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População apoia criação de UC Marinha no ES
Após apresentações da proposta tanto pelo ICMBio quanto por pesquisador da UFF, proposta de nova UC teve amplo apoio no ES
Sandra Tavares
sandra.tavares@icmbio.gov.br
Vitória (ES) – Se depender da população capixaba, o Monumento Natural (MONA) do Arquipélago de Trindade e Martin Vaz, será criado. Em consulta pública promovida ontem (08), às 14h00, pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) na Assembléia Legislativa do ES, cerca de 150 pessoas representando a sociedade civil e uma série de instituições que atuam na área ambiental no estado fizeram um debate qualificado em torno da proposta apresentada e exigiram que a criação não fique no papel.
Entre os pontos que ganharam destaque, estão: que a proposta da área do monumento natural seja contígua, ligando as ilhas de Trindade e o Arquipélago de Martin Vaz; que após criada a UC seja logo implementada com os instrumentos de gestão necessários tais como Plano de Manejo; que a área seja efetivamente fiscalizada, garantindo que os estoques pesqueiros e a rica biodiversidade ali existente sejam protegidos, que seja proibida qualquer retirada de biodiversidade (ex. sedimentos carbonásticos e algas calcárias) para fins de atendimento da indústria da mineração e que a Marinha do Brasil reduza as ações de pesca recreativa na região.
A abertura da consulta pública foi feita pela Diretora do Departamento de Áreas Protegidas da Secretaria de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Moara Menta Giasson,pelo Diretor de Criação e Manejo de UCs do ICMBio, Paulo Carneiro, pelo Secretário de Meio Ambiente do ES e da cidade de Vitória, Aladim Cerqueirae Luiz Emanuel Zouain da Rocha, e pelo diretor do Instituto Mata Atlântica Sérgio Lucena. Em seguida a população e instituições capixabas puderam ouvir em detalhes a proposta.
Apresentada pelo analista ambiental do ICMBio, Aldízio Lima de Oliveira Filho, a proposta da APA de Trindade e Martim Vaz engloba duas áreas: uma num raio de 200 milhas náuticas ao redor do arquipélago, correspondente à Zona Ecológica Exclusiva (ZEE), excluída a área delimitada pelo Monumento Natural do Arquipélago de Trindade e Martim Vaz; e outra em frente ao posto oceanográfico, dentro do monumento natural.
A APA terá como objetivos assegurar os direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, garantindo o uso sustentável da zona econômica exclusiva para fins econômicos, além de ordenar a pesca, navegação, turismo e demais atividades econômicas compatíveis com a conservação ambiental que se apresentem como estratégicas à região.
Já a outra área será o Monumento Natural (MONA) de Trindade e Martim Vaz, que terá como objetivos preservar sítios naturais raros, compostos por monte submarinos e ilhas da Cadeia Vitória-Trindade, garantir a integridade dos habitats e das populações de espécies ameaçadas de extinção, promover a execução constante de pesquisa e monitoramento da biodiversidade na região e contribuir, por meio do mosaico de unidades de conservação e seu zoneamento, para a recuperação de estoques pesqueiros.
Entre as riquezas citadas na apresentação estavam: o fato das UCs propostas possuírem mais de 200 espécies de plantas, sendo 15 delas endêmicas (que só ocorrem na ilha), de suas praias serem o maior sítio reprodutivo da tartaruga verde no Brasil, abrigando até 6 mil ninhos por ano. Tartarugas verde, cabeçuda e de pente, todas ameaçadas de extinção, são comumente observadas nos ambientes recifais dos montes submarinos da cordilheira.
Aldízio enfocou, ainda, que a região abriga sete espécies de aves, além de uma diversidade de peixes (87) e tubarões do Atlântico Sul (17), sendo um deles extremamente ameaçado (o cherne negro); além de ser abrigo para 12 espécies de cetáceos. Entre as espécies endêmicas, estão o caranguejo-amarelo, pardela-de-trindade, uma subespécie de fragata e bosques de samambaias gigantes com mais de 5 metros.
Após apresentação do ICMBio, o pesquisador do Departamento de Biologia Marinha da Universidade Federal Fluminense (UFF), Carlos Eduardo Leite Ferreira (Cadu), que estuda a região, reforçou que o Brasil possui ilhas oceânicas com ecossistemas únicos no mundo.
“Os últimos cinco anos revelaram que a biomassa de peixes em ambientes recifais e nas ilhas revelou-se muito maior do que na costa/continente. Se no continente o peixe está diminuindo é porque a pressão humana é muito maior. Daí esses sítios serem importantíssimos para manutenção dos estoques pesqueiros”, frisou Cadu.
Cadu reforçou a relevância singular da região como um ‘laboratório natural de evolução’, onde diversas espécies endêmicas tiveram origem. “Regiões como esta, em termos de prospecção marinha, podem revelar uma série de substâncias novas, com potencial anti-câncer ou anti-HIV. Daí ser vital preservá-la”, cita.
Debate qualificado
Pode-se afirmar que foi unânime o apoio à criação das unidades de conservação, guardados alguns questionamentos feitos à proposta, como à mudança na categoria – de Refúgio de Vida Silvestre (REVIS) para Monumento Natural (MONA). O diretor de Criação e Manejo de UCs do ICMBio, Paulo Carneiro, aproveitou a ocasião para justificar a mudança técnica feita pela equipe em Brasília, em relação à categoria, sem a efetiva consulta aos pesquisadores envolvidos nos estudos e que haviam definido a categoria REVIS.
Em relação à gestão compartilhada com a Marinha do Brasil, diversos atores sociais enfatizaram ser de vital importância que se reduza a pesca esportiva realizada na ilha pelos militares. Segundo a proposta, as UCs serão administradas de forma compartilhada com a Marinha.
Helô Dias, da Rede da Biosfera, frisou que a gestão integrada se constrói junto com o Estado do ES e com o Município de Vitória, reiterando as falas iniciais dos representantes da prefeitura e do governo. Considerada hoje uma reserva municipal de Vitória, a ilha de Trindade abriga, desde 1957, o Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade, gerido pela Marinha do Brasil. Ao todo são oito instalações para militares e pesquisadores, que abrigam cerca de 30 pessoas – que representam a única comunidade que fica na ilha.
Paulo Guilherme (Pinguim), da ONG Divers for Shark que defende a preservação dos tubarões, em função do sério risco de extinção dessas que vivem nos mares a mais de 400 milhões de anos, destacou na consulta pública que vivem do mar além de pescadores uma série de outros profissionais, tais como mergulhadores, instrutores de mergulho, mestres e capitão amadores (que conduzem as embarcações nessas atividades).
“Todos esses profissionais dependem da biodiversidade, e se não tomarmos cuidado, os peixes desAPArecem”, frisando em sua fala a expressão APA, em uma crítica à proposta pela escolha desta categoria.
O diretor de Criação e Manejo de UCs do ICMBio, Paulo Carneiro chamou a atenção para não se condenar a categoria APApor causa de algumas experiências de gestão não tão exitosas. “O ICMBio faz a gestão de 33 APAs atualmente e não podemos condenar uma categoria por si só. Um exemplo bem sucedido de gestão, que compatibiliza conservação da biodiversidade com turismo em bases sustentáveis e pesca é a APA Costa dos Corais, em Pernambuco. Após criada esta unidade nova poderá detalhar em seu Plano de Manejo as zonas de pesca, bem como os petrechos e tipos de pescaria a serem permitidos dentro de sua área. Lembrando que o ICMBio tem a prerrogativa de fiscalizar dentro das UCs, fiscalização que vem sendo feita sempre com parcerias”, frisou Carneiro.
O coordenador de Criação de UCs do ICMBio, Bernardo Brito, explicou que a celeridade para a implementação das UCs tem sido uma preocupação do ICMBio. “Podemos afirmar que a elaboração dos Planos de Manejo passou por uma reestruturação, fazendo com que o tempo de conclusão desse instrumento seja mais rápido e efetivo. Um exemplo foi o Refúgio de Vida Silvestre de Alcatrazes, cujo Plano de Manejo saiu após um ano de criação da unidade de conservação e que tem gestão compartilhada com a Marinha do Brasil e permitirá visitação com atividades de mergulho em breve”, destacou Brito.
Outra contribuição trazida pelo analista ambiental do Ibama/ES, Gustavo Almado, é sobre a implementação efetiva da nova unidade de conservação com recursos, frente a uma realidade de contingenciamento na esfera pública. “A Medida Provisória (MP) 809/2017 definiu novas regras para aplicação de recursos da compensação ambiental, permitindo um aporte imediato de recursos em fundo privado que serão usados na gestão das UCs Federais. Estamos na fase de definição da instituição que irá operacionalizar este Fundo. A Petrobrás já formalizou ao ICMBio que pagará R$ 600 milhões tão logo definamos o operador deste fundo, o que representa um universo de tempo em torno de 6 meses para este recurso estar disponível” explicou o diretor de Criação e Manejo de UCs do ICMBio, Paulo Carneiro.
Prioridade de Governo
A região é reconhecida nacional e internacionalmente como um hotspot (área de alta prioridade para a conservação e uso sustentável da biodiversidade) e apontada pelo Governo do Brasil como área prioritária para a proteção dos oceanos e criação de unidades de conservação marinhas.
Logo após as contribuições, tanto na forma das falas, quanto da documentação protocolada por algumas instituições, a Consulta Pública segue por mais 30 dias, período em que a sociedade ainda pode contribuir à proposta por meio do envio de e-mail ou correspondência para os seguintes endereços: Email: consultapublica@icmbio.gov.br
ou
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
Diretoria de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (Diman)
Coordenação de Criação de Unidades de Conservação (Cocuc)
EQSW 103/104, Bloco D, Complexo Administrativo
Setor Sudoeste - Brasília/DF
CEP: 70.670-350
Comunicação ICMBio
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