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Projeto analisa fenômeno incomum com aves na PB
Situação incomum na região do estuário do rio Paraíba
Victor Souza
victor.souza@icmbio.gov.br
João Pessoa/PB (23/01/2014) - Um fenômeno incomum envolvendo maçaricos migratórios da espécie batuíra-de-bando ( Charadrius semipalmatus ) no litoral da Paraíba tem mobilizado pesquisadores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) – todos envolvidos na iniciativa conservacionista Projeto Extremo Oriental das Américas. Em pleno processo migratório, populações numerosas desta espécie, vindas do sul da Argentina e que passaram também pelo Parque Nacional (Parna) da Lagoa do Peixe (RS), pararam na costa paraibana para descansar e se alimentar durante o verão do Hemisfério Sul, antes de seguir a rota para seu período de reprodução no Hemisfério Norte.
Entretanto, os pesquisadores constataram que milhares de maçaricos têm descansado diariamente, em grupos revezados, sobre o telhado de um galpão comercial situado à margem da rodovia BR-230, entre João Pessoa (PB) e Cabedelo (PB), e inserido na região do estuário do rio Paraíba, área de extrema importância para repouso e alimentação da espécie. O ornitólogo Andrei Roos, analista ambiental da Reserva Extrativista (Resex) Marinha do Pirajubaé (SC), avalia que "o alto fluxo de banhistas durante a estação e o impacto dos processos de urbanização e degradação do ambiente estuarino devem ter afugentado os maçaricos de seu hábitat natural, obrigando-os a procurar outro ambiente para empoleiramento".
O também ornitólogo Alan Loures, professor do Departamento de Sistemática e Ecologia da UFPB, concorda com a hipótese: "Esse fenômeno indica uma lenta e gradativa redução da faixa de hábitat natural onde os maçaricos descansam e se alimentam antes de seguir sua rota, possivelmente devido ao adensamento humano e até mesmo a causas naturais como mudanças de corrente marítima".
A opção pelo abrigo na estrutura artificial, porém, oferece vários riscos à conservação dessas populações migratórias, como aponta Alan. "Além da vulnerabilidade à predação por outras espécies e à contração de doenças, as aves se alimentam menos, acumulando menos energia e correndo o risco de retornar ao Hemisfério Norte em condições precárias, o que se refletiria em menores taxas de reprodutividade", explica. Douglas Zeppelini, professor de Zoologia da UEPB, também alerta para um possível desequilíbrio na cadeia alimentar: "Essa anomalia ainda pode provocar como consequência o empobrecimento do solo de restinga que depende da digestão dos maçaricos para se enriquecer".
Sítio Ramsar
Devido ao alerta que a situação anormal dos maçaricos representa, os pesquisadores do Projeto Extremo Oriental das Américas consideram necessário instituir a região do estuário do rio Paraíba como Sítio Ramsar. Esta modalidade internacional de proteção de zonas úmidas pode melhorar as estratégias de conservação de aves migratórias na área. "O status de proteção internacional garantiria mais recursos para se conservar o estuário, incluindo medidas como locais de exclusão de banhistas e redução de agentes poluidores", defende Andrei.
Douglas concorda, acrescentando que atualmente se dedica, ao lado de outros pesquisadores da UEPB, a um censo populacional para registrar a quantidade de maçaricos migratórios que têm descansado no mesmo local. "Já contabilizamos cerca de 1.200 aves empoleiradas no telhado do galpão em um único momento, mas como os grupos se revezam no descanso, certamente o total de indivíduos na área deve atingir os 2.500", afirma Douglas. O pesquisador esclarece que tal quantidade, equivalente a 1% da população global da espécie, qualificaria o estuário do rio Paraíba como Sítio Ramsar. "Quando tivermos uma contagem confiável da população dessa espécie, divulgaremos o resultado em publicações científicas internacionais para pleitear essa proposta", conclui.
O coordenador do Projeto Extremo Oriental, Orione Álvares, analista ambiental da Floresta Nacional (Flona) da Restinga de Cabedelo, assinala outro fator que justifica a indicação do estuário do rio Paraíba à categoria, especialmente quanto à conservação de aves. "Nós estamos fazendo uma síntese de várias listas de espécies, produzidas por diversos autores, que registraram a ocorrência de 363 espécies de aves – muitas delas ameaçadas –, o que constitui 1/3 da biodiversidade de avifauna de todo o bioma Mata Atlântica", revela Orione. O analista salienta que a proposta de um Sítio Ramsar na região alinha-se com as metas do Ministério do Meio Ambiente quanto à criação de zonas protegidas desta modalidade no Brasil, além do fato de o próprio Ministério do Meio Ambiente reconhecer o estuário como Área Prioritária para Conservação da Biodiversidade, tanto em relação a hábitats – banhados, estuários, recifes e restinga – como a grupos zoológicos – aves, mamíferos, peixes, elasmobrânquios (tubarões e arraias) e bentos (organismos do substrato marinho).
Sobre o Projeto Extremo Oriental das Américas
Fomentando a relação integrada entre ciência e políticas públicas, o Projeto Extremo Oriental das Américas dedica-se à aplicação de subprojetos técnicos e científicos em prol da gestão ambiental do estuário do rio Paraíba, que abrange 16 unidades de conservação (UCs) distribuídas entre os municípios paraibanos de Bayeux, Cabedelo, João Pessoa, Lucena e Santa Rita.
Idealizada pela Flona da Restinga de Cabedelo, a iniciativa conservacionista se consolidou através de parcerias com a Marinha do Brasil, UFPB, UEPB, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB), SOS Mata Atlântica (SOSMA), Companhia Docas da Paraíba, Governo do Estado da Paraíba e as prefeituras das cinco cidades anteriormente citadas.
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