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Oficinas discutem cultivo e coleta de caranguejo
Encontros organizados pelo ICMBio e parceiros reúnem gestores de UCs e extrativistas de vários pontos do País para debater o marco regulatório do setor e a valoração dos manguezais
Ramilla Rodrigues
ramilla.rodrigues@icmbio.gov.br
Brasília (08/11/2017) – O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em parceria com o Projeto Manguezais do Brasil, promoveu, nas duas últimas semanas, oficinas com gestores e extrativistas de diversas unidades de conservação de todas as regiões brasileiras. A primeira, ocorrida entre 31 de outubro e 1º de novembro, em Brasília, foi um processo participativo sobre o marco regulatório do caranguejo-uçá. O objetivo foi o de ouvir a comunidade que atua na cadeia produtiva.
O caranguejo é uma figura carimbada na culinária dos estados do Norte e Nordeste. O caranguejo-uçá é uma das espécies mais consumidas e também uma das mais ameaçadas, possuindo regulamentação própria durante a “andada”, época de reprodução. A captura é uma importante atividade econômica na área costeira do Brasil, especialmente para comunidades que vivem próximos aos manguezais brasileiros.
“Os manguezais são ecossistemas muito importantes, quer seja do ponto de vista social – pois dezenas ou centenas de milhares de famílias que vivem da coleta de crustáceos, moluscos etc diretamente nos mangues ou da pesca artesanal próxima e dependente deles – quer seja pela ecologia – pois é fundamental nos ciclos de vida de muitas espécies costeiro-marinhas, como, por exemplo, juvenis que se abrigam e se alimentam nos mangues”, explica o diretor de Ações Sociambientais e Consolidação Territorial, Claudio Maretti.
“Com a oficina, pudemos ter contato com outras comunidades, aprender as práticas, compartilhar conhecimento e construir o marco regulatório com diálogo”, enfatizou João Lima, comunitário da Reserva Extrativista (Resex) Marinha São João da Ponta, no Pará. Os extrativistas tiveram a oportunidade de sinalizar aos representantes do ICMBio quais eram as principais técnicas utilizadas, como o laço e a tapa.
Serviços ecológicos
Na terça-feira (7), o ICMBio finalizou a oficina de Protocolo de Valoração dos Passivos da Carnicicultura em Manguezais com gestores e comunitários. A ideia foi avaliar a importância de bens e serviços ecológicos prestados pelos manguezais e o grau de severidade dos impactos causados neste ecossistema. Por meio da moderação de pesquisadores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, os participantes puderam trabalhar num protocolo de valoração dos passivos da carnicicultura em manguezais.
Este protocolo considera um possível cenário de afetação do ecossistema e os eventuais prejuízos que extrativistas poderiam ter. Considerando as curvas de recuperação do caranguejo ano a ano até o crescimento comercial (em torno de 6 a 7 centímetros), os participantes avaliaram, em termos ecológicos e econômicos, os impactos de um empreendimento que afetaria a perda de indivíduos numa determinada área. O cálculo leva em conta o número de indivíduos que deixariam de existir em estoque, o início da tomada de ações de mitigação dos danos e o começo efetivo da recuperação.
Também foi considerado o valor unitário de caranguejo em determinado período e os custos com aparatos e equipamentos para a coleta dos crustáceos. “O cálculo serve para demonstrar o impacto de empreendimentos para a renda de uma comunidade que depende da coleta de caranguejos”, explicou o professor Ronaldo Seroa da Mata, pesquisador da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) que conduziu a metodologia.
Assim, esse protocolo servirá para o caso de desmontar ‘fazendas de carcinicultura’ irregulares, apoiar avaliações para autorização ou não da instalação da atividade e eventuais processos administrativos e jurídicos associados à atividade. “A expectativa do ICMBio é fortalecer mecanismos para as melhores avaliações e decisões possíveis em favor da conservação da natureza, em defesa das populações tradicionais e em prol do desenvolvimento sustentável”, concluiu Maretti.
Importância das UCs
As unidades de conservação (UCs) são de grande valor para a produção sustentável de pescado e frutos do mar. Embora o Brasil tenha um grande desafio de proteção na zona marinha, áreas de manguezais apresentam níveis de proteção satisfatórios, sendo as UCs grandes responsáveis por esta proteção.
“Uma unidade de conservação federal permite a possibilidade de regulamentação das espécies marinhas e coíbe a captura de espécies sob risco sem gerar prejuízo de estoque”, avalia a pesquisadora da Nature Viva Mangue, Rosimeire Dantas, que monitora a região norte do Rio Grande do Norte, estado considerado o berço da carnicicultura no país. Dantas conta que, em áreas não protegidas, fica mais difícil implementar a produção sustentável da carnicicultura, como já existe nas UCs.
A atuação das UCs é imprescindível também no contexto de mitigação das condições climáticas, como no sequestro e manutenção do estoque de carbono e proteção das áreas marinho-costeiras. Apesar de grande parte dos manguezais do Brasil estar protegido em unidades de conservação, pelo novo Código Florestal, aparentemente ainda há um volume significativo de conversão de habitats (desmatamento, transformação etc.), nos próprios mangues e no seu entorno.
“Estudos ainda em andamento apontam que a carcinicultura é o principal vetor dessa conversão, sobretudo no Nordeste, fora de unidades de conservação, em áreas de proteção ambiental e no entorno de reservas extrativistas. Há casos de áreas legalmente estabelecidas, mas outras provavelmente irregulares ou mantidas por liminares da Justiça”, afirma Maretti.
Produção sustentável
Antes de o sol raiar, os coletores de caranguejos já estão nos manguezais onde ficam três ou quatro dias, a depender da maré. Centenas de milhares de extrativistas dependem dessa atividade para sustentar suas famílias. Em unidades como a Resex Mocapajuba, em São Caetano de Odivelas, no Pará, os caranguejos são a principal atividade econômica.
Na Reserva Extrativista de São João da Ponta, aproximadamente 270 pessoas vivem da coleta de caranguejo, dentre elas 23 mulheres. “Muitas são chefes de família e utilizam a renda para o sustento de seus filhos”, conta a extrativista Raimunda Moura, que vive do caranguejo há 30 anos.
Devido à importância dessa atividade, o ICMBio tem apresentado resultados positivos em parceria com as comunidades locais com a produção sustentável de caranguejo, de forma que o animal não desapareça dos mangues brasileiros.
Uma das inovações é a técnica das basquetas. São cestas plásticas que substituem os sacos de tecido, diminuindo a mortalidade dos animais. “Conseguimos um maior valor agregado, o caranguejo partiu de R$ 0,40 para R$2,00, mas a expectativa é atingir R$3”, informou João Lima, da Resex São João da Ponta. Paralelamente, as comunidades têm aprendido mais técnicas, se aprimorado mais, obtendo selo de origem e procedência e aumentando ainda mais a qualidade dos produtos.
“Estamos com a esperança de aprovação de projetos para beneficiar e agregar mais valor nos produtos, qualificar mais os pescadores e nos engajarmos ainda mais na produção sustentável”, anunciou o extrativista Ronaldo Gomes, da Reserva Extrativista de Mocapajuba.
Comunicação ICMBio
(61) 2028-9280