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Evento une produtos e cultura de extrativistas e indígenas
Promovida pelo ICMBio e Funai, a II Feira dos Povos do Médio Xingu, em Altamira (PA), permite a troca de experiência e fortalece a identidade das comunidades tradicionais
Bruno Bimbato (texto e fotos)
Enviado especial
Altamira-PA (13/06/2017) – Na região do médio Xingu, encontram-se várias unidades de conservação (UCs) federais e terras indígenas, áreas protegidas de singular importância para a preservação da biodivesidade amazônica. O município de Altamira, no Pará, possui um território tão vasto quanto muitos países europeus, contendo uma rica diversidade cultural e natureza exuberante. Ocupações históricas desse local tornam as populações tradicionais verdadeiras guardiães da floresta e detentoras de um conhecimento e modo de vida ainda pouco conhecido e cercado de preconceito.
Com o objetivo de mostrar à população urbana um pouco do que são e o que fazem esses extrativistas e indígenas, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) promoveram a II Feira dos Povos do Médio Xingu, na Concha Acústica de Altamira, no último fim de semana.
Participaram do evento cerca de 126 pessoas, sendo que 41 são extrativistas de cinco unidades de conservação federais (UCs): as reservas extrativistas (Resex) do Riozinho do Anfrísio, Rio Iriri, Rio Xingu, Estação Ecológica (Esec) Terra do Meio e Parque Nacional (Parna) Serra do Pardo. Também compareceram 86 indígenas, de 11 terras indígenas (TIs), das etnias Araweté, Parakanã, Xipaya, Kuruaya, Juruna, Xikrin, Kayapó, Kararaô, Arara e Assurimi.
A Feira contou também com a participação de representates da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Nascentes Geraizeiras, no estado de Minas Gerais, convidados pela organização.
A união entre a necessidade de realizar evento que criasse um espaço maior no mercado local para os extrativistas e indígenas e o sonho de servidores do ICMBio e da Funai deu origem à primeira edição da Feira dos Povos, realizada em 2015, também em Altamira.
Para Nathalia Larios, consultora ICMBio/Funai, a segunda edição fortalece esse espaço na cidade, para que as populações tradicionais possam mostrar as suas riquezas.
Troca de conhecimentos
De acordo com a chefe da Resex Rio Iriri, Ana Cléia, a feira vai além da comercialização dos produtos produzidos pelos extrativistas, sendo também um intercâmbio cultural entre os diferentes povos da região. "Apesar de morarem no mesmo território, muitos deles não se conhecem, então é um momento deles terem esse contato, de ver o que o outro faz, de trocarem produtos e serem vistos por quem mora na cidade”.
Ana destaca ainda que a feira é um momento de descontração, de falar não só de problemas, mas de festa, de compartilhar coisas boas.
A programação contou com diversas atividades, começando com uma roda de conversa entre participantes, momento em que eles puderam discutir os pontos positivos do evento e o que pode ser melhorado. O encontro também serviu como oportunidade para refletir sobre os desafios e oportunidades de juntar tantas pessoas e tanta diversidade em um só lugar.
A presença de moradores da RDS Nascentes Geraizeiras gerou curiosidade nos participantes locais, que puderam aprender como se faz tijolos de mel de cana com massa de mandioca e outros produtos produzidos no norte de Minas Gerais.
“Lá não temos tanta água como aqui em Altamira, então é muito bom conhecer como outros extrativistas vivem e produzem, é uma experiência muito boa para nós” comentou Sebastião Ramos, morador da RDS, durante a roda de conversa.
Para Marth Uchôa, morador de Altamira, a feira é importante pois a cidade precisa disso para discutir identidade e preconceito, principalmente das pessoas que moram nas reservas. “Sou altamirense, nasci aqui e tenho pouco contato com essa população. Minha intenção nessa Feira é de me alimentar dessas referências culturais” completou.
Diversidade produtiva
Os traços delicados da pintura corporal feitos pelas índias chamavam atenção do público que passava pela feira, bem como os produtos da agrobiodiversidade feitos pelos extrativistas. Óleo de copaíba, farinha, biscoito de castanha, molho de tucupi, cestos, caixas de folha de cacau, doce de babaçu, cocada, raízes, entre muitos outros produtos das reservas extrativistas que fizeram sucesso na Feira.
“Antes não tínhamos um lugar para vender nosso trabalho, era difícil vender. Com a feira, podemos expor e vender mais do que lá nas reservas” diz Herlan Silva, morador da Resex do Xingu.
Foram mais de cinco mil produtos trazidos das reservas extrativistas e terras indígenas para mostrar que as populações tradicionais têm muita riqueza para compartilhar com os moradores da cidade.
Francisco dos Santos, morador e presidente da Associação dos Moradores da Resex Rio Iriri, avaliou a importância da feira para seu povo “É o único espaço único que temos para mostrar ao mundo os nossos produtos e nosso modo de viver, que são tão ricos em história e tradição. Também é uma forma de gerar mais renda para nossa comunidade”.
Clima festivo
Entre outras atrações disponíveis durante o evento, houve exposição fotográfica do altamirense Evair Almeida, com belos retratos sobre a primeira edição da feira. Durante toda a feira moradores das reservas extrativistas tocavam música e animavam a noite de quem passava pelo local.
A feira também contou com micro-oficinas de fotografia com o tema Luz e Arte, sendo um espaço para experiências, bricandeiras e poesia para meninos e meninas dos povos do Xingu. Entre as atividades de fotografia realizadas por Mônica Lizardo e Marise Maués, está o registro da feira pelos olhares dos próprios participantes e a montagem de uma câmera escura para mostrar às crianças e adultos como se dá a formação de imagens.
No final da feira, houve apresentação teatral do grupo Mundu Rodá. Chamada de Memórias da Rabeca, o espetáculo revela as memórias guardadas por sete rabecas (instrumento precursor do violino) e seus guardiães - os rabequeiros brasileiros -, colocando em foco dinâmicas das relações entre homem e rabeca e dando voz a fatos históricos que fazem parte da construção da identidade cultural brasileira.
Integração e gestão participativa
Para Rejane de Andrade, consultura do ICMBio, a feira é um espaço facilitador para a construção de diálogo para a gestão territorial do Médio Xingu, compartilhado entre indíos e extrativistas. Pode ser considerada como um ambiente para fortalecer e estimular a participação social nos conselhos e nos demais espaços de discussão.
Com os conflitos que existem no território e pelo uso dos recursos naturais, a ideia da Feira é que ao longo do tempo os povos tradicionais possam conversar entre si e entender como usufruir dos benefícios que eles têm. “É o momento que eles têm para saber que eles são os donos desse território” disse Ana Cléia.
Por meio do apoio a eventos como esse e o incentivo à comerciaização dos produtos vindos das reservas extrativistas, o ICMBio ajuda a valorizar os saberes tradicionais e a melhoria da qualidade de vida das comunidades, bem como a conservação da biodiversidade por meio da produção sustentável.
A organização
O evento foi realizado pelo Plano de Ação Sustentavel (PAS) da Resex Rio Iriri, subsidiado pelo Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) e recursos da Funai, além de contribuições de vários parceiros e patrocinadores locais, o que tornou possível a concretização do sonho de muitos idealizadores.
Comunicação ICMBio
(61) 2028-9280