Ações judiciais no Brasil
A Convenção-Quadro da OMS para o Controle do Tabaco trata, em seu artigo 19, da responsabilidade civil e penas da indústria do tabaco: “Para fins de controle do tabaco, as Partes considerarão a adoção de medidas legislativas ou a promoção de suas leis vigentes, para tratar da responsabilidade penal e civil (...)”.
No Brasil, não há legislação específica sobre a responsabilidade penal e civil da indústria do tabaco. Este setor está sujeito à legislação nacional que regula as atividades produtivas e comerciais em geral. Como exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/1990) estipula em seu artigo 12 que: “O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos".
No Brasil, existem diferentes ações judiciais relacionadas ao tabagismo. A grande maioria destas ações são movidas por fumantes, ex-fumantes ou familiares contra a indústria do tabaco, requerendo a reparação de danos materiais e morais em função das doenças acarretadas pelo consumo de tabaco ou pelo falecimento em decorrência das enfermidades tabaco-relacionadas.
Essas ações são relativamente novas e geram polêmicas. Os autores argumentam que a indústria do tabaco é responsável pelos danos à saúde causados por seus produtos, e devem arcar com os prejuízos econômicos e morais. Já a indústria alega que a atividade é legal e regulamentada pelo Poder Público.
Em 2008, o Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou sentença de primeiro grau condenando uma fabricante de cigarros pelos danos sofridos por ex-fumante acometida de tromboangeíte obliterante, doença que tem como únicas causas a hereditariedade ou o tabagismo. Na decisão, a responsabilidade objetiva (independente de culpa) da indústria foi reconhecida. Recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou outra fabricante de cigarros a indenizar em R$ 100 mil, por dano moral, o viúvo de uma fumante que, segundo o processo, morreu de câncer em decorrência do consumo de cigarros. No entanto, a maioria dos tribunais brasileiros vêm negando indenizações por danos causados pelo tabagismo.
Por outro lado, existem também ações judiciais contra políticas públicas de controle do tabaco. Em geral são promovidas por representantes da sociedade que sofrem bastante influência dos fabricantes de cigarros. Leis estaduais proibindo fumar em recintos coletivos fechados e advertências sanitárias com fotos impressas nos maços de cigarros são os principais alvos de ações requerendo a suspensão das medidas.
Atualmente tramitam quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal contra leis estaduais de ambientes 100% livres do tabaco dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. Estas ações ainda não foram julgadas, porém, caso sejam deferidas, representarão um grande retrocesso nas políticas locais de saúde pública, já que nestes Estados os ambientes coletivos livres da fumaça do cigarro contam com apoio maciço da população e vem sendo amplamente cumpridos pelos estabelecimentos comerciais, sem nenhum prejuízo aos comerciantes.
Ação Civil Pública pela tutela da saúde
Em maio de 2019, a Advocacia-Geral da União (AGU), em nome da União, ajuizou ação civil pública pela tutela da saúde, em face dos grupos transnacionais fabricantes de cigarros que controlam o mercado nacional, com pedido de ressarcimento dos gastos que a União - e portanto, toda a sociedade - arca com o pagamento de tratamentos de doenças causadas pelo cigarro.
A Ação considerou as evidências científicas internacionais e nacionais robustas sobre a carga do tabagismo para a sociedade, tanto sobre morte precoce, adoecimento e perda de produtividade por doenças associadas ao consumo e exposição ao cigarro.
São demandadas na ação proposta: a Souza Cruz Ltda. (empresa brasileira que pertence à British American Tobacco), a própria British American Tobacco PLC, a Philip Morris Brasil Indústria e Comércio LTDA. (empresa brasileira que pertence à Philip Morris International), a Philip Morris Brasil S/A (empresa norte-americana autorizada a funcionar no Brasil) e a Philip Morris International.
Essas empresas, em conjunto, detêm aproximadamente 90% do mercado formal brasileiro de fabricação e comércio de cigarros.
Para maiores informações, consulte o sítio da AGU.
Caso da ADIN dos Aditivos
Em fevereiro de 2018, a ADI nº 4874 promovida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) questionava a proibição de aditivos em cigarros pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e foi julgada no Supremo Tribunal Federal (STF).
Cinco ministros consideraram que a Anvisa é competente para proibir aditivos em derivados fumígenos de tabaco, por entender entre outros que o “poder normativo não é poder legislativo” conforme afirmou em seu voto a relatora Ministra Rosa Weber. Outros cinco ministros entenderam que a Anvisa não tem essa atribuição e que a agência extrapolou seu poder, invadindo competência do Congresso.
A constituição brasileira exige o quórum mínimo de seis ministros para que uma lei ou ato normativo do Poder Público seja declarado inconstitucional. Portanto, tendo em vista que tal quórum não foi atingido, o pedido da CNI foi julgado improcedente, ou seja, é constitucional a lei que confere à Anvisa competência para regular produtos de tabaco. Quanto ao pedido sucessivo da CNI, respectivo à Resolução da Anvisa sobre os aditivos, o entendimento dos ministros é de que não houve decisão na Corte, por insuficiência de quórum necessário.
Portanto, em respeito aos efeitos do julgamento, os ministros concluíram que a decisão não gerou vínculo às demais ações em curso em tribunais de justiça do Brasil, o que é pouco comum em julgamentos desta Corte, sendo a mais recente o caso do amianto.
Assim, as ações judiciais propostas com a finalidade de questionar a regulamentação dos aditivos pela Anvisa não foram alcançadas pela declaração de constitucionalidade no STF. Para o acatamento da decisão na ADI nas instâncias judiciais inferiores, a AGU se utilizou de uma ferramenta jurídica trazida recentemente pelo novo Código de Processo Civil, Incidente de Assunção de Competência, para suspender ações sobre limites ao uso aditivos. Das 13 ações no Brasil que questionam a RDC além desta ADI, duas têm liminares deferidas; três indeferidas, e oito com pedidos ainda não apreciados (dados de novembro de 2018).
Em 2022 a Advocacia-Geral da União (AGU) e a ACT Promoção da Saúde, entraram com recurso para que fosse apreciado e decidido o efeito vinculante da constitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 14/12, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que proíbe aditivos de sabores nos produtos de tabaco. Aguarda-se a publicação do julgamento.
Informações sobre ADIN e tabagismo:
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4239 - Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de Entretenimento - ABRASEL X Governador do Estado de São Paulo e outros.
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4249 - Confederação Nacional do Turismo - CNTUR X Governador do Estado de São Paulo e outros.
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4306 - Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo - CNC X Governador do Estado do Rio de Janeiro e outros.
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4351 - Confederação Nacional do Turismo – CNTUR X Governador do Estado do Paraná e outros.
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3311 - A Confederação Nacional da Indústria (CNI) questiona a restrição à publicidade de produtos fumígenos, derivados ou não do tabaco; os limites constitucionais de aplicação pelo Poder Público da impositividade de contrapropaganda nos produtos de tabaco; os limites de imposição e condições de aplicação das normas reguladoras no direito brasileiro; a exacerbação no conteúdo e na medida dos limites constitucionais adscritos exclusivamente à ação legislativa.