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Meio ambiente
Assentamento sustentável na Bahia preserva o pau-brasil mais antigo do país
A árvore de 600 anos está inserida no PDS Reunidas Pau Brasil, em Itamaraju (BA), e é conservada com a ajuda das famílias beneficiárias. Foto: Incra/BA
O pau-brasil mais antigo do país já havia nascido quando Pedro Álvares Cabral aportou nas águas do atual município de Santa Cruz Cabrália, na Bahia. Segundo botânicos e técnicos do Incra, a árvore de 600 anos só foi preservada por estar inserida no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Reunidas Pau Brasil, criado pelo instituto em Itamaraju (BA), na região do Extremo Sul do estado, em 2009.
A divulgação da existência da árvore anciã – como é mais conhecido o pau-brasil – só ocorreu em 2020. Até as últimas medições, ela possui sete metros de diâmetro e 40 metros de altura. Localiza-se numa densa área de remanescente de Mata Atlântica. No PDS onde está situada, vivem 50 famílias.
Na Semana do Meio Ambiente, os moradores do projeto estão visitando escolas e expondo as experiências vivenciadas no local, com o objetivo de conscientização sobre a importância de preservação ambiental. “A floresta traz vida quando ela está em pé. Somos guardiões tanto da mata, como da árvore anciã. Isso nos enche de orgulho”, pontua a presidente da associação dos beneficiários do PDS Reunidas Pau Brasil, Cláudia Vicente.
“Sem a criação do projeto, muito provavelmente a árvore anciã não existisse mais”, sentencia o engenheiro agrônomo da Unidade Avançada do Sul e Extremo Sul do Incra/BA, Edmundo Barbosa. O PDS é uma modalidade de assentamento estabelecida pela autarquia para o desenvolvimento de atividades ambientalmente diferenciadas e dirigida para populações tradicionais, como comunidades extrativistas e ribeirinhos. Trata-se do único do estado neste modelo.
Além dos esforços dos beneficiários, ele também explica que o projeto é uma das poucas ilhas de remanescente de Mata Atlântica preservada. Com mil hectares, a área está situada em uma região tomada por pastos para criação de bovinos e por monoculturas, como o café e eucalipto.
Barbosa fez parte da equipe do Incra/BA que visitou o Reunidas Pau Brasil e, atualmente, elabora um relatório sobre a situação do PDS. Junto com as famílias, o grupo discutiu sobre projetos viáveis, tanto para o progresso dos trabalhadores, como para a continuidade de conservação da área.
Visitas predatórias
Segundo Cláudia Vicente, a árvore anciã foi descoberta em 2014 por assentados e técnicos do Instituto Cabruca – organização não governamental cuja missão, dentre outras, é difundir a produção agroflorestal do cacau. “Decidimos guardar segredo sobre a sua existência para preservar a árvore e toda a mata. Abrimos mão do Prêmio Pau-Brasil do instituto”, acrescenta.
A divulgação do reconhecimento oficial da árvore anciã teve repercussão internacional e, com isso, aconteceu o que Cláudia e as famílias temiam. De modo desordenado, grupos de visitantes passaram a entrar no projeto para visitar o pau-brasil centenário. Pelo caminho, descartavam garrafas pet e sacos plásticos.
“As pessoas vinham pelo fundo do PDS. Além dos materiais que deixavam, arrancavam bromélias, orquídeas, cacau e bananas e espalhavam tudo pelo chão”, conta. Para combater a ação, por meses, as famílias se revezavam em vigília para impedir a entrada desses grupos no local.
Com a publicidade em torno da árvore anciã, não havia segredos a ser guardados sobre a existência dela. Assim, o Instituto Cabruca finalmente premiou o Reunidas Pau Brasil. “Foram 20 mil reais convertidos em abertura de trilhas na floresta, onde poderíamos ir até os cacaueiros”, frisa Cláudia.
No entanto, as famílias mal puderam aproveitar o prêmio. Mais uma vez sem o conhecimento das famílias, foram abertas trilhas para motocross destruindo os caminhos originais para os cacaueiros e a floresta. “Agora só vamos ao local a pé”, lamenta a presidente da associação do PDS.
Outra questão a afligir as famílias é a caça predatória. “Caçadores entram na floresta e não temos controle. Na mata vivem muitos animais, como onça, paca (segundo maior roedor do Brasil e considerado em extinção) e caititu (espécie de porco do mato)”, enumera a beneficiária.
Desenvolvimento sustentável
As famílias do PDS estão desenvolvendo mecanismos para ampliar a diversidade de espécies da floresta. Com a apoio do Programa Interinstitucional Arboretum, implantaram viveiros de espécies nativas da Mata Atlântica. “Fazemos a coleta de sementes, inclusive de espécies raras”, explica Cláudia.
As mudas de jacarandá, cupã e pau-brasil, entre outras espécies, são comercializadas para empresas de celuloses da região e para pequenos produtores recomporem a mata ciliar. Também são doadas para quem não tem condições de adquiri-las.
Em quintais produtivos de dois hectares por família, os assentados cultivam urucum (fruto de sementes vermelhas, utilizados para fazer corante natural), café, mandioca e hortas. Também produzem cacau no sistema “cabruca” – de produção agroflorestal cacaueira dentro da mata, aproveitando o sombreamento das árvores e a umidade natural.
O Arboretum é um forte parceiro do PDS. O programa foi proposto pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), com apoio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e viabilizado por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA).
Novas espécies
De acordo com o engenheiro florestal Marcelo Zamboni, integrante da equipe do Incra/BA, especialistas asseguram sobre a probabilidade de haver espécies não identificadas pela comunidade científica na região.
“Esse fato reforça a importância do PDS Reunidas Pau Brasil para a conservação da biodiversidade e a necessidade de se reconhecer as famílias do projeto como verdadeiras guardiãs, não só do pau-brasil, mas de muitas outras espécies botânicas, sendo que algumas ainda carecem ser descritas”, pontua Zamboni.