Introdução
O câncer é o principal problema de saúde pública no mundo, figurando como uma das principais causas de morte e, como consequência, uma das principais barreiras para o aumento da expectativa de vida em todo o mundo. Na maioria dos países, corresponde à primeira ou à segunda causa de morte prematura, antes dos 70 anos. O impacto da incidência e da mortalidade por câncer está aumentando rapidamente no cenário mundial (SUNG et al., 2021). Tal aumento resulta principalmente das transições demográfica e epidemiológica pelas quais o mundo está passando. Enquanto, do ponto de vista demográfico, observam-se uma redução nas taxas de fertilidade e de mortalidade infantil e um consequente aumento na proporção de idosos na população, do ponto de vista da transição epidemiológica, dá-se a substituição gradual da mortalidade por doenças infecciosas pelas mortes relacionadas às doenças crônicas. O envelhecimento e a mudança de comportamento e do ambiente, incluindo mudanças estruturais, que têm impacto na mobilidade, na recreação, na dieta e na exposição a poluentes ambientais, favorecem o aumento da incidência e da mortalidade por câncer (WILD; WEIDERPASS; STEWART, 2020).
Nos países com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), observa-se o impacto nas taxas de incidência e mortalidade por câncer por meio de ações para combate ao câncer pela via de intervenções eficazes para prevenção, detecção precoce e tratamento. Em contrapartida, em países em transição, essas taxas seguem aumentando ou, no máximo, mantendo-se estáveis. O desafio dos países de baixo e médio desenvolvimentos é, portanto, utilizar melhor os recursos e os esforços para tornar mais efetivo o controle do câncer.
No Brasil, na última década, observou-se uma melhora expressiva na disponibilidade e na qualidade das informações sobre incidência e mortalidade por câncer. A vigilância de câncer, no escopo das ações de controle das doenças não transmissíveis, apoiada nas melhores informações disponíveis, obtidas dos registros de câncer (populacionais e hospitalares) e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), fornece os subsídios para que os gestores monitorem e organizem as ações para o controle do câncer, bem como o direcionamento da pesquisa em câncer.
O impacto do câncer no mundo, em 2020, baseado nas estimativas do Global Cancer Observatory (Globocan), elaboradas pela International Agency for Research on Cancer (Iarc), aponta que ocorreram 19,3 milhões de casos novos de câncer no mundo (18,1 milhões, se forem excluídos os casos de câncer de pele não melanoma). Um em cada cinco indivíduos terão câncer durante sua vida (FERLAY et al., 2021; SUNG et al., 2021). Os dez principais tipos de câncer representam mais de 60% do total de casos novos. O câncer de mama feminina é o mais incidente no mundo, com 2,3 milhões (11,7%) de casos novos, seguido pelo câncer de pulmão1, com 2,2 milhões (11,4%); cólon e reto2, com 1,9 milhão (10,0%); próstata, com 1,4 milhão (7,3%); e pele não melanoma, com 1,2 milhão (6,2%) de casos novos.
O câncer de pulmão é o mais frequente em homens, com 1,4 milhão (14,3%) dos casos novos, seguido dos cânceres de próstata, com 1,4 milhão (14,1%); cólon e reto, com 1 milhão (10,6%); pele não melanoma, com 722 mil (7,2%); e estômago, com 719 mil (7,1%) casos novos no mundo. Nas mulheres, o câncer de mama é o mais incidente, com 2,3 milhões (24,5%) de casos novos, seguido pelos cânceres de cólon e reto, com 865 mil (9,4%); pulmão, com 771 mil (8,4%); colo do útero, com 604 mil (6,5%); e pele não melanoma, com 475 mil (5,2%) casos novos no mundo (FERLAY et al., 2020; SUNG et al., 2021).
A taxa ajustada de incidência de câncer foi 19% maior em homens (222,0 por 100 mil) do que em mulheres (186,0 por 100 mil), variando entre as diferentes regiões do mundo. Nos países com maior IDH, as taxas de incidência observadas em homens foram quase cinco vezes maiores do que em países com baixo IDH, enquanto, nas mulheres, essa razão foi de quatro. Nos países com alto IDH, o câncer mais incidente é o de pulmão (39,0 por 100 mil), seguido pelos cânceres de próstata (37,5 por 100 mil) e de cólon e reto (29,0 por 100 mil), enquanto, nos países com baixo ou médio IDH, há uma inversão entre o primeiro e o segundo, sendo próstata o mais incidente (11,3 por 100 mil), seguido do câncer de pulmão (10,3 por 100 mil). O terceiro câncer mais incidente em países com baixo ou médio IDH é o de lábio e cavidade oral3 (10,2 por 100 mil). Nas mulheres, as taxas ajustadas de incidência de câncer de mama são as maiores tanto em países com alto IDH (55,9 por 100 mil) quanto naqueles com baixo ou médio IDH (29,7 por 100 mil). O segundo mais incidente nos países com alto IDH são os cânceres de cólon e reto (20,0 por 100 mil), enquanto, nos países com baixo ou médio IDH, o segundo mais incidente é o câncer do colo do útero (18,8 por 100 mil) (SUNG et al., 2021).
Para o Brasil, a estimativa para o triênio de 2023 a 2025 aponta que ocorrerão 704 mil casos novos de câncer, 483 mil se excluídos os casos de câncer de pele não melanoma. Este é estimado como o mais incidente, com 220 mil casos novos (31,3%), seguido pelos cânceres de mama, com 74 mil (10,5%); próstata, com 72 mil (10,2%); cólon e reto, com 46 mil (6,5%); pulmão, com 32 mil (4,6%); e estômago, com 21 mil (3,1%) casos novos. Estima-se que os tipos de câncer mais frequentes em homens serão pele não melanoma, com 102 mil (29,9%) casos novos; próstata, com 72 mil (21,0%); cólon e reto, com 22 mil (6,4%); pulmão, com 18 mil (5,3%); estômago, com 13 mil (3,9%); e cavidade oral, com 11 mil (3,2%). Nas mulheres, os cânceres de pele não melanoma, com 118 mil (32,7%); mama, com 74 mil (20,3%); cólon e reto, com 24 mil (6,5%); colo do útero, com 17 mil (4,7%); pulmão, com 15 mil (4,0%); e tireoide, com 14 mil (3,9%) casos novos figurarão entre os principais.
A taxa ajustada de incidência, excluído o câncer de pele não melanoma, foi 17% maior em homens (185,61) do que em mulheres (154,08) e é considerada intermediária e compatível com as taxas apresentadas para países em desenvolvimento.
A distribuição da incidência por Região geográfica mostra que as Regiões Sul e Sudeste concentram cerca de 70% da incidência, sendo que, na Região Sudeste, encontra-se a metade dos casos. Existe, entretanto, grande variação na magnitude e nos tipos de câncer entre as diferentes Regiões do Brasil.
As Regiões Sudeste, Centro-oeste e Sul possuem os maiores IDH, enquanto as Regiões Nordeste e Norte, os menores. Em homens, o câncer de próstata é predominante em todas as Regiões, mas, para as de maior IDH, os de cólon e reto ocupam a segunda ou a terceira posição, enquanto, para as de menor IDH, o câncer de estômago é o segundo ou o terceiro mais frequente. Nas mulheres, o câncer de mama é o mais incidente e, nas Regiões com maior IDH, os cânceres de cólon e reto são o segundo ou terceiro mais frequente, mas, nas Regiões de menor IDH, o câncer do colo do útero permanece na segunda posição.
O Instituto Nacional de Câncer (INCA) reafirma seu propósito de fortalecer a vigilância de câncer, oferecendo as estimativas para o triênio 2023-2025, a fim de que sejam amplamente utilizadas por gestores, profissionais da saúde e de áreas afins, bem como pela sociedade em geral, como instrumento para melhor gerenciar os recursos e esforços no efetivo controle do câncer no Brasil.
1 - C33-C34 – traqueia, brônquio e pulmão.
2 - C18-C21 – cólon, junção retossigmoide, reto e ânus.
3 - C00-C06 – lábio e cavidade oral.