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Comunidade quilombola paraibana comemora regularização de parte do território
As 98 famílias da comunidade quilombola Caiana dos Crioulos, em Alagoa Grande, no Agreste paraibano, a cerca de 122 quilômetros de João Pessoa, comemoraram a conquista do primeiro dos três imóveis inseridos no território, identificado e delimitado pelo Incra na Paraíba como área remanescente de quilombo. O evento para marcar a ocasião tão aguardada pelos moradores ocorreu na tarde da segunda-feira (3).
A autarquia foi imitida na posse do imóvel Sítio Sapé, com 292 hectares, na presença da secretária nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), Sandra Terena, de representantes do Incra, de lideranças quilombolas e do oficial de justiça federal Antônio Wanderlei de Araújo.
Ao som de músicas tradicionais, as famílias realizaram uma caminhada até as proximidades da casa-sede do imóvel, onde fogos de artifício anunciaram a assinatura do termo de imissão de posse. Após a solenidade, moradores de Caiana e de outras comunidades quilombolas, servidores do Incra/PB, do ministério e convidados dançaram ciranda e comeram favada (espécie de cozido elaborado com favas – leguminosas de alto valor nutritivo plantadas na região).
A presidente da associação comunitária, Edinalva Rita do Nascimento, fez um discurso emocionado e pediu para os remanescentes de quilombo baterem os pés com força na terra que agora lhes pertence. “O caminho da libertação da escravidão é comprido e este é um passo rumo à libertação. É o momento de gritar pela nossa dignidade, pelos nossos direitos. Viva Caiana dos Crioulos! Viva todos os que lutaram para estarmos aqui hoje!”, aclamou Nalva, como é conhecida.
Antropóloga do Serviço de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra/PB, Maria Ester Fortes falou sobre o longo percurso do processo de legitimação da área. “Foi uma luta coletiva, tanto do pessoal de Caiana quanto do Incra e outros parceiros, que queriam muito ver a chegada desse momento”, disse.
O superintendente do Incra/PB, Kleyber Nóbrega, destacou a parceria com o MMFDH para a conquista do primeiro imóvel inserido em Caiana dos Crioulos e falou sobre a fase que os habitantes passarão a viver. “A imissão de posse traz novos horizontes às famílias, a esperança de uma vida melhor, com mais qualidade e segurança, e, ainda, a preservação da cultura e da memória de uma das mais conhecidas comunidades tradicionais do nosso estado”, afirmou.
Conforme o superintendente, o ex-proprietário terá 30 dias para retirar os objetos pessoais da casa-sede do imóvel, mas explicou que as famílias já podem começar a plantar na área.
SNPIR
Os recursos para pagamento da indenização pelo Sítio Sapé, no montante de R$ 1,4 milhão, foram disponibilizados pela Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR) do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A destinação foi assinada pela ministra da pasta, Damares Alves no ano passado, em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.
“O nosso ministério tem dado muita importância às comunidades tradicionais. Com esse primeiro passo na conquista do território da comunidade Caiana, as famílias vão poder ter esperança de dias melhores”, salientou Sandra Terena.
Tradição
Além das culturas de subsistência, como feijão, fava, milho, mandioca, inhame e batata-doce, a criação de animais e a fruticultura predominam em Caiana dos Crioulos.
Os residentes mantêm vivas tradições e manifestações culturais herdadas de seus antepassados africanos, a exemplo dos grupos de coco de roda e de ciranda, que se apresentam em eventos artísticos e educacionais na Paraíba e em outros estados.
Segundo o RTID elaborado pelo Incra, a origem da comunidade não é clara. Alguns autores afirmam que descenderia de escravos africanos que por lá se instalaram entre os séculos XVIII e XIX, rebelados quando do desembarque de um navio negreiro aportado em Baía da Traição, no litoral norte da Paraíba. Outros entendem que teria surgido a partir da chegada, a Alagoa Grande, de sobreviventes do massacre do Quilombo dos Palmares, o que justificaria a existência da localidade denominada Zumbi, nas proximidades do município.
“Quando perguntados, os moradores afirmam que seus pais e avós nunca lhes contaram como ela se originou. O que podemos dizer, com certeza, com base nos depoimentos dos mais velhos, é que o grupo está estabelecido no local há mais de 150 anos”, completou a antropóloga Maria Ester.
Regularização
O Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) de Caiana dos Crioulos foi publicado no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da Paraíba, em 24 e 28 de dezembro de 2015. Outros dois imóveis estão inseridos no território, totalizando 646 hectares.
A missão de regularizar territórios quilombolas foi atribuída ao Incra em 2003, com a promulgação do Decreto nº 4.887, que regulamentou os procedimentos para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata a Constituição Federal em seu Artigo 68.
Trata-se de grupos étnicos predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. Após obterem a Certidão de Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares, encaminham ao Incra solicitação formal de abertura dos procedimentos administrativos visando à regularização. Por meio do endereço http://www.gov.br/incra/pt-br/pt/quilombolas.html é possível conhecer todos os passos da política realizada pelo instituto.
Assessoria de Comunicação Social do Incra/PB
(83) 3049-9259
incra.gov.br/pb