboca/Laginha. Ali se encontram tanques fossilíferos repletos de verdadeiros tesouros para quem se dedica a estudar o surgimento e a evolução da vida na Terra.
Os também chamados ‘tanques de pedra’ são depressões naturais formadas na superfície de rochas cristalinas de idade pré-cambriana (desde a origem terrestre). “São estruturas geomorfológicas peculiares que, em determinadas épocas, acumulam águas da chuva em vários pontos do município. Alguns já foram escavados e tiveram resgatados seu conteúdo fossilífero, servindo hoje como cisternas naturais de águas pluviais, porém ainda há muitos outros em estado intocado”, explica o geólogo, paleontólogo e curador do Museu de Pré-história de Itapipoca (Muphi), Celso Ximenes.
Em 1961 realizou-se a primeira escavação na região de Itapipoca. Desde então, foram identificados mais de 50 tanques no território (compreendendo os sítios João Cativo, Santa Rita, Coelho, Laginha, Pedra d´água e Jirau). Alguns deles forneceram milhares de ossos e dentes fossilizados de animais da megafauna extinta (mamíferos que pesavam a partir de 44 quilos) e espécies associadas (pequenos animais), a exemplo de mastodontes; toxodonte; preguiça gigante; gliptodontes; tigres dentes-de-sabre e macrauquênia.
Segundo Ximenes, seis sítios paleontológicos estão registrados no município: João Cativo; Santa Rita; Coelho; Pedra d´água; Laginha e Jirau. O Laginha é um dos menos pesquisados até o momento e contém dezenas de tanques naturais, que variam de 10 a 20 metros de comprimento, e de 3 a 4 metros de largura. As profundidades podem chegar a 6 metros.
Em 2016, o Incra no Ceará realocou a área destinada à Reserva Legal do assentamento Taboca/Laginha a fim de englobar as formações rochosas desse tipo existentes no local e, assim, contribuir com a preservação do meio ambiente e do patrimônio geológico.
Pesquisadores elencaram duas possíveis ameaças a essa riqueza: interesses de exploração mineral, visando o mercado de rochas ornamentais e construção civil, e a retirada descontrolada de fósseis por moradores locais, buscando aumentar a capacidade de acumulação dos tanques.
O engenheiro agrônomo Odilo Luna Coelho, do Incra/CE, esclarece que, no intuito de garantir a preservação do Laginha, foi preciso realocar a Reserva Legal do assentamento. O assunto foi discutido e aprovado pelas famílias no ano de 2016.
“Uma vez no interior da área de Reserva Legal, o sítio fossilífero fica protegido pelas restrições de uso que são estabelecidas em lei, colaborando com a proteção de toda a Reserva, pois muitos assentados não respeitam tais restrições”, destaca o agrônomo.
A Reserva Legal é o espaço localizado em uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do Código Florestal (Lei n° 12.651/2012). Conforme previsto, a função é a de “assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa”.
“A gleba da Reserva Legal no Taboca/Laginha tem importância como pastagem nativa explorada de forma permanente (“solta”), e os tanques de pedra como locais de acumulação de água (cisternas a céu aberto) para consumo dos animais e lavagem de roupa”, afirma Coelho.
Para o paleontólogo Celso Ximenes, a decisão conjunta tomada no caso do Laginha foi essencial no sentido de possibilitar a continuidade das pesquisas, mantendo os tanques preservados, devido ao grande valor dos fósseis que contêm.
Comunidade
O assentamento Taboca/Laginha foi criado em 1987. São 2.538 hectares, onde, atualmente, cerca de 350 famílias plantam milho, feijão, mandioca e caju. Criam, ainda, animais de pequeno porte, como cabras, ovelhas, galinhas e capotes.
A comunidade dispõe de duas casas de farinha, de uso coletivo, construídas com recursos da associação dos moradores e voltadas à produção de farinha e goma de mandioca.
A maior parte dos residentes sabe da presença do sítio paleontológico, porque o local recebe muitos estudantes de universidades e pesquisadores interessados no tema.
Celso Ximenes lembra que quando iniciaram as pesquisas, em 2005, foram feitas reuniões junto à associação de moradores. Oito deles foram contratados para ajudar nos serviços de escavação.
De acordo com Thiago de Sousa Oliveira, filho de beneficiários da reforma agrária e atual vice-presidente da Associação dos Trabalhadores Rurais do Assentamento Taboca/Laginha, os moradores sempre acompanham os grupos de visitantes.
Na opinião de Oliveira, falta um modo mais adequado de incluir as famílias na exploração do local. “Algo que possa também trazer uma renda para elas”, comenta.
Algumas, além da agricultura e criação de pequenos animais, comercializam comidas em barracas para os banhistas que visitam o Balneário Canoa da Taboca, localizado no assentamento. “O balneário é um local muito procurado, onde o rio Tabocas passa entre as rochas, banhando as pedras. A venda das comidas contribui com mais uma oportunidade de renda para nós”, acrescenta Oliveira.
Museu
Todos os itens fossilíferos coletados nos sítios compõem uma coleção paleontológica com aproximadamente 8 mil peças. A maior parte fica no Museu de Pré-história de Itapipoca, criado em 2005, pela prefeitura do município. Outra quantidade está no Museu Nacional do Rio de Janeiro.
O curador do Muphi, Celso Ximenes, relata que apesar da instituição ter 19 anos, persistem muitas dificuldades de se implantar um programa contínuo envolvendo a comunidade do assentamento. “Além da pesquisa e da guarda dos materiais, o objetivo principal do museu é fazer a divulgação científica e levar o conhecimento para a população desses lugares. Já fazemos algumas ações esporádicas como palestras, apresentações, rodas de conversas”, cita.
E complementa: “Queremos oficializar este ano um programa permanente entre o museu, a associação e as duas escolas que existem no Taboca/Laginha. Pretendemos fazer, em julho, uma espécie de audiência pública com as instituições envolvidas, inclusive o Incra, para discutirmos o projeto do Parque Paleontológico”.
Outra iniciativa, adianta, é lançar um projeto de ensino, formação e educação patrimonial no assentamento. “Temos isso como uma dívida para com as famílias da comunidade”, ressalta.
A intenção é a de usar os fósseis como geradores de educação, turismo científico e formação profissional de guias para desenvolver a cadeia social, econômica e cultural no município.
“Quando o Parque Paleontológico estiver consolidado, precisaremos de guias treinados, uniformizados e que conheçam a região para orientar os visitantes. Já estamos conversando com o pessoal da associação do assentamento para encontrarmos uma forma de viabilizar a participação dos jovens nessas ações”, finaliza.
Na avaliação do agrônomo Odilo Luna Coelho, do Incra/CE, o sucesso da atividade poderá levar a comunidade a ter mais interesse em proteger toda a área da Reserva Legal, mantendo, assim, a regularidade ambiental do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
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