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Termo de Compromisso beneficia comunidades quilombolas na Rebio do Rio Trombetas
Presidente Mauro Pires e representantes das comunidades do Território Quilombola Alto Trombetas 1 - Foto: Felipe Rodrigues/ICMBio
Foi assinado na tarde de quinta-feira (29) o Termo de Compromisso entre o Instituto Chico Mendes, órgão gestor da Reserva Biológica do Rio Trombetas, e a Associação Mãe Domingas (AMD), representante das comunidades do Território Quilombola Alto Trombetas 1(AT1). O termo acordado entre as partes possibilita o uso múltiplo de recursos, mediante regras a serem construídas coletivamente que garantam a proteção ao meio ambiente e o uso sustentável dos recursos pelos quilombolas na área em que o AT1 ficou sobreposto pela Reserva Biológica, criada em 1979. A cerimônia ocorreu no Auditório Rômulo Mello, na sede do ICMBio, em meio às celebrações dos 17 anos do instituto.
A diretora de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial do ICMBio, Katia Torres, afirmou que “temos uma imensa responsabilidade como Instituto Chico Mendes, de promover com a sociedade, dentro do conceito de gestão ambiental pública, a conservação do maior sistema, do maior conjunto de áreas protegidas do planeta, e que é território de vida de milhares de pessoas que vivem diretamente destas áreas e que são as guardiãs e guardiões. Nós temos a responsabilidade de construir caminhos de conservação que sejam em profundo diálogo com aqueles que estão tão próximos e que trazem para a gente perspectivas diferentes sobre as formas de fazer e estar no mundo.”
Ari Carlos Printes, coordenador administrativo da AMD, conta que “nosso território tem três partes, uma parte titulada, uma que é Flona e outra que é Rebio. Desde 2018 comecei essa discussão sobre o Termo de Compromisso, agradeço a todos os parceiros que participaram. Chegamos a um ponto, uma parte do reconhecimento, temos o maior interesse em ter nossos territórios reconhecidos. Isso é uma parte só, vamos ter regras para a frente, que bom que o ICMBio tentou dar um passo para frente no sentido de reconhecer nosso território, que existe muito antes da criação da Rebio do Rio Trombetas. Agora, com o Termo de Compromisso, temos que fazer as regras (de uso) acontecerem.”
Aluízio dos Santos, liderança histórica do movimento quilombola do Território AT1, avaliou que “o ICMBio é nosso parceiro e vai nos ajudar a cuidar do nosso território, temos muito cuidado com as pessoas que entram no território, quando vemos uma pessoa irregular lá, chamamos o ICMBio para nos ajudar a retirar. Nos ajudem a cuidar do território, levar desenvolvimento, políticas públicas, se os quilombolas não cuidassem do território, ele teria sido destruído.”
Desde o século XIX, os quilombolas, resistindo à escravidão, ocupam a região do Alto Trombetas, no município de Oriximiná/PA, e desenvolvem um modo de vida e de relação com o ambiente que permitiu que a região que ocupam seja uma das mais conservadas da Amazônia. A principal atividade econômica dos quilombolas do Trombetas era a coleta de castanha-do-Pará, acompanhada da agricultura de subsistência, da caça e da pesca para garantir segurança alimentar das comunidades.
Durante o período da ditadura, em 1979, uma grande mineradora de bauxita se instalou em Porto Trombetas, em território utilizado pelas comunidades quilombolas na margem direita do Rio Trombetas. Ao mesmo tempo, o governo federal criou a Reserva Biológica do Rio Trombetas, abrangendo o leito do rio e a margem esquerda do curso d’água numa extensão de 407.759 hectares, em parte área ocupada e utilizada pelas comunidades quilombolas.
A partir da criação da Rebio, os quilombolas que ocupavam a margem esquerda do Trombetas passaram a ser expulsos do território e a ter seu uso vedado pelo órgão gestor da Rebio à época, resultando numa situação de conflito. O conflito foi agravado após a criação da Floresta Nacional de Saracá-Taquera, em 1989, na margem direita do rio, em parte da região na qual as famílias expulsas da Rebio haviam se estabelecido.
A Constituição Federal de 1988, coroando o processo de redemocratização do Brasil, estabeleceu o direito a um Meio Ambiente equilibrado, consagrado no Artigo 225, bem como o reconhecimento do direito dos quilombolas à titulação com pleno domínio dos seus territórios, conforme o Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta Magna. Este direito dos remanescentes de Quilombos só foi reconhecido pelo Estado cem anos após a Abolição da Escravatura no Brasil.
Em 2017, após muita luta das comunidades quilombolas através de suas organizações, o INCRA emitiu os Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID) dos Territórios Quilombolas Alto Trombetas 1 e 2, delimitando as áreas utilizadas tradicionalmente pelos quilombolas, as quais se sobrepõem tanto à Rebio do Rio Trombetas como à Flona de Saracá-Taquera.
Em 2021, a Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Chico Mendes emitiu o Parecer 175, a partir do qual o instituto adotou o entendimento da admissibilidade de usar em unidades de conservação de proteção integral os Termos de Compromisso (instrumentos previstos na Lei do SNUC) como forma de buscar resolver, de forma acordada, conflitos envolvendo populações e povos tradicionais e os objetivos das UC.
O Termo de Compromisso celebrado busca compatibilizar os dois direitos constitucionais, permitindo que as comunidades quilombolas do AT1 possam utilizar, de forma regrada e sustentável, os recursos naturais que seus usos e costumes mantiveram tão bem conservados durante mais de 100 anos, a ponto de justificar a criação de uma Reserva Biológica no território.
Com a assinatura do TC, os quilombolas do AT1, cerca de 155 famílias distribuídas nas comunidades Abuí, Paraná do Abuí, Santo Antônio do Abuizinho, Tapagem, Sagrado Coração de Jesus e Mãe Cué, passam a ter acesso à parte dos direitos garantidos pela Constituição Federal, sem prejuízo da conservação ambiental, embora continuem lutando pela titulação definitiva do território, obrigação do Estado conforme o Art. 68 da ADCT.
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável relacionados:
Com informações da Reserva Biológica do Rio Trombetas
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