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Mais de 190 mil estudantes são atendidos em 25 anos do Pronera
O estudante Marcos Teixeira (ao centro) durante aula no curso de Agronomia, no IFMA, executado por meio do programa. Foto: Arquivo Pessoal
Em abril de 2023, o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) completa 25 anos de existência. Executado pelo Incra em parceria com instituições de ensino, governos estaduais e municipais e movimentos sociais e sindicais, a ação surgiu com a proposta de democratizar o acesso à educação pública de qualidade, nos vários níveis de ensino, para as populações do campo, da floresta e das águas.
Ao longo do tempo, 191.234 estudantes ingressaram em 531 cursos, em todos os estados brasileiros. A transformação de trajetórias de vida e a possibilidade de oferecer oportunidades a quem, dificilmente, teria outra alternativa de estudos, é um aspecto marcante da atuação do Pronera frente às mais diversas realidades encontradas nas áreas de reforma agrária.
O jovem de 26 anos, Marcos da Costa Teixeira, teve a chance de seguir a carreira acadêmica graças ao acesso ao programa. Com sete irmãos, ele é filho de moradores do assentamento Palmares II, no município Nina Rodrigues, no Maranhão, e teve sua formação básica de ensino em escolas públicas e comunitárias. “Meu plano é ingressar na docência no ensino superior no futuro, pois tenho muita simpatia pelo ramo da pesquisa”, afirmou.
A meta já está sendo perseguida com sucesso. Em 2015 ele iniciou a graduação em Agronomia pelo Instituto Federal do Maranhão (IFMA), no campus Maracanã, em São Luís (MA). Na ocasião, foi a primeira turma da área na instituição de ensino criada pelo Pronera. “Se não houvesse o programa, muito provavelmente eu não teria feito o curso porque, na época, minha família passava por uma situação financeira muito complicada e não teria condições de me manter na capital”, lembra.
Durante os estudos, participou de projeto de pesquisa sobre produtividade e qualidade da batata doce biofortificada – o que lhe rendeu um prêmio de melhor trabalho na área de produção vegetal no seminário de iniciação científica de 2019. Utilizando o conhecimento adquirido, Marcos inseriu o cultivo do tubérculo na unidade de sua família no assentamento, junto a outras culturas, para melhorar a renda.
Em 2021 concluiu a graduação e já no mesmo ano ingressou no mestrado em Agroecologia na Universidade Estadual do Maranhão (Uema), em concorrência comum. Na ocasião pesquisou sobre o enriquecimento de semente do feijão-caupi, cujos experimentos foram realizados também na área de reforma agrária e rendeu o tema da dissertação.
Recentemente, o estudante adquiriu o título de mestre e foi aprovado no doutorado no mesmo programa do mestrado, dando continuidade ao objetivo de ser professor no ensino superior. “O Pronera é uma oportunidade única para nós da zona rural que, muitas vezes, não temos perspectiva de ir além do ensino médio. Eu quis ir muito mais longe e mudou minha vida para bem melhor. Se não fosse o programa eu não estaria realizando o sonho de cursar o doutorado em Agroecologia, ainda bem jovem”, enfatiza.
Marcos tenta, sempre que possível, levar a aprendizagem alcançada no meio acadêmico para o assentamento, seja por meio das pesquisas em agricultura, quanto compartilhando as experiências de vida. “Também estou tentando instigar os nossos jovens a se arriscar mais para ter mais possibilidades de estudo. Em breve farei uma palestra na minha comunidade para falar dessas oportunidades de acesso ao nível superior, incluindo o Pronera”, anuncia.
Educação do campo
Um dos princípios político-pedagógicos do programa é a relação da educação e do desenvolvimento territorial como condição essencial para a qualificação do modo de vida dos assentados, utilizando metodologias voltadas para a especificidade do campo. Nesta direção, também atua na capacitação e na escolarização de educadores.
É o caso da professora de História, Fabiana Fátima Cherobin, advinda de um contexto de luta pela terra. Filha de agricultores familiares no Estado de Santa Catarina, desde pequena passou a questionar as dificuldades e os limites que os trabalhadores do campo encontravam para estudar. Acampada por sete anos em Abelardo Luz (SC), começou a participar de atividades educativas na escola da comunidade.
Anos depois, passou a trabalhar como técnica agrícola nas áreas de reforma agrária do município, prestando atendimento às famílias assentadas. Foi quando surgiu o convite para fazer o curso de graduação em Licenciatura em História, na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), pelo Pronera. “Foi um período de muita aprendizagem, as discussões tinham uma perspectiva de entender a materialidade e a sociedade que a gente vive e isso foi extremamente significativo e importante”, lembra.
Por ter atuação nas escolas, e pela vontade de continuar estudando, em meados de 2010 ela ingressou na Especialização em Ciências Humanas e Sociais para Escolas do Campo, realizada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), também pelo Pronera. “Fazendo a relação do conteúdo dos livros didáticos com a história das famílias dos assentamentos, pude perceber a necessidade em vincular o estudo na academia com as atividades em sala de aula”, avaliou.
Segundo Fabiana, como sem-terra e filha de pequenos agricultores, dificilmente teria tido acesso ao ensino superior. “O Pronera traz essa ligação com as lutas sociais, com a realidade material desses sujeitos do campo, historicamente excluídos do acesso à educação escolar. Se hoje a gente tem uma juventude podendo ingressar na graduação, acredito que isso também se deve ao programa”, pondera.
Histórico
O Pronera foi criado em abril de 1998, como consequência de um contexto nacional pós-massacre do Eldorado dos Carajás, ocasião em que o então governo foi pressionado a responder à sociedade sobre as demandas do povo do campo, especialmente relacionadas a acesso à terra, trabalho e educação.
Um ano após o episódio trágico, ocorrido em 1996, movimentos sociais ligados ao meio rural reivindicaram um programa de Estado voltado à área educacional, considerando a necessidade de promover o desenvolvimento social da população para além da atividade laboral.
Ainda em 1997, levando em conta os resultados do Censo da Reforma Agrária apontando um alto índice de analfabetismo entre os assentados, representantes de instituições de ensino superior reuniram-se para discutir a participação no processo educacional direcionado a esse público.
O Pronera foi instituído no ano seguinte, após grande mobilização, por meio da Portaria n° 10/1998 do então Ministério Extraordinário de Políticas Fundiárias (MEPF). Na ocasião, foi publicado o primeiro Manual de Operações, com a função de orientar a apresentação de projetos ao programa. Era vinculado ao ministério mas a execução cabia ao Incra, tendo sido incorporado ao instituto somente em 2001.
Os cursos do Pronera abrangem desde a alfabetização e escolarização de jovens e adultos no ensino fundamental e médio, passando pela formação profissional integrada, concomitante ou não com o ensino médio, além de graduação e pós-graduação.
A política pública é direcionada a jovens e adultos moradores de assentamentos criados ou reconhecidos pelo Incra, quilombolas, professores e educadores que exerçam atividades educacionais voltadas às famílias beneficiárias, além de pessoas atendidas pelo Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF).